segunda-feira, 14 de janeiro de 2019

Prefeito de Gdańsk é assassinado

Foto: AFP
O prefeito da cidade de Gdańsk, na Polônia, Paweł Adamowicz morreu nesta segunda-feira, após ter sido esfaqueado no coração, durante um evento de caridade neste domingo à noite.

A confirmação da morte foi divulgada pelo cirurgião Tomasz Stefaniak em um comunicado à imprensa local.

O prefeito "sofreu uma lesão grave no coração e outras lesões no diafragma e órgãos da cavidade abdominal", explicou o médico. "Não vencemos a morte", disse o ministro da Saúde, Łukasz Szumowski.

Paweł Adamowicz, de 53 anos de idade, chegou a ser operado no hospital universitário de Gdańsk, mas não resistiu ao ferimento.

O prefeito foi atacado por volta das 20h (horário local) por um rapaz, que invadiu o palco onde Adamowicz estava e após atingi-lo exibiu a faca ao público.

Momentos antes do ataque ao prefeito - Foto: Michał Kolanko
Em seguida, o agressor pegou o microfone e disse que tomou aquela atitude porque foi preso injustamente pelo governo anterior, tendo sido, inclusive, torturado.

Após o ataque ao prefeito, Stefan ficou claramente satisfeito com sua ação. "Olá, olá, meu nome é Stefan Wilmont, eu era um inocente na cadeia, eu era inocente na cadeia, o Partido da Plataforma Cívica me torturou, é por isso que Adamowicz morreu", gritou antes de ser detido pelos seguranças.

Foto: Grzegorz Mehring
Adamowicz era o prefeito há mais tempo na Polônia. Vinha sendo reeleito desde 1998. Pertencia ao PO - Partido da Plataforma Cívica, principal opositor ao governo nacional de extrema-direita que governa a Polônia atualmente.

Adamowicz participava da campanha tradicional caritativa da Polônia - Wielkiej Orkiestry Świątecznej Pomocy (Grande Orquestra da Caridade de Natal) - de arrecadação de verba para a compra de novos equipamentos para hospitais da cidade.

O assassino tem 27 anos e foi identificado pelo nome e a primeira letra do sobrenome (como de costume na Polônia) como sendo Stefan W.

O procurador-Geral da República Krzysztof Sierak já anunciou que o procurador Distrital de Gdańsk iniciou uma investigação sobre o assassinato de Paweł Adamowicz.

Stefan W. deve ouvir a acusação de homicídio, na qual ele agiu com motivações que merecem condenação especial. "Há dúvidas quanto à sanidade do acusado, por isso ele será examinado por dois psiquiatras especialistas" - disse Sierak.

 O Ministro da Justiça Zbigniew Ziobro declarou que o assassino, em 2014, foi condenado por uma série de assaltos à SKOK - Caixa da Cooperativa de Crédito e da sucursal da Crédito Agrícola, a cinco anos e meio de prisão.

Stefan W. atacou - usando um revólver as agências da SKOK "Stefczyka" e SKOK "Piast" além do Credit Agricole. Seus roubos foram calculados em 15 mil złotych (próximo de 15 mil reais). Durante o julgamento, ele se declarou culpado.

Anteriormente, ele também tinha atacado um policial. "Ele acabou cumprindo outra sentença", - informou a tenente-coronel Elżbieta Krakowska, porta-voz da polícia.

A vice-prefeita Aleksandra Dulkiewicz afirmou que "todos nos perguntamos como poderia acontecer que este homem atacasse com uma faca um homem inocente. Devemos enfatizar que Adamowicz é uma pessoa aberta. Ele se encontrava com os habitantes de Gdańsk o tempo todo - este era o princípio de seu mandato. Paweł Adamowicz sempre ouviu a todos e intervinha pessoalmente se achava que alguém deveria ser ajudado." 

Seu amigo Aleksander Hall, ministro do governo do primeiro-ministro Tadeusz Mazowiecki, na presidência de Lech Wałęsa, diz que Adamowicz conseguiu vencer a eleição de prefeito da cidade tantas vezes, porque ele era completamente apaixonado por Gdańsk.

"É o resultado de seu verdadeiro fascínio para com esta cidade e seu conhecimento, combinado com seu senso visionário", argumenta.

Foto: Jan Rusek
No entanto, Paweł Adamowicz, como muitos moradores da cidade, não era um legítimo gdanskiano, pois seus pais, os economistas Ryszard e Teresa, eram de Vilno, quando em 1946, a Polônia perdeu a cidade para a Lituânia. Embora eles viessem da mesma cidade, eles se conheceram apenas em Gdańsk, onde se casaram e tiveram os filhos, Paweł e Piotr.

Paweł Adamowicz desde criança esteve interessado na vida pública e, como ele mesmo lembrava, foi despertado na introdução da Lei Marcial. "Como muitos de meus colegas, em 13 de dezembro de 1981, senti que fui chamado para servir e conspirar. Não poderia ter sido um observador por mais tempo. A Pátria exigiu ação", escreveu em seu livro.

"Quando em 2 de maio de 1982, a polícia me deteve pela primeira vez. Eu tinha menos de dezessete anos. Meus pais depois de muitas horas vagando de delegacia em delegacia, finalmente me encontraram na delgacia de Nowy Port ", ele relembra sua luta contra o governo soviético de Jaruzelski, em seu livro.

Adamowicz estudou direito na Uniwersytet Gdańsk. Durante a greve estudantil na universidade, em maio de 1988, ele foi eleito presidente do Comitê Estudantil Grevista.

Após a queda da URSS, provocada pelos operários dos estaleiros de sua cidade, ele também começou a trabalhar em meio período na Voivodia (Estado) da Pomerânia e no Clube Parlamentar Cívico. Seu chefe era Jacek Starościak, o primeiro prefeito da cidade pós-1990.

Neste mesmo ano, ele foi escolhido para ser vice-reitor no departamento estudantil da universidade Em 1998, após participar por alguns anos do Conselho Municipal (equivalente Câmara Municipal) foi eleito pela primeira vez, prefeito da cidade onde nasceu.

Quatro anos depois, em 2002, Adamowicz manteve sua posição em uma eleição totalmente democrática. Ele venceu no segundo turno, derrotando o candidato do Partido SLD, Marek Formela.
Em 2006 e em 2010, ele ganhou no primeiro turno. Em 2014 e 2018, ele precisou de mais tempo para vencer. Em 2014, ele derrotou Andrzej Jaworski, e na última eleição derrotou Kacper Płażyński (ambos candidatos do PiS - Partido Direito e Justiça dos irmãos Kaczyński, que atualmente tem o Presidente da República, o Primeiro-Ministro e maioria absoluta no Congresso Nacional).

Jacek Borowski, jornalista de Varsóvia, em sua conta no Facebook escreveu, "Stefan W., que matou Paweł Adamowicz não é um caso isolado de um animal que merece a mais severa punição e condenação. Não é uma "exceção excepcional" do além. Stefan W. é um filho de todos nós e o filho de tudo isso que foi feito, e como foi feito, neste país após a chamada "recuperação da liberdade". Ele é filho de cuspir na esquerda, glorificar fascistas, permissão para espalhar a igreja ... Ele é uma criança de 27 anos, cuja vida se encaixou completamente no tempo que se passou desde 1989... Ele é o fruto das lições religiosas nas escolas, programas "engraçados" de televisão de algum viajante do caralho, bandas de rock subitamente convertidas à santidade, funcionários do Estado usando camisetas da grife "Red is Bad", bonecas monstruosas zombando de Jerzy Owsiak e sua Grande Orquestra da Caridade de Natal, um outro milhão de pequenas incontroláveis histórias... Então, não fodam agora, que vão dar uma porrada nele, porque foram vocês quem criaram esse Mário, seus Mágicos de merda."

E nesta mesma segunda-feira, às 17 horas, o rosário foi rezado na Basílica de Santa Maria. Às 18 horas, começou manifestação ao redor da fonte de Netuno, no centro da cidade.

O mesmo ocorreu em várias outras cidades da Polônia, como Varsóvia, Szczeciń, Lublin, Cracóvia, Katowice, Olsztyń, Białystok e Toruń, onde o povo foi às ruas e igrejas católicas para guardar o luto pelo prefeito assassinado.


O presidente do Conselho Europeu da União Europeia, o polaco Donald Tusk foi ao velório do companheiro de partido.


Foto: Bartosz Bańka

Tusk foi um dos que falaram: "Caro Paweł, estamos aqui com você, seus amigos. Nós viemos aqui como um Gdańskiano. Todos se lembram de você desde a juventude. Você sempre esteve lá onde teve que mostrar uma cara boa e corajosa, onde teve que enfrentar o mal. Toda a sua vida foi baseada nisso. Para si e para todos nós, defenderemos nossa Gdańsk, nossa Polônia, a nossa Europa contra o ódio, o desprezo e a violência. Nós prometemos a você, Paweł. Tchau." 


Foto: Michał Ryniak
Tusk, assim como Lech Wałęsa também é de Gdańsk (que os ocupantes alemães teimaram em chamar de Dantzig por 150 anos). Outros famosos da cidade são o filósofo alemão Emanuel Kant, e o escritor também alemão Günter Grass , prêmio Nobel de Literatura (porque na época a cidade estava ocupada pela Prússia-Alemanha).

Na missa rezada, no centro da cidade portuária do mar Bático pelo arcebispo da cidade, compareceram vários personalidades polacas, como o ex-presidente Wałęsa, que ficou ao lado de seu desafeto político Jarosław Kaczyński.

Milhares de polacos manifestaram seu luto pelo assassinato do prefeito e seu protesto contra o ódio e a violência.

Ouviu-se uma voz forte cantar Krzyk Cyszy o (Som do Silêncio - Sound of Silence, de Paul Simon). Triste, amargurado, raivoso, maravilhoso, tocante!



Żegnaj, Pawle!
Foto: Renata Dąbrowska

Texto: Ulisses Iarochinski
Fontes: jornais Rzeczpospolita, Gazeta Wyborcza, TVN 24, AFP, Reuters.