quinta-feira, 30 de maio de 2019

Extrema direita polaca não quer Szymborska

Foto: TOMASZ WIECH
Direitistas da cidade de Olsztyn, no Nordeste da Polônia, não querem o nome da última Prêmio Nobel de Literatura a poeta Wisława Szymborska para rua da cidade.

A discussão sobre os nomes das novas ruas acendeu, como de costume, as emoções entre os conselheiros (vereadores) de Olsztyn. São os mesmos que já foram contra dar o nome de uma rua da cidade para Jacek Kuroń e, mais recentemente, para Maria Dąbrowska.

Desta vez  eles se opoem a dar o nome de uma rua para a poeta polaca consagrada em todo o mundo.

Na sessão do Conselho da cidade nesta quarta-feira, os "vereadores" abordaram a nomenclatura das novas ruas na área do antigo campo de treinamento adjacente ao conjunto habitacional de Pieczewo.

As autoridades Olsztyn indicaram cinco mulheres proeminentes para serem homenageadas: Zofia Nałkowska, Agnieszka Osiecka, Maria Dąbrowska, Eliza Orzeszkowa e Wisława Szymborska. Todas relacionadas à literatura.

Até o final, Szymborska despertou as maiores contrariedades dos vereadores do espectro ideológico de direita. O Prêmio Nobel de Literatura não foi uma recomendação suficiente para homenagear a poeta de destaque, cujos poemas os jovens aprendem já nas escolas. Ativistas de direita acreditam que os jovens devem aprender não apenas poemas, mas também a biografia do autor. E isso não é - na opinião deles - inequívoca.

Foto: SŁAWOMIR KAMIŃSKI

Os altos e baixos dos escritores
Mais cedo, o Conselho do Osiedle (bairro) Mazurskie, adjacente às ruas planejadas com nomes femininos, levantou esta questão. No seu parecer ao projeto de resolução, que deu o nome da rua Szymborska, foi mencionado "o compromisso da Poeta no início do período da República Popular da Polônia - PRL na promoção do realismo socialista, apoiando o aparelho de poder trazido para a sociedade polaca, o sistema socialista e a criação de um período de poesia de realismo social exaltando o regime comunista" - seria o que seria lido na resolução do bairro. A comunidade também apontou que a Poeta nunca se referiu explicitamente a esse período de sua atividade.

A maior parte da sessão na Câmara Municipal o vereador Jarosław Babalski do partido PiS (Direito e Justiça), ao falar de Symborska, disse que é preciso de inserções sobre as fontes das biografias dos candidatos individuais a nomes de ruas e logradouros públicos, mas a coalizão que governa a prefeitura - PO (Partido da Plataforma da Cidadania) e vereadores do mesmo partido do prefeito da cidade - tentaram forçar o nome da Poeta com  o intuito de se fortalecerem. Ele também observou que isso não é contra as autoridades, "porque nem todo mundo tem que saber literatura". Ele também  entende que há "altos e baixos" na vida dos candidatos à homenagens.

"Todo mundo sabe quais são as realizações de alguns desses homenageados. No entanto, o silêncio de certos fatos já se tornou a regra e não é uma parentalidade para a geração jovem."

Ele mesmo admitiu que os altos e baixos também estão em sua biografia. Nos anos da República Popular da Polônia, ele era um soldado profissional do Exército do Povo Polaco e pertencia ao PZPR até o fim do sistema socialista na Polônia. O vereador admitiu para estes episódios de sua biografia se voltaram contra ele apenas recentemente, e que o partido PiS diz que o passado é precisamente a razão dele não ter recebido a sua adesão ao partido do líder extremista de direita Jarosław Kaczyński.


Foto:JACEK MARCZEWSKI

A direita não quer Szymborska

Babalski foi apoiado por outros ativistas de direita de fora do partido do PiS. Mas, como o fogo, evitavam referir-se a eventos específicos da vida de Szymborska e de outros candidatos. "A ideia de honrar uma mulher é uma ideia certa. Sem entrar em uma biografia, eu apelo a respeitar a voz dos moradores do Osiedle Mazurskie e me dar tempo para propor outra pessoa", - disse Michał Wypij do Acordo de Gowin.

Enquanto que Elizabeth Wirska do Solidariedade disse que a proposta de quatro das literatas serem tratadas sob o ponto de vista da política, não deveria ser aceita, porque em vez investir no futuro da "propriedade literária", as ruas deveriam ser para celebrar engenheiros, mais apropriados, por ser o bairro vizinho do Parque de Ciência e Tecnologia de Olsztyn. Sua luta contra os homenageados com nomes das ruas é amplamente conhecida em Olsztyn. Wirska ficou famosa há alguns anos quando, como vereadora novata, desencadeou uma campanha de oposição aos planos de dar a Jacek Kuroń o nome de uma das ruas perto da Cidade Velha. No entanto, ela perdeu e exista na cidade de Olsztyn a  ulica (rua, pronuncia-se ulitssa) Kuronia.

Felizmente, Szymborska foi nomeada para ser nome de uma rua. Foram 16 votos favoráveis contra e sete de vereadores que não queriam o nome da Poeta.

quarta-feira, 22 de maio de 2019

Imigrantes Polacos na Guerra do Contestado

Guerra do Contestado - Tropas da Polícia Militar do Paraná chegam a Canoinhas / Foto: Claro Jansson
Quando me foram mostradas as fotos recuperadas do sueco Klas (Claro) Gustav Jansson para o projeto “Revelando o Contestado”, a primeira coisa que me saltou aos olhos foram as casas de madeira do interior do Estado do Paraná.

Retratadas em primeiro, ou segundo plano, elas imediatamente remetem a ideia de Paraná e de Polônia. Fotos que revelam tropas do Coronel curitibano João Gualberto entrando em Canoinhas, Porto União da Vitória, Três Barras, Calmon e Irani.

Mais casas de madeira de arquitetura polaca em Canoinhas - Foto: Claro Jansson
Os policiais se deparavam com edificações muito diferentes daquela arquitetura típica portuguesa de paredes de taipa caiadas de Florianópolis e do enxaimel alemão de Blumenau. As casas de madeira ali no “certan” Sul do Paraná construídas com tábuas e sarrafos na vertical são uma tradição trazida do Leste da Polônia. Foram a solução encontrada pelos imigrantes polacos da região de Lublin quando foram assentados nas colônias das bacias dos rios Iguaçu, Negro, Peixe e Chapecó.

A foto mostra uma casa com a bandeira do Paraná hasteada, que tem no detalhe dos lambrequins dos beirais, outro testemunho da presença polaca na região conflagrada.

As forças do Exército Brasileiro em frente a uma casa tipicamente polaca com a bandeira do Paraná
Foto: Claro Jansson
Na anotação feita pelo fotógrafo Claro Jansson no negativo em vidro desta foto está “Força Pública do Paraná no Contestado. Três Barras provavelmente”. Esta é outra evidência de que antes do Exército Brasileiro no conflito, foram os policiais paranaenses os únicos que lutaram naquelas terras ao Sul de Curitiba contra os revoltados.

Outra evidência de que além da pele morena, mulata, mestiça, também a branca esteve envolvida. Isto para não falar dos nítidos olhos azuis do polaco, à direita.

A desocupação forçada pela Lumber levou caboclos e polacos em vagões abertos para Ponta Grossa
Foto: Claro Jansson
Muito se escreveu sobre o conflito nestes cem anos. Mas muito poucos estudos, ou quase nada, falaram da presença de imigrantes polacos na Guerra do Contestado. Nem por isso, entre Peludos e Pelados, pode-se afirmar que eles estavam muito longe dali, pelo contrário. Foi a partir das colônias e vilas paranaenses de Cruz Machado, Fluviópolis, General Carneiro, Mallet, Nova Galícia, Rio Azul, Rio Claro, São Mateus do Sul, Vera Guarani, Paraguaçu e Lucena que os polacos cruzaram o Iguaçu, o Negro, o Timbó e o Canoinhas, fincando raízes na região do Contestado.

Desses pontos de partida, os colonos se espalharam por Bela Vista do Toldo, Irineópolis, Major Vieira, Rio Negro, São Bento do Sul, Monte Castelo e Três Barras, consistindo até hoje, em grande parte dos casos, a maioria da população rural de origem eslava dos limites atuais do Estado de Santa Catarina.

Os polacos dispersos pelos ervais encontraram no vale do Rio Iguaçu, um meio de prover sua subsistência. À medida que se tornavam ervateiros, cada vez mais incursionavam nas florestas umbrófilas (tipo de planta adaptada a lugares sombrios, úmidos, que surgem nas vertentes umbrias das montanhas e florestas tropicais) mistas, aquelas encimadas por imponentes pinheirais contendo nos sub-bosques milhões de árvores da Ilex paraguariensis. Ali construíram suas casas e constituíram suas famílias, vivendo da coleta da erva-mate e das rudimentares lavouras sazonais.

O envolvimento com a erva-mate foi tão grande que os polacos do rio Iguaçu chegaram a exportar a erva paranaense para Cracóvia, na Polônia, no final do século XIX. O principal exportador foi o líder da Legião Polaca que lutou na Revolução Federalista, Antoni Bodziak. Tendo como base São Mateus do Sul e as barcaças do rio Iguaçu levava fardos até Araucária e dali de trem até Paranaguá para embarcarem rumo ao mar Báltico e dos portos polacos até Cracóvia.

Os polacos trouxeram a carroça de toldo com rodas de raios traçados a cavalo e não bois.
Na luta pela defesa da terra e dos direitos espoliados, os nativos da terra paranaense não estiveram sozinhos ao cerrarem espingardas e facões diante da tirania do capital estrangeiro, do coronelismo, da ausência da Igreja, da generalizada ineficácia do governo. No mesmo processo de assimilação e adaptação social e cultural, os polacos acaboclados também guerrearam.

Fernando Tokarski
Alguns ao lado dos revoltosos, outros das forças militares. Homens de briga ou vaqueanos, todos eles faziam parte dos excluídos em seus países de origem e assim começaram sua odisseia nas terras onde corria leite e mel, no estrato social brasileiro similar ao seu anterior em terras da Europa Central.

Foram colocados à mercê da própria sorte  no rincão do país que lhes havia prometido dádivas.

Para o catarinense de origens polono-paranaenses, Fernando Tokarski (1999:65) as “Sucessivas análises apontam que essa porção catarinense tem laços diretos com as correntes migratórias colonizadoras europeias intermediadas pelo Paraná. Nítida até hoje, essa influência se sobrepõe à catarinense, que apenas se fez notar por meio dos germânicos provenientes de São Bento do Sul e Joinville. Reiteradas vezes dissemos que, afora as divisas político-administrativas, as duas regiões separadas entre o Paraná e Santa Catarina em todos os aspectos são exatamente iguais, favorecendo as incursões colonizadoras.”

Quando a Brazil Railway Co, que além da ferrovia, tinha compromissos contratuais com o governo de promover programas de colonização, criou sua subsidiária, Southern Brazil Lumber and Colonization Company, invadindo a região paranaense, muitos polacos abandonaram seus lotes coloniais e ofereceram mão-de-obra aos trabalhos ferroviários, mesmo porque muitos deles tinham sido transferidos para a empresa inglesa.

Serraria da Lumber em Três Barras - Foto: Claro Jansson
Meus dois bisavôs, Piotr Jarosiński e Wiktorio Hazelski (paterno e materno respectivamente), imigrantes polacos do Leste da Polônia, deixaram filhos e filhas aos cuidados de minhas bisavós Anna´s e foram trabalhar em trechos que cruzavam o Estado do Paraná desde Marcelino Ramos, nas margens do Rio Uruguai até Sengés na divisa com São Paulo.

No centro da foto, meu bisavô Wiktorio Hazelski, numa serraria.
Piotr tinha chegado com a mulher e dois casais de filhos em 1911 e foi assentado na colônia do Tronco, em Castro e Wiktorio na Colônia Papagaios Novos, em Palmeira. Recém chegados e distantes da região do conflito de Pelados e Peludos ficaram do lado dos trabalhadores da ferrovia e não dos compatriótas que estavam perdendo seu lotes mais ao Sul do Estado.

A participação dos imigrantes polacos na Guerra do Contestado, também pode ser entendida como tendo resquicíos originados na secular luta por eles empreendida contra a tríplice ocupação austríaca, prussiana e russa das terras da República da Polônia, desaparecida do mapa do mundo por 127 anos. Os polacos estavam acostumados a combater sistemas de opressão.

Os historiadores Nilson Thomé e Paulo Pinheiro Machado encontraram no Ministério do Exército listas de nomes dos revoltosos que se entregaram às autoridades militares da Coluna Leste, na cidade de Rio Negro, na vila de Papanduva e nas localidades de Major Vieira e Lajeadinho. Também conseguiram listas de alguns vaqueanos da Coluna Norte.

Os polacos da Guerra do Contestado
Dos 520 nomes entre revoltosos e vaqueanos, 67 homens, ou 12,8% eram polacos. Destes, 53 ou 79,1% lutaram como revoltosos. Outros 14 ou 20,9% foram vaqueanos. Do total de 1.093 revoltosos que se entregaram àquela coluna, 15,6% eram polacos. De 1.688 prisioneiros da lista dos historiadores, 1.018 eram mulheres e crianças.

São estes alguns dos nomes presentes na lista de revoltosos:
Adão Bednarski (e sua esposa Paulina Jankowska e sete filhos),
Adão Bimarski,
Adão Kauski,
Adão Szóczek,
Alexandre Galeski (mulher e sete filhos),
Alexandre Gapski,
Alexandre Króliczowski,
Alberto Bigas (mulher Antônia Maćkiewicz e dois filhos),
Alberto Jankowski,
Alberto Mainozowicz (mulher e um filho),
Alexandre Krenikeski,
André Boreck (mulher Filomena Bigas e seis filhos),
André Smartcz (mulher e quatro filhos),
Antônio Woidella e esposa,
Antônio Wojciechowski (mulher Josefa e três filhos),
Domingos Karwat (mulher e seis filhos),
Ernesto Szwarowski,
Estanislau Bigas e esposa Tereza Kauwa,
Estanislau Borecki,
Estanislau Gauloski,
Estefano Lewczak (mulher Antonia Koczinski e filho),
Ernesto Cznawski,
Estefano Wiekiewicz ou Wieczorkiewicz (1889-1948),
Francisco Bigas (mulher e quatro filhos),
Francisco Teófilo Czaika (1874-1949) e a esposa Maria Marzakiowicz (1869-1951) e três filhos; Francisco Kauwa,
Francisco Króliczowski (1862-1937) com sua mulher Ana Zelonka e quatro filhos;
Francisco Majewski,
Francisco Mónczłowski e esposa,
Gaspar Piętchokowski (mulher Maria dos Reis e filho),
Inácio Kaczmarek (mulher Rosália e dois filhos),
João Borecki (1894-1959),
João Maszinski,
João Mónczłowski,
João Szopek,
José Gogola,
José Kaczmarek,
José Karwat (1882-1954),
José Mónczołwski (mulher e sete filhos),
José Ręszkowski (mulher Catarina e um filho),
Ladislau Marczniak (mulher Joana Urbanek e cinco filhos),
Leonardo Kamienski (mulher Josefa e seis filhos),
Leonardo Sznowski,
Leonardo Wiszniewski (mulher e cinco filhos),
Marcelino Adginski e mulher,
Martinho Bigas, conhecido por “Martin Polaco” (1857-1926) e sua mulher Agnieszka,
Martinho Niedzelski (mulher Antonina e nove filhos),
Martinho Maćkiewicz,
Miguel Boreck e sua mulher Ana Kalemach,
Miguel Nowack (mulher Francisca e seis filhos),
Miguel Sentak,
Miguel Szczygiel
e Miguel Woszniak (mulher e cinco filhos).

Alexandre Króliczowski, que aparece na lista dos revoltosos, também consta como um dos vaqueanos de Leocádio Pacheco.

Foto: Claro Jansson
Nas forças militares estavam:
André Króliczowski,
Antonio Czislowicz (1899-1951),
Basílio Pickek,
Pedro Terakik,
Ricardo Borecki e Teobaldo Wandrekowski integravam o piquete de vaqueanos sob o comando do coronel Leocádio Pacheco dos Santos Lima, de Três Barras.


Vaqueanos - Foto: Claro Jansson
Entre os vaqueanos de Pedro Leão de Carvalho, o “Pedro Ruivo”, de Canoinhas, estavam:
Inácio Witek,
João Maliszewski,
João Rutęski,
Manoel Stavas e Nicolau Jaroczewski (1910-1948).
O pai deste, Bernardo Jaroczewski (1870-1951), também foi vaqueano.

Antes de concluir, há que se destacar que na Batalha do Irani, travada em 22 de outubro de 1912, foi ferido no confronto, o soldado Teodor Selerowski, que acabou morrendo em Curitiba em 06 de março de 1913. O cabo de esquadra Jan Matecki recebeu um tiro no cotovelo direito. Ele lutava à direita e bem próximo do coronel João Gualberto Gomes de Sá Filho, quando o comandante recebeu um tiro no peito e depois foi trucidado com golpes de facão. (Rosa Filho 1999:30).

E para finalizar: A Guerra do Contestado aconteceu no Paraná...e só no Paraná! Paranaenses usurpados de suas terras que contestaram o governo federal por ter dado concessões ao americano Percival Farquhar e as suas empresas Brazil Railway Co. Southern Brazil Lumber and Colonization Company. A Guerra do Contestado foi entre aqueles paranaenses e os pistoleiros texanos de Farquhar, a Polícia Militar do Paraná e o Exército brasileiro.

Jamais foi uma guerra por limites de território entre os Estados de Santa Catarina e Paraná. E é preciso ter claro, que mesmo após 100 anos do fim do conflito Curitiba segue sendo a capital do "Oeste Catarinense".

segunda-feira, 20 de maio de 2019

Piast conquista campeonato polaco


A equipe do Piast da cidade de Gliwice, na Silésia, conquista pela primeira vez o título de Campeã da Polônia. O Piast confirmou com uma vitória por 1 x 0 contra o Lech Poznań. Tinha sido duas vezes vice-campeão polaco.

O herói do time de Gliwice foi o atacante Piotr Parzyszek, que marcou o oitavo gol da temparada e o mais importante da história do clube fundado em 1945.

O Piast mandou seus jogos no Estádio Miejski com capacidade para apenas 9.913 espectadores de público.

A EQUIPE


CLASSIFICAÇÃO FINAL


domingo, 19 de maio de 2019

Livro: Revelando o Contestado


Capa do livro "Revelando o Contestado" editado por mim (Ulisses Iarochinski) e pelo jornalista Jorge Narozniak (falecido) com arte visual dos designers Luiz Solda e Cesar Marchesini. Publicação especial para comemorar os 100 anos do início da Guerra do Contestado, em 2012 (ano da publicação pela Imprensa Oficial do Estado do Paraná).

Livro de formato em 42x21cm com a biografia e 110 fotos do único fotógrafo daquela guerra: o sueco Claro Jansson. O livro revela que o mais sangrento conflito social da história do Brasil aconteceu no Paraná... e só no Paraná... e apenas com paranaenses.
Fotógrafo Claro Jansson
A guerra não foi por disputa de território entre Paraná e Santa Catarina como querem fazer crer alguns "doutos", que torcem a bandeja para o lado catarinense. Os atores da guerra foram caboclos, índios, posseiros e fazendeiros paranaenses, além de imigrantes polacos recém assentados, na então região Sul do Estado do Paraná. A divisa do Paraná com o Rio Grande do Sul, no rio Uruguai, existiu até 1917.

Tropas da Polícia Militar do Paraná em União da Vitória - Foto: Claro Jansson 
Os olhos claros do homem na foto da capa não negam que o colono era polaco. A foto mostra a fuga da região do conflito. Fuga esta, ou desocupação forçada para Ponta Grossa foi feita em vagões do próprio construtor da Estrada de Ferro São Paulo Rio Grande do Sul.

Foto: Claro Jansson
Quem contestava (daí o porquê da palavra "Contestado") a faixa de 30 km de largura, que atravessou os Campos Gerais do Paraná e que foi dada em concessão pelo governo federal para o norte-americano Percival Farquhar, eram os habitantes paranaenses. Nunca foram, em momento algum, os catarinenses que contestavam.

Os paranaenses "pelados"defensores das terras do Paraná - Foto: Claro Jansson
A guerra foi sim, entre os paranaenses daquelas terras (que hoje se chama Oeste Catarinense) contra o Exército brasileiro e a Polícia Militar do Paraná. Forças que dizimaram milhares de paranaenses para defender interesses do milionário dos Estados Unidos. Foi a primeira vez que a invenção de Santos Dumont foi usada numa guerra. Fato que causou enorme tristeza no inventor.

Não houve nenhuma batalha entre paranaenses e catarinenses pelas terras entre os rios Iguaçu e Uruguai.

Na cor verde está o território onde aconteceu a Guerra do Contestado
Entretanto, encerrada a guerra, as terras paranaenses foram cedidas pelo governador do Paraná e advogado de Farquhar (contra os posseiros e fazendeiros paranaenses), o guarapuavano Afonso Alves de Camargo ao governo de Florianópolis. E não foram cedidas por causa da guerra, ou disputa de território, mas para favorecer a Lumber (maior devastadora da mata mais rica em madeiras nobres do Sul do Brasil), empresa do norte-americano.

Serraria da Lumber em Três Barras- Foto: Claro Jansson

sábado, 18 de maio de 2019

Filme revela padres pedófilos na Polônia


Um documentário sobre casos de menores de idade vítimas de agressão sexual por parte de padres católicos está provocando uma onda de fortes reações na Polônia.

"TYLKO, NIE MÓW NIKOMU" (Só, não fale para ninguém) é o título do polêmico documentário dirigido por Tomasz Sekielski e produzido por seu irmão Marek Sekielski que expõe a experiência de vítimas de abusos sexuais cometidos por padres.

O diretor usa câmeras escondidas para registrar os dolorosos e constrangedores encontros das vítimas, como o que aconteceu entre Anna e seu algoz. Sem saber que estava sendo filmado, o padre, bastante idoso e aposentado, diz estar muito arrependido. Oferece dinheiro para a mulher pelos danos psicológicos causados por ele. A mulher perdoá-o, mas diz: “Padre, você se masturbou usando minhas mãos. Nenhum dinheiro pode pagar por isso. Está aqui dentro”.

Anna Misiewicz e o padre molestador
Disponibilizado em várias resoluções no YouTube (inclusive FullHD) o filme já ultrapassou os cinco milhões de visualizações em poucos dias apenas na Polônia (um recórde) e mais de 20 milhões em todo o mundo com legendas em inglês.

Entre as vítimas há o depoimento de um homem que lembra como sofreu abusos aos 12 anos por parte do sacerdote Franciszek Cybula, que foi confessor do ex-presidente polaco e líder histórico do sindicato Solidarność (Solidariedade), Lech Wałęsa. (pronuncia-se lérrre váuensa)

As reações da Igreja Católica oscilaram entre os que pediram desculpas “pelos erros cometidos”, como o primaz da Polônia, Wojciech Polak, e os que evitaram se pronunciar “por não terem visto o documentário”, como o arcebispo de Gdańsk, Sławoj Głod. O líder do partido governante da Polônia, o conservador e nacionalista Direito e Justiça, Jarosław Kaczyński, também reagiu ao documentário e disse que seu partido prepara mudanças no código penal para endurecer as penas por abuso sexual a menores.

Na terra do Santo Papa João Paulo II, onde 97% da população que se considera Católica Apostólica Romana, por razões históricas e patrióticas, a palavra Ksiądz (padre) é quase “santa”. Karol Wojtyła além de santo é também um herói nacional. A Polônia cultua seus heróis nacionais como nenhum outro país.

E justamente, por essas razões o documentário está causando tamanho estardalhaço.

Realizado por meio de crowdfunding (financiamento coletivo), o filme agora é assistido coletivamente em locais públicos.

Os irmãos Tomasz e Marek Sekielski
A cúpula da Igreja Católica polaca afirmou aos realizadores que o documentário é parcial – resposta incluída no final do filme. Porém, com a fama do filme, a arquidiocese de Gniezno (cidade berço da Polonidade) sentiu-se na obrigação de dar mais uma resposta. O arcebispo Wojciech Polak se disse “emocionado”, desculpou-se e ainda parabenizou o diretor por sua “coragem”.

Depois do filme de ficção "Kler"(Clero) que levou milhares de polacos as salas de cinema do país,  no ano passado, estrelado por grandes atores da Polônia, que escancarou a pedofilia praticada por muitos padres católicos, o documentário dos irmãos Sekielski, provocam ainda mais o forte catolicismo polaco.

“O grande sofrimento das vítimas desperta sentimentos de dor e de vergonha. Agradeço a todos que têm a coragem de relatar sua dor. Peço perdão pela ferida causada por clérigos”, escreveu o primaz Polak.

Já o arcebispo ultraconservador de Gdánsk, Sławoj Leszek Głódź, declarou que “tinha mais o que fazer do que assistir a algo sem valor”.

As obras cinematográficas polacas fazem parte da guerra santa que acontece entre progressistas e conservadores do Vaticano em relação às medidas que o Papa Francisco vem tomando, em sua cruzada contra a pedofilia. No dia 9 de maio, o pontífice anunciou uma nova norma que torna obrigatório aos membros do clero denunciar suspeitas de abusos sexuais ou de poder ou de acobertamento de casos ocorridos dentro da Igreja Católica.

Se você não assistiu o documentário polaco ainda é tempo...Este é o link:

Tylko nie mów nikomu

quinta-feira, 16 de maio de 2019

Sepultura de 5 mil anos na Polônia

Foto: H. Schroeder
As 15 pessoas encontradas em uma vala comum da Idade do Bronze no sul da Polônia foram mortas por um golpe na cabeça, mas seus corpos foram enterrados juntos, com muito cuidado e consideração. Evidências genéticas agora sugerem que esse indivíduos eram membros da mesma família – uma descoberta que joga uma nova luz sobre uma era tumultuada da pré-história europeia.

Esta trágica sepultura foi descoberta próxima à aldeia de Koszyce, no sul da Polônia, em 2011. Datada por radiocarbono entre 2880 e 2776 a.C., ela continha os restos mortais de 15 homens, mulheres e crianças, além de bens valiosos. Todos os esqueletos exibiram um traumatismo craniano grave. O motivo dos assassinatos não foi identificado, mas arqueólogos na época sugeriram que esses indivíduos haviam sido mortos durante um ataque em seu assentamento.

Para desvendar esse mistério, uma equipe de pesquisadores da Universidade de Copenhagen, Universidade de Aarhus, e do Museu Arqueológico em Poznań (Polônia), conduziram uma análise genética dos esqueletos. Os resultados, publicados na semana passada no Proceedings of the National Academy of Sciences, sugerem que todos os indivíduos, com exceção de um, eram relacionados e que estavam posicionados na sepultura de acordo com a sua relação familiar.

As 15 caveiras exibiam fraturas cranianas fatais. Nenhuma ferida de defesa, como lesões nos membros superiores, foi detectada, o que sugere que esses indivíduos foram capturados e executados, e não mortos em um combate corpo a corpo, de acordo com o novo estudo.

Reconstrução artística da sepultura, mostrando como os corpos estavam posicionados.
Ilustração: Michał Podsiadło
Além disso, a nova evidência indica que essas pessoas, associadas à Cultura Globular Amphora (um grupo que viveu na Europa central por volta de 3300 e 2700 a.C.), não eram geneticamente relacionadas a um grupo vizinho conhecido como Cultura Corded Ware.

Os pesquisadores ainda não têm certeza do que aconteceu, mas eles imaginam que os assassinatos foram de natureza territorial. Esse período em particular marcou a transição do final do período Neolítico para a Idade do Bronze, pois os primeiros agricultores estavam desenvolvendo sociedades mais complexas. Mas também foi uma época turbulenta e violenta, à medida que culturas europeias estabeleciam os primeiros contatos com culturas do leste, inclusive da planície asiática. A expansão dos grupos Corded Ware pode ter resultado nesse terrível incidente.

“Nós sabemos, a partir de descobertas feitas em outras covas, que conflitos violentos aconteceram entre diferentes grupos nesse período”, afirmou Niels Johannsen, arqueólogo da Aarhus University, em comunicado à imprensa. “No entanto, eles nunca haviam sido tão claramente documentados. À parte de toda a violência e tragédia, nosso estudo demonstra claramente que união e cuidado familiar eram muito importantes para essas pessoas, há cerca de 5 mil anos, tanto em vida como na morte”.

De fato, a nova análise genética identificou esses 15 indivíduos como parte de uma grande família. No geral, quatro núcleos familiares foram documentados – mães e crianças majoritariamente. Os indivíduos foram enterrados de acordo com as relações familiares; mães foram enterradas com seus filhos, e irmãos foram posicionados próximos uns aos outros. A mais velha do grupo, por exemplo, foi enterrada ao lado de seus dois filhos, com 5 e 15 anos de idade. Uma mulher com idade aproximada de 30 anos foi enterrada próxima à sua filha adolescente e seu filho de 5 anos. Quatro meninos, todos irmãos, estavam ao lado um do outro. Claramente, todos eles foram enterrados por alguém que conhecia a família.

Na sepultura não foram encontrados pais ou qualquer outro parente do sexo masculino, “o que sugere que talvez tenham sido eles que enterraram seus familiares”, escreveram os autores no estudo.

“Nossa impressão é que eles não estavam no local quando o massacre ocorreu e só retornaram depois, e posteriormente enterraram suas famílias de forma respeitosa”, afirmou o biólogo Morten Allentoft da Universidade de Copenhagen em comunicado.

Apenas um indivíduo, uma mulher adulta, não era geneticamente relacionada a ninguém do grupo. No entanto, ela estava posicionada próxima a um jovem rapaz, o que sugere que “ela pode ter sido tão próxima a ele em vida como na morte”, concluíram os autores.

“A presença de mulheres sem parentescos e homens com parentesco na sepultura é interessante porque indica que a comunidade em Koszyce era organizada segundo linhas de descendência patrilineares, acrescentando à evidência de que esta era a forma dominante de organização social entre comunidades do final do período Neolítico na região central da Europa”.

Tipicamente, sociedades patrilineares são associadas à prática de mulheres se casarem fora do seu grupo social e residirem com a família do homem (ou seja, exogamia feminina). Diversos estudos anteriores já indicaram que casamentos arranjados patrilineares, de fato, prevaleceram em muitas parte da Europa Central durante esse período, segundo o estudo.

Um episódio brutal de um período particularmente brutal da história da humanidade. É uma cena que não seria tão assustadora se estivesse em Game of Thrones, mas, infelizmente, essa tragédia foi real demais.

Texto: George Dvorsky
Fonte: Gizmodo Brasil

segunda-feira, 6 de maio de 2019

Falta mão-de-obra na Polônia

"Apesar da falta de mão de obra, Polônia reluta em aceitar imigrantes"
Łódź - Foto: Michał Tuliński
Texto: Marc Santora
The New York Times"

 "O partido Direito e Justiça, de direita, chegou ao poder em 2015, no auge da crise da imigração na Europa, depois de uma campanha movida ao coro de - a Polônia para os polacos"; com as eleições gerais marcadas para outubro, o partido da situação volta a promover sua visão de "a Polônia em primeiro lugar".

Essa retórica anti-imigração agressiva vem dando dor de cabeça para a União Europeia, que não conseguiu distribuir as cotas do norte da África, Bálcãs e Oriente Médio pelo continente justamente por causa da resistência da Polônia e outros países-membros linha-dura.

E é por isso que muita gente se surpreende ao saber que o governo polaco, muito discretamente, responde pelo maior fluxo de trabalhadores imigrantes na história moderna do país – só que a grande maioria é cristã e vem da vizinha Ucrânia.

O primeiro-ministro Mateusz Morawiecki não tem pudor em promover os planos do governo. "Queremos remodelar e recristianizar a Europa", afirmou, em 2017, em entrevista a um canal de TV católico. E recentemente ordenou que os passaportes recém-emitidos incluíssem a frase "Deus, Honra, Pátria".

O fato é que a imigração na Polônia é um paradoxo. O país se beneficiou enormemente das fronteiras abertas da UE, faturando bilhões de dólares enviados por milhares de trabalhadores que migraram para outros membros do bloco, especialmente o Reino Unido. Hoje, no entanto, com a escassez de mão de obra que a Polônia enfrenta, as autoridades não estão conseguindo atrair a diáspora de volta – e se veem de mãos atadas pela posição política anti-imigratória.

Ucranianos Se o governo raramente fala da necessidade de força de trabalho imigrante, o volume de ucranianos em muitas cidades polacas já se faz notar. Segundo o Eurostat, mais de 683 mil estrangeiros receberam as primeiras validações de residência na Polônia em 2017, o número mais alto entre os membros da União Europeia. Há mais de dois milhões de ucranianos hoje na Polônia, a maioria nas cidades que movem a economia nacional."

A questão é saber se eles vão ficar. No ano passado, o bloco começou a isentar os ucranianos do visto, e a Alemanha está facilitando as exigências de entrada para profissionais qualificados, de olho neles. Uma pesquisa recente, realizada por um jornal polaco, concluiu que 59 por cento dos ucranianos no país admitiram ter a intenção de ir para a Alemanha se o mercado de lá se abrir.

"O governo não tem domínio da questão; se você perguntar quantos ucranianos estão trabalhando aqui, vão dizer 500 mil, mas são mais de dois milhões, e, desses, muitos podem estar indo para a Alemanha", diz Anna Wicha, diretora do Grupo Adecco, uma das maiores agências de empregos da Polônia.

FALTA ESTRATÉGIA

Por enquanto, as autoridades não têm uma estratégia de expansão da mão de obra em longo prazo. Muitos especialistas e alguns membros da oposição dizem que a situação só se resolverá se os líderes amenizarem a resistência aos migrantes e aceitarem a pluralidade – mas, em âmbito nacional, só falar sobre imigração já pode ser considerado suicídio político.

Quando o vice-ministro de Investimentos e Desenvolvimento Paweł Chorazy disse, durante um debate televisionado antes das eleições locais de outubro, que "o fluxo de imigrantes na Polônia teria de aumentar para sustentar o crescimento econômico", a reação que gerou foi de escárnio."

Joachim Brudzinski, ministro do Interior, disse que os comentários "não refletem a posição do governo"; o primeiro-ministro, Morawiecki, afirmou que Chorazy "foi muito afobado". E logo em seguida o demitiu.

"Os políticos estão andando na corda bamba, muito conscientes de que em breve pode haver um desastre. É muito fácil fomentar o sentimento nacionalista com uma retórica anti-imigração, mas a realidade das necessidades do mercado de trabalho estão a cada dia mais claras. Estamos em um momento de definição para o país; certas decisões terão de ser tomadas. Não dá mais para adiar", explica Irena Kotowska, diretora do Centro de Demografia da Faculdade de Economia de Varsóvia."

BRAÇOS ABERTOS

Henryk Panusz, 89 anos. Sua família foi líder na indústria do tricô - Foto: Laura Boushnak
Em Łódź, na porção central do país, as contradições do dilema migratório polaco são bem evidentes; ao contrário da liderança nacional, porém, a prefeita Hanna Zdanowska abriu o município para os estrangeiros. Quando disputou as eleições em outubro passado, aliás, pediu uma Polônia inclusiva, que recebesse os recém-chegados de braços abertos.

O partido do governo jogou pesado contra ela durante a campanha, mas Zdanowska acabou vencendo com 70 por cento dos votos válidos, fenômeno que ela justificou pelo histórico de tolerância local – afinal, o município já foi um centro manufatureiro com centenas de fábricas, com uma população que incluía holandeses, ingleses, alemães e um forte contingente judeu.

Depois da guerra, Łódź passou por dificuldades sob o regime comunista antes de a Cortina de Ferro começar a se desintegrar, em 1989. Uma vez que o país entrou para a União Europeia, oferecendo às pessoas a chance de migrar com mais facilidade, Łódź viu sua população despencar para 690 mil habitantes, quando antes passava de 850 mil – parte do êxodo, desde 2004, de 2,5 milhões dos 38 milhões de polacos.

Prédio de Fábrica abandonado em Łódź - Foto: Laura Boushnak
Mas a Polônia também se beneficiou dos bilhões em subsídios que ajudaram o país a se tornar uma das economias de crescimento mais rápido do continente. E Łódź atraiu empresas multinacionais, ao mesmo tempo que reinventou muitas fábricas antigas como espaços culturais para atrair uma nova classe criativa.

SEM VOLTA

Existem centenas de lojas de polacos com produtos da Polônia na Inglaterra - Foto: Andrew Testa
Mesmo com a prosperidade da economia, porém, o governo polaco não consegue atrair de volta aqueles que saíram em busca de melhores salários e oportunidades, apesar de gastar fortunas em campanhas publicitárias.

Aleksandra Modrzejewska, por exemplo, deixou Łódź, em 2014, e conseguiu emprego de garçonete assim que chegou ao Reino Unido; hoje vive e trabalha em Chelmsford, na Inglaterra, como corretora de seguros. E diz acreditar no governo, que já afirmou que, não importa qual seja o resultado do Brexit, ela poderá ficar.

"Ninguém que eu conheço está pensando em ir embora. O Brexit talvez tenha algum impacto no pessoal que está chegando, mas, pelo que tenho visto, para quem já tem vida feita aqui, nada vai mudar."

"Foi uma questão de qualidade de vida. Aqui as pessoas são muito mais abertas e receptivas a culturas e nacionalidades diferentes", conclui, explicando sua decisão de sair da Polônia.

Fonte: The New York Times

sábado, 13 de abril de 2019

Dez canções para aprender polaco


O idioma polaco é uma bela língua e que possui algumas palavras adoráveis e uma detentor de grande poesia, mas difícil de ser aprendido.

A Polônia produziu alguns músicos muito conhecidos na história como os compositores Fryderyk Chopin, Stanisław Moniuszko, Ignacy Paderewski e Krzysztof Komeda, além dos cantores Paweł Kukiz, Krzysztof Krawczyk e as cantoras Edyta... Górniak e Geppert.

Mas a melhor da música polaca raramente é tocada fora de seu país. Então, se você está tentando aprender o idioma, ouça essas músicas pop atuais para o ajudar a aprender a língua mais difícil do mundo.

JAN BORYSEWICZ i PAWEŁ KUKIZ
 "Jeśli Tylko Chcesz" (Só se quiseres)

Essa música é uma balada emotiva e forte com palavras simples, mas eficazes. A música dá àqueles que não estão familiarizados com o polaco a chance de cantar junto - é um dos favoritos do karaokê - para as linhas significativas “Bo bez ciebie nie ma nic, z tobą jedną mogę być, jeśli tylko chcesz”, que se traduz para “porque sem você, não há nada, com você uma posso ser, só se quiseres”.



ROTARY
 "Lubiła Tańczyć" (Ela gostava de dançar)

Esta é uma canção de amor com palavras fáceis de entender, usando frases comuns do dia-a-dia e no tempo verbal do pretérito simples para contar a história de uma garota que gostava de dançar.

As letras descrevem uma viagem de carro, onde o rádio parou e o casal "não contou as estrelas" ("Nie liczyliśmy gwiazd").

O coro empolgante termina com a frase “nós dançamos como se o tempo tivesse morrido” (“Zatańczmy proszę tak jakby umarł czas mówiła”).



DODA
 "Nie Daj Się" (não se deixe)

A cantora polaca Doda costuma criar manchetes de revistas por seus controvertidas fotos ousadas. Seu nome verdadeiro é Dorota Rabczewska e ela foi vencedora do MTV Europe Music Awards e indicada ao World Music Awards.

Antes de sua carreira solo, ela fazia parte da banda Virgin. Seu maior sucesso, "Nie daj się", foi lançado em junho de 2008, alcançando grande repercussão e aclamação da crítica.

Versos como “Każdy na początku wierzy że jest dla niego plan” (“Em cada começo acredita que existe um plano para ele”) e o repetido título “Nie Daj Się” (“Não se deixe”) também torna este clip  perfeito para se aprender boas frases em polaco.



LADY PANK
 "Stacja Warszawa" (Estação de Varsóvia)

Com esse nome em inglês "Lady Pank" é uma popular banda de rock polaca formada em 1981 em Varsóvia por Jan Borysewicz e Andrzej Mogielnicki.

Sua canção “Stacja Warszawa” (“Estação de Varsóvia”), capital da Polônia, é uma bela canção para ouvir enquanto se vê o pôr do sol sobre o rio Vístula (Wisła). Começa com o verso  “W moich snach wciąż Warszawa” (“Nos meus sonhos está sempre Varsóvia”) levando o ouvinte em uma jornada pelas ruas de Varsóvia, tanto no vídeo quanto nos versos emotivos.




IRA
 "Ona jest ze snu"

A banda IRA, cujo nome não tem nada a ver com a palavra irlandesa Exército Republicano Irlandês, e tampouco guarda relação com a banda brasileira formada em 1981 e liderada por Edgard Scandurra e muito menos para "raiva" em português, foi a mais popular nos anos 90, na Polônia.

Sua canção "Ona jest z snu" é o equivalente da Polônia ao "Wonderwall" da Inglaterra, que a balada do Oasis frequentemente tocava em casamentos, aniversários e era cantava em bares e estádios de futebol em todo o Reino Unido.

Na Polônia, a cativante "Ela é do sonho" é boa para aprender quando se quer entrar a fundo na cultura polaca. O título pode ser tradudido também como "ela é de um sonho" ou "ela vem de um sonho".


WILKI - URKE 
  "Pijemy za lepszy czas" (bebemos por um tempo melhor)

A canção de sucesso do Wilki - Urke ("bebemos por um tempo melhor") é uma canção pop polaca edificante com versos positivos e de felicidade.

O refrão balança junto com o título da canção repetido, "bebemos por um tempo melhor" enquanto o verso sugere "Não perca a fé em seus sonhos".



KOBRANOCKA
 "Kocham Cię jak Irlandię" (Te amo como a Irlanda)

Outra canção de amor emotiva, a letra fala da dor do poeta: "Eu sugo esta dor pela cidade de Włocławek, amando você como a Irlanda".

Alguns versos são difíceis de traduzir, mas peça a seus amigos na Polônia para o ajudar nos versos como “Gdzieś na ulicy Fabrycznej, spotkać nam się wypadnie. Lecz takie są widać wytyczne de kochać Cię jak Irlandię” que pode ser traduzido como“ Em algum lugar na rua Fabryczna nos encontramos e caímos, mas eu sigo o plano mestre de te amar como a Irlanda”.

Com tantos polacos vivendo na Irlanda, atualmente, isso facilitou o sucesso desta canção até comum, ao fazer os compatriotas além fronteiras também cantarem.



PAWEŁ KUKIZ i YUGOPOLIS
 "Miasto budzi się" (Cidade acorda)

Outra fantástica balada de Paweł Kukiz, desta vez ele se juntou a Yugopolis para esta deliciosa canção sobre uma cidade acordando.

Os compositores dizem “nos dê um bom dia” em polaco, “Daj nam dzisiaj dobry dzień”.

O vídeo também se encaixa com a vibe da música, que é relaxante e que ajudará a entender algumas boas palavras e frases do dia-a-dia no idioma polaco como “słońce” (“sol”) e “z naszymi marzeniami” (“com nossos sonhos”).



KANCELARIA
 "Zabiorę Cię Właśnie Tam" (Certamente vou te levar lá)

Com quase 50 milhões de visualizações no YouTube, não é difícil entender por que o sucesso da Kancelaria em 2008 é tão popular e um ponto de partida comum para estrangeiros que tentam entender a música pop polaca.

A canção começa eloquentemente, “Zabiorę Cię… właśnie tam… dzie jutra słodki smak” (“Certamente vou te levar lá… onde há um doce sabor de amanhã”).

A música tem ótimos vocais e ganchos de guitarra para acompanhar a história de amor. O coro sedutor nos diz: “Między nami jest coś nie zaprzeczaj mi, tyle mogę Ci dać”, (“Entre nós há algo, não me negue a possibilidade, posso te dar tanto”).




"Sto Lat" (Cem Anos)
  canção de feliz aniversário polaco

Embora não seja uma música pop oficial, ela já foi gravada milhares de vezes e continua sendo a música mais ouvida em qualquer noite na Polônia.

Por esse motivo, você provavelmente deve tentar aprendê-la primeiro. Você faz um brinde à música, geralmente com uma dose de vodka desejando ao seu amigo feliz aniversário e desejando-lhe "sto lat" (100 anos). É uma música relativamente curta, bem fácil de aprender:

“Sto lat, sto lat,
Niech żyje, żyje nam.
Sto lat, sto lat,
Niech żyje, żyje nam,
Jeszcze raz,
jeszcze raz,
niech żyje, żyje nam, Niech żyje nam!”



Texto: Jonny Blair
Tradução para o português: Ulisses Iarochinski
Fonte: Culture Trip

sexta-feira, 12 de abril de 2019

27 polacos morreram na rua, desabrigados na Grã-Bretanha


Vinte e sete cidadãos polacos morreram na Grã-Bretanha desde o início de outubro de 2017, além de outros 800 que se encontram desabrigados nas ruas.

A triste estatística é do "The Bureau of Investigative Journalism", que criou o primeiro banco de dados nacional com nomes de pessoas desabrigadas, falecidas e suas histórias. Reportagem sobre o assunto foi publicada na revista semanal da "Duży Format" do jornal Gazeta Wyborcza.

A idade média das mulheres mortas é de 53 anos e a dos homens 49 anos de idade. As mortes são frequentemente causadas por álcool, drogas, doenças, além de suicídios e assassinatos.

Segundo dados de novembro último, em Londres existem 168 mil pessoas desabrigadas. Em todo o Reino Unido, há 320.000 pessoas, a cada duzentos habitantes.

Um destes mortos é o polaco Tomasz Suliga, que tinha 42 anos quando foi encontrado em 31 de outubro de 2017 em Blackburn, North West England. Durante vários dias seu corpo permaneceu sob a ponte ferroviária na Whalley Old Road.

Outro foi, Piotr Krówka de 36 anos quando foi assassinado em Magher, na Irlanda do Norte. Em meados de outubro de 2018, a polícia acusou dois adolescentes do assassinato. Um deles é conhecido como Adrian K. também polaco. A identidade do segundo permanece em segredo por causa de sua idade. 

Konrad de 32 anos morreu em Londres, de câncer em agosto. Mariusz morreu de cirrose no fígado, Remigiusz de 40 anos cometeu suicídio, Henryk de 62 anos foi encontrado morto no centro de Plymouth, em Devon.

As histórias de casa um deles foi contada na "Duży Format" (formato grande), onde está relatado que a maioria dos desabrigados são pessoas com problemas já trazidos da Polônia, muitas vezes com registro criminal, alcoolismo, doentes, que não mantêm qualquer contato com suas famílias na Polônia.

No caso de Tomasz, de 42 anos, a reportagem diz que só restou a ele o caminho das ruas depois que sua esposa o deixou. Antes disso, o homem tinha problemas com álcool. Tomasz morreu em circunstâncias difíceis de explicar. Seu corpo foi encontrado debaixo da ponte.

A reportagem é de Paweł Chojnowski que oferece um panorama triste dos emigrantes polacos na Gra-Bretanha. O autor cita estatísticas tristes sobre a falta de moradia nas ilhas e conta a história de polacos que passaram a viver nas ruas. Os personagens são desabrigados polacos de várias idades (também há crianças) de 32 e 81 anos. Eles morreram na Grã-Bretanha. Alguns eram alcoólatras, outros sofriam de doenças crônicas. Alguns cometeram suicídios, alguns foram vítimas de assassinos. 

Chojnowski buscou os parentes dos falecidos - membros da família e amigos - que compartilharam suas memórias.

Segundo as estatísticas, só em Londres, uma em cada 53 pessoas não tem teto sobre suas cabeças. Não se sabe quantos deles são polacos. No entanto, os dados sobre o número de mortes são conhecidos.

Maeve McClenaghan explica no relatório: "Sabe-se que o número de pessoas desabrigadas no Reino Unido está crescendo, mas eu queria saber quantas pessoas estão morrendo. Perguntei à polícia, enviei-os ao escritório do legista, à camara da cidade, aos hospitais, mas ninguém conta".

A Grã-Bretanha depois de ingressar na União Europeia e abrir seu mercado de trabalho para os polacos se tornou a principal rota da emigração. No entanto, este país de oportunidades não é um paraíso para todos. Há histórias de pessoas que não foram favorecidas pelo destino. A falta de moradia é um problema de muitos países e não apenas dos países pobres.

Somente nos Estados Unidos, de acordo com várias estimativas, existem mais de 550.000  desabrigados. Esse número pode ser surpreendente, porque, para muitos polacos, os EUA ainda são um paraíso inacessível e uma espécie de "terra prometida" que alimentará todos os que vierem. No entanto, hoje em dia, a imigração de polacos para os EUA diminuiu claramente após a entrada da Polônia na União Européia, e seus membros ocidentais começaram a abrir seus mercados de trabalho para os polacos.

Atualmente, os mais desabrigados nas ilhas são os próprios britânicos, depois deles estão os romenos, mas os polacos estão em terceiro lugar. No entanto, a falta de moradia no Reino Unido difere da falta de moradia na Polônia, embora suas origens sejam provavelmente semelhantes. Se alguém tiver problemas na Polônia, ele pode contar com muito mais ajuda do que em Londres.

A solução que imediatamente vem para a conversa sobre sair do desamparo no exílio é, claro, retornar ao país. No entanto, muitos polacos que foram para as Ilhas britânicas para ganhar dinheiro simplesmente ficaram envergonhados por não terem conseguido. Os polacos desabrigados na Grã-Bretanha também estão convencidos de que, depois de retornarem à Polônia, também morarão na rua.
Então eles preferem viver em uma rua britânica, e não numa rua da Polônia. 

No entanto, a vida sem-teto na Grã-Bretanha está associada à falta de ajuda de longo prazo do Estado para sair da falta de moradia. Existem muitas instituições diferentes ajudando os sem-teto na Grã-Bretanha, mas isso é ajuda temporária e imediata. Somente os britânicos ou pessoas que têm uma pensão de aposentadoria ou invalidez nas Ilhas podem contar com a ajuda para sair da falta de moradia - o que não é gratuito para eles.

No entanto, na Polônia, existem muitas organizações que fornecem essa ajuda. O próprio Brexit acaba sendo um problema, pois após o referendo na Grã-Bretanha, empresas especializadas em enviar polacos e imigrantes de outros países começaram a aparecer. Isso prova que os polacos que estão desabrigados na Grã-Bretanha acharão cada vez mais difícil ficar por ali.

O jornalista do Gazeta Wyborcza perguntou a um polaco desabrigado numa rua de Londres:
- "Qual foi o motivo da sua chegada em Londres?"

Stanisław Wójcik: "Na Polônia, eles me privaram de seguros. Porque se você não pagar contribuições ao ZUS, você não tem seguro. E aqui vim, eu tenho tudo. Você tem que trabalhar legalmente por 12 meses, você tem que se cadastrar e você pode começar a receber benefícios."

Stanisław Wójcik: "Eu costumava ir no Exército de Salvação, não é uma faculdade, mas é uma escola de graça. Há também a Crisis, que organiza cursos de idiomas. Eu fui duas vezes por semana durante 4 horas".

- "Você gostaria de voltar ao país?

Stanisław Wójcik: "Bem, não realmente. Eu vou ganhar em Lotto, vou para a Polônia. Eu sou residente permanente aqui".

- "E o que há na Polônia ...? Família?"

Stanisław Wójcik"Eu tenho pais em Rzeszów, eles estão aposentados. Eles vivem de alguma forma. Eu estou chamando. Eu os visito duas vezes por ano. Eu venho e sou o mais rico! Vodka por 15 zlotys. Para obter benefícios, você tinha que trabalhar um ano".



Existem mais de 20 tendas, nas quais 50 pessoas estão alojadas, incluindo muitos polacos, armadas n no parque da universidade perto da estação de Piccadilly, em Manchester.

Os habitantes de Manchester estão insatisfeitos com a situação atual e afirmam que os moradores de rua são agressivos com eles. "Eu não entendo porque as autoridades da cidade permitiram que os desabrigados quebrassem suas barracas aqui. Essas pessoas eram agressivas comigo quando voltei a atenção para a bagunça que estão fazendo ao redor delas. Eles vieram aqui há poucos dias e parece que eles não vão sair ", disse um dos moradores locais.

Texto de Paweł Chojnowski
Tradução para o português: Ulisses Iarochinski
Fonte: 
http://wyborcza.pl/duzyformat/7,127290,24574060,27-polakow-zmarlo-na-ulicy-bezdomnosc-w-wielkiej-brytanii.html

domingo, 17 de março de 2019

Panorama polaco no contexto europeu

“O que alimenta hoje o populismo é a crise dos meios de comunicação tradicionais”

Marcin Zaborowski - Foto: Olgierd Syczewski
Acadêmico e investigador do think tank Visegrad/Insight, onde pensa a política externa polaca e a sua relação com a Europa, antigo diretor do Instituto de Assuntos Internacionais de Varsóvia e colaborador do Instituto de Estudos de Segurança da União Europeia, Marcin Zaborowski conjuga uma visão atual do que se passa no seu país e uma visão global da União Europeia. "A Polônia está isolando-se cada vez mais da Europa", é uma das principais conclusões.

De modelo de transição, a Polônia é hoje um exemplo de uma democracia iliberal onde a independência dos tribunais está posta em causa. Pode não ser tão grave como a deriva húngara, mas afasta a Polônia dos seus parceiros europeus. Há, mesmo assim, uma possibilidade de a oposição conseguir vencer as eleições europeias de maio, apesar do controle governamental das televisões estatais do país. Até porque os polacos continuam a ser fortemente pró-europeus. A vantagem do Partido Direito e Justiça, que governa o país desde 2015, foi a sua política social, depois de um longo período de políticas liberais preocupadas com o déficit, mas não com a redistribuição da renda.

Público - A Polônia foi um verdadeiro modelo na transição democrática e na transição econômica. Quis assumir o status de um dos seis grandes países da União Europeia. De repente, tudo parece ter mudado na sua relação com a democracia e com a Europa. O que é que correu mal?

Zaborowski Temos de recuar até às eleições de 2015, ganhas pelo PiS - Partido Direito e Justiça. Havia alegações de corrupção em relação aos partidos do anterior Governo, os eleitores estavam cansados, queriam uma outra opção. E, no nosso sistema de coligações, a outra opção possível questionava abertamente algumas das bases da nossa ordem constitucional. Não se tratou, como em outros países europeus, de mudar da centro-direita para a centro-esquerda. Tratou-se de mudar de uma coligação que cumpria a Constituição para outra que questionava os próprios fundamentos constitucionais do sistema. Parte da explicação para esta mudança é interna. O PO - Plataforma Cívica estava no poder há oito anos e não tinha dado a devida atenção às políticas sociais.

Público - Mas a economia estava muito bem e, aliás, continua muito bem.

Zaborowski É verdade, continua. Mas, na percepção de muita gente, os ganhos da economia tinham sido distribuídos de forma muito desigual. Quando o Partido Direito e Justiça chegou ao poder, em 2015, adotou um programa social que, em termos de distribuição de rendas, era melhor e que lhes conquistou muito apoio. A vitória do PiS foi um misto entre essa preocupação social e a defesa de valores muito conservadores no que toca à relação entre o Estado e a Igreja, por exemplo, com uma forma de gestão da economia que se poderia dizer mais à esquerda. A alternativa anterior, no que toca à gestão econômica, era mais liberal e, em termos orçamentais, muito prudente e muito conservadora. Nunca tínhamos tido uma opção de governo que fosse claramente num sentido mais redistributivo. Este Governo atual criou, por exemplo, novos benefícios para as crianças ou para quem tivesse um segundo filho. Foi a primeira vez que as pessoas viram o Governo dar-lhes alguma coisa de concreto. E os polacos, é bom lembrar, gostam que o Estado os proteja, em boa medida devido à própria herança do regime comunista. Depois, o Governo também foi ao encontro de uma população crente, que vai à Igreja, que mantém valores sociais bastante conservadores e que tem, ao mesmo tempo, muitas expectativas em relação ao papel do Estado nas suas vidas.

Público - Quatro anos depois da chegada do PiS ao poder, quais são as principais consequências desta rejeição da ordem constitucional no que respeita ao funcionamento da democracia liberal?

Zaborowski Dois tipos de consequências. A primeira é a alteração do funcionamento do poder judicial. Continuamos a viver numa democracia mas deixamos de ser uma democracia liberal, assente na independência dos tribunais. A Polônia continua a ser uma democracia, porque o Governo foi eleito e não pôs em causa o sistema eleitoral. Quando o PiS ganhou a maioria, não conseguiu votação suficiente para alterar a Constituição. Portanto, o que o Governo está tentando fazer é mudar alguns aspectos da forma como os tribunais funcionam. Começou com um ataque ao Tribunal Constitucional, através da forma como os juízes são escolhidos. Depois, tentou mudar a lei de funcionamento do Supremo Tribunal, alterando a idade da aposentadoria dos juízes. A opinião pública se manifestou fortemente contra isso e eles tiveram de recuar. A outra tentativa foi em relação ao Procurador-Geral, que passou a ser basicamente o ministro da Justiça. Antes, era uma instituição completamente separada. Eles fundiram o papel do Procurador-Geral com o cargo do ministro. Também falharam na alteração às regras de funcionamento do Supremo Tribunal devido às pressões da União Europeia. Em síntese, tem havido um permanente assalto à independência dos tribunais ainda que até agora com resultados mistos. Mas, essencialmente, isso significa que já não vivemos num democracia liberal mas naquilo a que hoje chamamos, em oposição, de democracia iliberal.

Público - O segundo “ataque” foi aos meios de comunicação social?

Zaborowski Sim. A segunda grande questão é a da independência dos meios de comunicação social. Quando chegaram ao poder, mudaram o regime de funcionamento dos órgãos de comunicação social públicos. Antes, a imprensa pública era supervisionada por um conselho constituído por uma representação de partidos políticos e por pessoas da sociedade independentes do Governo. Mudaram a lei e agora todos os diretores dos canais públicos de televisão são diretamente nomeados pelo Governo. Deixaram de ser públicos para passarem a ser governamentais. Deixaram de ser livres para passarem a ser órgãos de propaganda.

Público - E os meios de comunicação social privados. Ainda são livres?

Zaborowski Ainda funcionam com liberdade, mas o Governo tenta controlá-los de outras formas, por exemplo, através do controle das empresas que os detêm. Mas mesmo assim, na sua maioria, mantêm-se independentes.

Público - Podemos dizer que as próximas eleições, que serão as europeias, ainda podem ser realizadas numa base essencialmente livre?

Zaborowski Livre, sim. A questão é se serão justas. Nem todas as pessoas terão o mesmo acesso à informação. A oposição não terá o mesmo acesso aos órgãos de comunicação públicos, sobretudo às televisões, que apresentam as questões de uma forma enviesada, sempre favorável ao Governo.

Público -  Como sabe, há muita gente na Europa que diz que a grande batalha pela alma europeia será travada na Polônia. A oposição tem alguma possibilidade de vencer as eleições europeias?

Zaborowski Até agora, as sondagens indicam um empate — 50% de probabilidades para cada lado [as mais recentes pesquisas de opinião pública indicavam que a Coligação a favor da Europa estava à frente do PiS, com 35% para 33%, respectivamente]. Os partidos da oposição moderada conseguiram se unir numa ampla plataforma política — a “Coligação Europeia” — que inclui o  PO - Plataforma Cívica, sociais-democratas, ex-comunistas, “verdes” e que representa uma grande aliança pró-democrática. Nas pesquisas, ou estão ligeiramente à frente ou pouco atrás do partido governamental. Seja como for, as eleições vão ter um resultado muito decente. Mas o Governo não está inativo e já anunciou mais uma série de medidas sociais muito populares, por exemplo, o aumento das pensões, mais benefícios para as crianças, isenção de impostos para quem tenha menos de 26 anos. Vamos ver que impacto isso terá nos resultados.

Público - Podemos dizer que, além dessa dimensão estritamente doméstica, a grande divisão é entre partidos que são claramente pró-europeus e partidos, como o do Governo, com uma posição na melhor das hipóteses muito crítica da União Europeia?

Zaborowski Estas eleições serão, como você se referiu, muito importantes para a Europa, sob muitos aspectos. O partido de [primeiro-ministro húngaro] Viktor Orbán vai ter, possivelmente, de abandonar o Partido Popular Europeu [PPE, centro-direita] e, se tal acontecer, pode vir a se juntar ao grupo dos Conservadores e Reformistas Europeus, do qual o PiS da Polônia faz parte e também ainda os Conservadores britânicos. Se isso acontecer, mesmo com a saída dos britânicos, pode tornar-se no terceiro maior grupo parlamentar do Parlamento Europeu.

Público - Voltando à questão europeia, quando o PiS conquistou o poder anunciou que a Polônia “deixaria de estar de joelhos” perante a União Europeia. Isto quer dizer que há um sentimento generalizado de rejeição à Bruxelas? Que é uma espécie de novo império, ainda que mais benigno?

Zaborowski Os polacos não compram essa ideia. As razões pelas quais votaram no PiS não foram essas, nem foram sobre o seu programa europeu, mas antes, como já referi, pelas suas promessas de natureza social. Uma vasta maioria dos polacos continua a ser muito pró-europeia. As pesquisas apontam para índices acima dos 80%, correspondendo ao resultado do referendo sobre a adesão em 2003. Além disso, a Polônia continua a ser a maior beneficiária líquida do orçamento europeu. As pessoas percebem que o país mudou e continua a mudar, em boa medida graças ao apoio da União Europeia. É isso que as pessoas realmente sentem. A propaganda do Governo vai no sentido que se referiu — que a Europa nos impõe coisas que não queremos —, mas não está, claramente, dando resultados. E eles perceberam isso e já adaptaram a sua mensagem. Agora, dizem que não são contra a Europa, dizem apenas que a Europa foi longe demais e que são eles os verdadeiros europeus. Também insistem em que o “Brexit” é culpa da União Europeia e não dos britânicos. O Reino Unido é, talvez, o único país da União Europeia com quem têm boas relações. Mas, no geral, estão hoje bastante isolados no quadro da União. Tentam ser muito pró-britânicos e, muito mais ainda, pró-América.

Público - Com a concretização da saída do Reino Unido, vão perder o seu principal aliado. Que alternativas têm?

Zaborowski Não muitas. Em primeiro lugar, a Hungria de Viktor Orbán. Mas também mantêm conversações com [o vice-primeiro-ministro italiano e líder da Liga] Matteo Salvini. Ele esteve aqui recentemente, teve um encontro com Jarosław Kaczyński, o verdadeiro líder do PiS. Mas há um problema nesta relação: eles consideram que Salvini é demasiado pró-russo. Não o suficiente para não poderem entender-se em algumas questões com ele, mas mesmo assim demasiado. Mas a sua característica principal é serem muito, mas mesmo muito pró-América, quase numa reprodução dos tempos da Guerra Fria.

Público - Percebe-se que sejam pró-americanos também porque atribuem, com razão, aos Estados Unidos a libertação do império soviético. Aliás, como os outros países da Europa Central e de Leste. Li recentemente um dos seus textos sobre a política externa polaca em que a define como “America First”. O que quer exatamente dizer com isso?

Zaborowski Tem razão, quando diz que os polacos são, de um modo geral, pró-americanos, pelas razões que mencionou. Aliás, a Coligação Europeia é igualmente pró-americana. Mas agora a questão é a do reforço da cooperação militar com os EUA e é, sobretudo, no sentido em que o Governo gosta de Donald Trump e do seu comportamento político, que se assemelha muito ao que ele próprio pratica. Além disso, o fato de se sentirem isolados na União Europeia leva-os a este “saltoem direção aos Estados Unidos. Mesmo que, muitas vezes, as coisas também não aconteçam exatamente como eles desejariam.

Público - Podemos dizer que é mais pró-Trump do que pró-Estados Unidos?

Zaborowski Sim. É a maneira certa de colocar a questão. Você viu, com certeza, as notícias sobre a conferência sobre o Oriente Médio que se realizou recentemente em Varsóvia.

Público - Sim.

Zaborowski O Governo quis oferecer a Washington uma iniciativa política que era do interesse estritamente americano, mas nem tudo lhe correu bem. A conferência não significa que a Polônia tenha um particular interesse no que se passa no Oriente Médio, apenas que quis agradar a Trump, que estava muito interessado nela, sobretudo por causa do Iran, para encontrar uma maneira de pressionar os europeus em relação ao acordo nuclear com Teerã. Mas isso acabou por não funcionar, como certamente você reparou. A participação europeia foi limitada e muitos governos europeus manifestaram o seu descontentamento com a iniciativa polaca, deixando a Polônia ainda mais isolada. Além disso, a pretensão do Governo de convencer os americanos a instalar uma base militar na Polônia, pela qual dizem que estão dispostos a pagar 2 mil milhões de dólares, não teve qualquer sucesso até agora. Apenas irritou os aliados europeus e a própria NATO. O PiS também quer ter uma boa relação com Israel, ou melhor, não tanto com Israel, mas sobretudo com o Governo do Likud.

Público - Houve, aliás, durante a conferência um desentendimento em relação a Israel e aos judeus, que não correu muito bem ao Governo polaco e que levou um distanciamento dos próprios Estados Unidos. Creio que foi a propósito da lei, muito polêmica, que criminaliza qualquer referência que considere que os polacos tiveram alguma coisa a ver com a perseguição dos judeus e com o Holocausto. Isto significa que a questão judaica está outra vez presente no debate público polaco?

Zaborowski O PiS não é um partido antissemita, convém sublinhar isso. Mas é um partido muito nacionalista. Quando fizeram aprovar essa lei, não creio que fosse por antissemitismo mas apenas porque querem libertar a nação polaca de qualquer responsabilidade pelo Holocausto e por Auschwitz. Mas os americanos são sempre muito sensíveis neste domínio, com a Polônia ou com outro país qualquer, e não deixaram de criticar o Governo. As pressões internacionais, principalmente dos EUA e de Israel, em relação a essa lei acabaram por levar o Governo a recuar, abrindo uma exceção para a investigação histórica. Mas, em relação à conferência, os israelitas não mostraram qualquer gratidão, pelo contrário, renovaram as suas alegações históricas, os americanos dirigiram o espetáculo, assinaram alguns contratos de defesa, mas não prometeram absolutamente nada.

PiS não é um partido antissemita, convém sublinhar isso. Mas é um partido muito nacionalista". Na foto: Jarosław Kaczyński, "o verdadeiro líder do PiS" -Foto : Kacper Pempel/REUTERS
Público - Qual tem sido exatamente o papel da Igreja Católica no apoio ao Governo?

Zaborowski A Igreja polaca se tornou muito política e, na sua maioria, apoiou o partido do Governo. E isso compreende-se porque o PiS é muito conservador em matéria de costumes, desde a oposição ao casamento entre homossexuais até às políticas mais liberais nesta questão que são hoje comuns na União Europeia. Mas isso também tem tido um efeito não desejado. As pessoas são católicas, vão à Igreja, mas não é isso que determina as suas posições políticas. O Prefeito da cidade de Gdańsk, da oposição, que foi assassinado no passado mês de janeiro durante uma festa de caridade, era um católico praticante. Agora, há muita gente como ele que começa a deixar de ir à Igreja. A Igreja teve um papel fundamental na unificação do país e mas está a correr o risco de perder esse papel. Há aqui também uma mudança importante.

Público - Nesta crise existencial que a Europa atravessa, muitos analistas têm referido uma linha de fratura cada vez mais acentuada entre o Leste e o Ocidente. O que é que há de comum entre, por exemplo, os países de Visegrado, que justifique esta divisão?

Zaborowski Os países de Visegrado são muito diferentes entre si e na sua relação com a Europa. Há países do Leste (na verdade da Europa Central) que já são membros da zona euro, por exemplo. Alguns deles são democracias estáveis. Mas, no conjunto, sofrem das mesmas dificuldades de consolidação democrática que é comum aos países da Europa do Leste. As suas democracias não são tão sólidas como chegou a parecer há alguns anos, são ainda muito recentes e a sua independência em relação à União Soviética também. A questão-chave, creio eu, é a questão dos meios de comunicação social e nem sequer é apenas um problema apenas desses países. Nas democracias consolidadas, os meios de comunicação tradicionais também atravessam uma crise profunda, que resulta da presença crescente das redes sociais e de uma nova forma de comunicação. E isso é ainda mais evidente nesses países, onde os órgãos de informação tradicionais e a liberdade de imprensa nunca chegaram a ser tão fortes. Além disso, nesses países, boa parte dos meios tradicionais ou são controlados pelos governos, ou estão muito dependentes dos contratos com os governos.

Público - Mas é correto dizer que os problemas com a democracia são os mesmos na Polônia, República Tcheca, Eslováquia ou Hungria? Que são todos iguais?

Zaborowski Não. A Hungria é o caso mais grave. Basta olhar para o mais recente relatório da Freedom House, onde a Hungria já não está no grupo das democracias consolidadas. Na Polônia, as coisas também não estão bem, como já vimos, mas ainda é considerada como um país onde pode haver eleições suficientemente livres para alterar a situação, mesmo que a Freedom House tenha insistido, nos seus últimos relatórios que a democracia tem se deteriorado desde 2015. As coisas variam em termos de transparência do sistema mas, para além da Hungria, nesses países ainda é perfeitamente possível mudar de governo. Na República Tcheca e na Eslováquia há uma grande influência da Rússia, sobretudo através das redes sociais e dos meios eletrônicos, mas, de um modo geral, as coisas correm bem. Por exemplo, nos dois países ainda há um consenso político pró-europeu relativamente grande. Não houve, nem em um nem em outro, qualquer ataque ao poder judiciário, como aconteceu na Polônia. Por isso, não se deve meter todos no mesmo saco.

Público - A Alemanha fez um grande esforço de aproximação com Varsóvia, mas o atual Governo polaco trata tão duramente Bruxelas como Berlim. Como é que o senhor vê hoje o papel da Alemanha na União Europeia e também na Polônia?

Zaborowski Para a Polônia, como um pouco de frustração, na verdade. Para a Polônia, é uma relação muito importante, talvez a mais importante, e tem sido mutuamente benéfica. Mas o Governo alemão não faz qualquer crítica ao Governo de Varsóvia. Claro que por razões históricas, Berlim evita sempre criticar qualquer governo polaco. As relações continuam a ser normais, há reuniões entre os governos. Mas, aqui, o Governo de Berlim é bastante criticado por não dizer nada sobre o que se passa com o Governo polaco e com a democracia. Mas, naturalmente, a Alemanha é ainda a potência indispensável. Foi essencial no lançamento e na preservação da integração europeia. Foi também o motor fundamental da ampliação em direção a Polônia e aos outros países da Europa Central e do Leste. Se, depois da II Guerra, a Alemanha se aproximou da França para viabilizar a integração europeia, depois da Guerra Fria fez a mesma coisa em relação à Polônia. Contudo, como outras nações, a Alemanha também é uma potência egoísta, que pensa em primeiro lugar nos seus próprios interesses.

Público - Berlim está de novo patrocinando uma nova ligação direta entre a Rússia e a Alemanha para a importação de gás — o Nord Stream II. Houve um coro de protestos na Polônia, quando o Nord Stream I (lançado em 2005 por Putin e o anterior chanceler Gerhard Schroeder) foi construído. Como é que se vê aí este comportamento?

Zaborowski O Nord Stream II é um exemplo clássico desse comportamento egoísta que ignora os interesses e as percepções das nações que estão entre a Alemanha e a Rússia, incluindo a Polônia. Mesmo assim, a relação entre a entre os dois países é demasiado rica e demasiado importante para permitir que este desentendimento a prejudique, até porque é essencial para a estabilidade do continente europeu.

Público - Como alguém que conhece muito bem a União Europeia, como é que o senhor vê esta crise profunda que atravessa? É possível ultrapassá-la? Até porque o nacionalismo não é apenas um problema polaco. É um problema europeu.

Zaborowski Creio que a União Europeia lidou bem com a crise do euro, que chegou perto da ruptura da zona euro. A União saiu dela mais forte e mais integrada — principalmente com a criação da União Bancária e do Pacto Orçamentário. A confiança dos países europeus na moeda única é mais forte agora. Mas a Europa não lidou da mesma maneira satisfatória com a crise migratória de 2015, que revelou mais desunião do que união. A União também ainda não conseguiu responder ao desafio do populismo, que começou na Europa Central — com Orbán e Kaczyński — e que desde aí se propagou para outros países. O populismo também alimentou o “Brexit” e a eleição de Trump. Não é apenas um problema europeu mas uma crise mais ampla das democracias liberais do Ocidente que, em larga medida, perderam o contacto com os eleitores. Mas também o que alimenta hoje o populismo é a crise dos meios de comunicação social tradicionais. Creio que a União Europeia devia investir recursos significativos nos órgãos de informação tradicionais para garantir que as pessoas continuem a ter acesso a uma informação credível e variada.

Público - A envolvente política externa da Europa mudou radicalmente nos últimos anos. Trump não gosta da integração europeia, rompendo com uma política americana que se manteve desde a guerra. A Rússia voltou a ser uma ameaça. A China decidiu entrar no jogo. A Europa está preparada para lidar com estas mudanças profundas?

Zaborowski Não creio que esteja. Os Estados Unidos, com a presidência de Donald Trump, deixaram de apoiar a integração europeia. Para ser mais exato, estão trabalhando diretamente para quebrá-la. A Rússia utiliza qualquer oportunidade para enfraquecer o Ocidente e a União Europeia, que é o seu principal “concorrente” na Ucrânia, Bielorrússia, Geórgia ou Moldava. A China continua a ser um concorrente econômico, mas ainda não parece estar tentada a quebrar a União Europeia. A Europa deixou de poder contar com ao apoio geopolítico dos EUA. Precisa contar consigo mesma, o que também quer dizer que não pode continuar a seguir a América. Tem todas as condições para se transformar numa verdadeira potência mas a questão que se mantém é saber se tem a vontade necessária.

Fonte: Público, Lisboa
Texto: Natália Faria e Teresa de Souza
Adaptação para o português do Brasil: Ulisses Iarochinski