quarta-feira, 25 de junho de 2014

Reportagem de seu enviado especial, publicada hoje pelo jornal espanhol "El Pais", de Madrid, sobre a visita do primeiro ministro espanhol Mariano Rajoy a Polônia, mostra a temperatura política altíssima entre os polacos:

Um escândalo de escutas telefônicas sacode a Polônia

O primeiro-ministro espanhol, Mariano Rajoy, começa a se acostumar a chegar a países em plena revolução política. Na Itália, por exemplo, foi o último a visitar Enrico Letta antes de sua demissão. Mas nunca tinha chegado ao nível de hoje em Gdansk. Rajoy viu como o primeiro-ministro polaco, Donald Tusk, aproveitava a declaração conjunta na reunião de cúpula entre Espanha e Polônia em Gdansk, a cidade onde nasceu o Solidariedade, o sindicato de Lech Wałęsa, para denunciar em tom muito grava um enorme complô "para desestabilizar a Polônia, o Governo e o partido que apoia o Governo".
Tusk, que cancelou a habitual entrevista coletiva conjunta precisamente para que a imprensa polaca não fizesse perguntas, deu uma longa declaração para tratar do escândalo político provocado pela publicação de conversas privadas de vários ministros e empresários sobre assuntos centrais para o país como relação com os EUA ou as negociações em Bruxelas. 
A revista Wprost publicou este domingo a transcrição parcial de uma suposta conversa entre Radosław Sikorski, titular do Ministério do Exterior, e o ex-ministro da Fazenda polaco Jacek Rostowski, na qual o primeiro opinava que a aliança da Polônia com os EUA não tem nenhum valor e "inclusive é prejudicial, já que cria uma falsa sensação de segurança".
Donald Tusk se defendeu atacando àqueles que estão pedindo demissões e deixou no ar a possibilidade de que por trás desta operação poderia estar inclusive a Rússia pela posição da Polônia, que reclama mais sanções pela crise da Ucrânia. Tusk não chegou a citar os russos, mas era o que se deduzia de suas palavras. "Este escândalo de escutas provoca uma crise política desconhecida. Não tenho nenhuma dúvida de que quem colocou as escutas é um grupo organizado de delinquentes . Não fizeram isto movidos pelo interesse público. O único resultado é desestabilizar o Estado polaco em um momento muito delicado, quando a posição forte da Polônia tem muita importância nas decisões que a União Europeia tomar sobre a Ucrânia.
Estas são as intenções, insistiu frente a um atônito Rajoy. "Estas escutas desestabilizam o Estado, não estão pensadas para causar a demissão de um ou outro ministro, mas para paralisar todo o governo. Os políticos que estão satisfeitos têm uma visão política muito curta", disse Tusk para criticar a oposição. 
"O interesse comum do Estado polaco é identificar o grupo que organizou estas escutas. A febre destes dias faz com que percamos a perspectiva. O elemento-chave é identificar quem organizou isto, o grupo que atua para desestabilizar o Estado polaco. As pessoas que organizam escutas não podem decidir quem será demitido. Estas gravações poderiam se converter em fonte de chantagem. Uma coisa é o aspecto ético e outra proteger a estabilidade do Estado".
A declaração era de tal importância que Rajoy foi obrigado a falar algo. "Eu não ia tratar deste tema, mas vou falar pelo que escutei. Eu me solidarizo com todas as pessoas que foram objeto de gravações ilegais, que defendem um direito fundamental, que é o da privacidade das comunicações, e quero desejar sorte a você e a seu Governo", disse olhando para Tusk "e gostaria que os autores destas gravações ilegais fossem colocados logo à disposição da justiça."
Rajoy não foi alvo de gravações ilegais, mas no PP causou muitos problemas a publicação de algumas gravações no caso Gurtel realizadas com autorização judicial. No entanto, isso é algo completamente diferente do caso polaco.
O próprio Rajoy viu como foram publicados alguns SMS no qual ele animava e recomendava que Luis Bárcenas, ex-tesoureiro do PP, aguentasse, mesmo depois de saber que este tinha pelo menos 16 milhões de euros na Suíça.

Texto:
CARLOS E. CUÉ, ENVIADO ESPECIAL