quinta-feira, 21 de dezembro de 2023

Tusk recupera o controle dos veículos de comunicação estatais

A polícia foi chamada para retirar os ocupantes e impedir
que Jarosław Kaczyński invadissem a sede da TVP

O novo governo da Polônia tomou medidas, nesta quarta-feira, no sentido de tirar o controle da TVP - Telewizja Polska, englobando os canais de televisão, rádio e agência de notícias estatais do país das mãos de partidários do PiS - Partido Direito e Justiça, que perdeu o poder após as eleições parlamentares de 15 de outubro.

A medida faz parte de uma ampla reformulação que levou o novo parlamento a criar comissões especiais para investigar as ações do governo anterior – que esteve no poder desde 2015. O novo governo também está substituindo os chefes dos serviços de segurança.

Separadamente, um tribunal, que não está sob controle político, condenou na quarta-feira dois proeminentes políticos do PiS a penas de prisão por crimes cometidos quando o partido de Jarosław Kaczyński governou brevemente, de 2005 a 2007, quando seu irmão gêmeo Lech era o Presidente da República.

A televisão estatal TVP, a Rádio Polaca e a Agência de Imprensa Polaca (PAP) ficaram sujeitas a uma forte censura política pouco depois do partido de extrema-direita PiS ter conquistado o poder em 2015.

A cobertura foi fortemente distorcida a favor do governo de plantão, algo que os observadores eleitorais disseram ter favorecido bastante o PiS, bem como o presidente da República Andrzej Duda, que é do mesmo partido de Kaczyński e ajudou a mudar o resultado na votação parlamentar de 2019 e nas eleições presidenciais de 2020.

A mídia estatal também apoiou fortemente o PiS na campanha para as eleições parlamentares deste ano.

O governo do Partido Direito e Justiça gastou mais de 2 mil milhões de złotys (2.471.486 milhões de euros) na TVP este ano e mais de 7 mil milhões (8.650.201 milhões) de 2017 a 2022.

Tais gastos desmedidos e situação política foram preponderantes para a tomada de decisão de recuperar o controle dessas instituições de Tusk e o seu governo de Coalizão de Centro-Esquerda antes das eleições locais da próxima primavera e das eleições europeias em junho.

Na manhã de quarta-feira, o Ministro da Cultura, Bartłomiej Sienkiewicz, demitiu os diretores, chefes e editores da TVP, da Rádio Polaca e da PAP. O Ministério indicou que “exerce direitos de propriedade em benefício do erário público do Estado, e detém 100% das ações” em empresas públicas de comunicação social.

O ministério afirmou ainda num comunicado: “O Ministro nomeou novos conselhos de supervisão para as empresas acima mencionadas, que por sua vez nomearam novos conselhos de administração”

Os atuais funcionários ligados ao PiS foram proibidos de entrar nos edifícios dos meios de comunicação social e a polícia foi chamada.

O canal de notícias 24 horas da TVP,  o TVP Info, saiu do ar, brevemente, após o anúncio da decisão, antes de retornar com uma antiga série de televisão sobre um padre que trabalha como detetive (versão polaca do seriado italiano com Terence Hill (nome artístico de Mario Giuseppe Girotti). A TVP1, principal canal de televisão pública do país, apenas transmitiu seu logotipo durante 10 minutos, em vez dos programas regulares do meio-dia.

Um dia antes, o Parlamento aprovou uma moção apelando ao Ministério da Cultura para que tome medidas decisivas para restaurar “o acesso dos cidadãos à informação fiável e ao funcionamento dos meios de comunicação públicos, bem como para garantir… [sua] Independência, objetividade e pluralismo.”

Antes desta votação, o Presidente Duda enviou mensagem ao Parlamento, pedindo aos deputados que “agissem dentro dos limites da Constituição”.

A medida de quarta-feira foi recebida com indignação pelos deputados do Partido Direito e Justiça, muitos dos quais ocuparam a sede da TVP, em Varsóvia, numa tentativa de evitar mudanças administrativas. A eles juntou-se Jarosław Kaczyński, líder do PiS e governante de fato da Polônia desde 2015.

Kaczyński, visivelmente irritado bradou: “Esta é uma defesa da democracia”. Raivoso, ele havia dito na terça-feira, à noite. “Em cada democracia deve haver uma forte mídia antigovernamental.”

Confrontado por manifestantes anti-PiS, na quarta-feira, Kaczyński ficou furioso. Aos gritos ele disse para um manifestante contrário à sua ideologia: “Cuidado, você acaba na cadeia, seu merdinha”.

Voz forte
Os meios de comunicação públicos polacos são financiados através de taxas de licença obrigatórias pagas pela população e, por lei, são considerados isentos de preconceitos. Nos governos anteriores, inclinaram-se para quem estava no poder, mas tentavam ser amplamente justos.

No entanto, quando o PiS venceu as eleições de 2015, este agiu, rapidamente, para demitir  administradores, editores e repórteres que foram considerados não apoiadores do novo governo. O argumento do PiS era que os meios de comunicação públicos eram necessários como contrapeso à televisão e aos jornais privados, que geralmente favoreciam os seus oponentes.

Perder o controle dos poderosos meios de comunicação, imediatamente, após perder o Poder é um golpe duplo para o partido conservador, que buscou levar o país às trevas da idade média.

“O governo Tusk está implementando seu plano de confiscar os meios de comunicação públicos, ignorando a lei”, disse Beata Szydło, antiga primeira-ministra do PiS e agora membro do Parlamento Europeu. Ele disse no site X. “A administração Tusk atropela os princípios básicos da democracia.”

Maciej Swirski, chefe do instituto regulador estatal de mídia apoiado pelo PiS, descreveu a medida como uma “violação flagrante da lei”.

Mas a Nova Coalizão governante celebrou. “Bom dia, mídia livre.” Disse Robert Biedroń, membro do Parlamento Europeu pelo Partido da Nova Esquerda, que faz parte da coligação liderada por Donald Tusk.

Faz parte de um esforço mais amplo do governo Tusk para isolar o PiS das fontes de poder político e dinheiro.

As empresas controladas pelo Estado, a maioria das quais dirigidas por partidários do PiS, estão se preparando para uma verdadeira e imensa purga. Nos últimos dias, o parlamento criou comissões especiais que investigarão irregularidades passadas, como contratos duvidosos da era do coronavírus e o gasto de 70 milhões de złotys para realizar as eleições de 2020 por voto postal, que não foi autorizado pelo parlamento. Na terça-feira, Tusk nomeou novos chefes dos principais serviços de inteligência e segurança, para os postos dos que foram acusados ​​de apoiar o PiS e de espionar os adversários do partido.

Na quarta-feira, o tribunal também condenou dois proeminentes parlamentares do PiS à prisão por abuso de poder, em 2007, na sequência de uma decisão do Supremo Tribunal de que o perdão de Duda em 2015, era falho.

Os dois – Mariusz Kamiński, antigo ministro dos serviços de segurança, e o seu vice, Maciej Wasik – disseram que iriam ignorar a decisão e recusar-se a ceder os seus assentos parlamentares. “Esta decisão, que não reconhecemos, não dá razão para virarmos os nossos assentos. É desprezível”, disse Kamiński no parlamento.

O novo Ministro da Justiça Adam Bodnar disse: “Somos todos iguais perante a lei e obrigados a obedecê-la… Só um tribunal independente pode decidir a culpa. É disso que se trata o Estado de direito.”

O gabinete do presidente Duda insistiu que a decisão era falha. “Perdão, senhores, e o perdão é válido e tem força legal,” disse Małgorzata Babroka, Assessora do Presidente.


Fonte: Agência Reuter
Texto: Paulo Afonso
Tradução: Ulisses iarochinski