Tadeusz Różewicz |
A singularidade, a peculiaridade, a fascinante diversidade, mas também o hermetismo (que dificulta uma transcendência internacional) da literatura polaca devem-se às relações dela com a complicada e dramática história da Polónia. Desde os inícios (os primeiros textos literários escritos em polaco datam do século XIII) até ao final do século XVIII a literatura polaca, literatura dum país livre (e no século XVI até duma potência), vive todas as aventuras e mudanças da literatura europeia, e produz grandes poetas que marcam as épocas deles, como Jan Kochanowski, Mikołaj Sęp Sarzyński ou Ignacy Krasicki, que estão entre os melhores criadores europeus do Renascimento, Barroco e Iluminismo, respetivamente.
O final do século XVIII, quando a Polónia perde a independência e por mais de 120 anos deixa de existir como Estado, é um momento em que nasce uma situação pouco comum, cheia de consequências literárias vivificantes, mas também mortíferas. Para uma nação desprovida de um Estado próprio, o escritor torna-se quase tudo: líder espiritual (e, às vezes, mesmo político), autoridade moral, legislador e guia. A literatura chega a ser a única forma de expressão e de preservação da identidade cultural da nação, e a língua torna-se a única pátria. Isso fez com que na literatura polaca do século XIX, como nunca antes ou depois, a palavra do poeta alcançasse o status de supremo bem, suprema lei, verdade, quase revelação. O poeta torna-se “bardo e profeta” da nação, e a literatura, “serviço e missão”. Só os maiores, geniais poetas do século XIX foram capazes de enfrentar este desafio: Adam Mickiewicz, Juliusz Słowacki, Zygmunt Krasiński, Cyprian Kamil Norwid.
Czesław Miłosz |
A partir dessa altura, a literatura polaca, carregada de obrigação patriótica, vai em diversos momentos históricos ora sucumbir à pressão do povo, ora rebelar-se contra o peso dele. É precisamente entre essas “obrigação” e “rebeldia” onde até à atualidade funcionam a poesia, a prosa e o drama polacos. É um espaço extraordinariamente rico em termos tanto de ideias, como de estética.
Entre a universalidade e o hermetismo – é um dilema e um drama refletido, por exemplo, na vida e na transcendência europeia dos primeiros criadores polacos laureados com o Prémio Nobel da Literatura. Henryk Sienkiewicz (1846-1916), autor de novelas históricas de imensa popularidade, escritas “para levantar os ânimos”, as quais mesmo hoje em dia são as mais lidas na Polónia, ganhou renome internacional com a novela “Quo Vadis”, que mostra a formação do cristianismo, e foi levada ao cinema em várias ocasiões tanto na Polónia, como no estrangeiro (Itália, EUA). Em 1905, Henryk Sienkiewicz foi galardoado com o Prémio Nobel da Literatura por toda a obra literária dele. Em 1924 o mesmo prémio foi atribuído a Władysław Stanisław Reymont (1867-1925), em reconhecimento do valor literário da novela “Chłopi” (“Os camponeses”), livre de mistérios e problemas polacos.
Witold Gombrowicz |
A literatura polaca do século XX, especialmente após a recuperação da independência nacional em 1918, fez da rebeldia contra essas “obrigações” uma das suas características distintivas mais importantes. Witold Gombrowicz, provavelmente o mais ilustre prosador contemporâneo polaco, de renome e importância internacional, precisamente da libertação, do “desprendimento do que é polaco” fez o fio condutor da inovadora produção literária dele.
Vários tons até então desconhecidos, como um grotesco ambíguo ou um catastrofismo filosófico, apareceram nas obras de Bruno Schulz e de Stanisław Ignacy Witkiewicz, cuja produção dramática antecipou o “teatro do absurdo”.
A literatura polaca da época comunista desenvolvia-se em duas vias paralelas: Miłosz, Gombrowicz, Herling-Grudziński, Kołakowski) podiam escrever livremente, sem limitações da censura nem qualquer servilismo ideológico; por outro lado, os autores que criavam na Polónia tinham de procurar um modo de existir e uma linguagem que, apesar de todas as limitações, lhes permitissem um discurso mais ou menos normal. O surgimento, após o ano de 1976, de editoras e publicações clandestinas salvou, em certo sentido, a literatura polaca, e, o que é ainda mais importante, contribuiu para as transformações históricas, que culminaram em 1989.
Sławomir Mrożek |
Zbigniew Herbert |
Eis o paradoxo: as difíceis para a liberdade de expressão condições de existência, junto com os condicionamentos históricos enraizados na tradição do século XIX, contribuíram para o surgimento do fenómeno da “escola polaca da poesia”, cujas transcendência e importância internacionais são hoje difíceis de sobrestimar, e cuja característica distintiva mais importante consiste na capacidade para contar o destino do indivíduo humano enredado na história de um modo que une a perspetiva individual com a universal, a existencial e metafísica com a histórica.
A grotesca dramaturgia de Sławomir Mrożek descreve esse destino desde um ponto de vista completamente diferente, e com outra linguagem. Também a “escola polaca da reportagem”, que constitui um género à parte e popular no mundo, conta-o à sua maneira. Para apresentar um quadro completo da literatura polaca é preciso acrescentar ainda a prosa, traduzida para muitas línguas, de escritores como Jerzy Andrzejewski, Jarosław Iwaszkiewicz, Tadeusz Konwicki, Andrzej Szczypiorski ou Marek Hłasko, e também a obra, caracterizada por uma singular poética filosófica da ficção científica, de Stanisław Lem, provavelmente o mais importante à escala mundial dos escritores contemporâneos deste género.
Wysława Szymborska |
Após a queda do comunismo em 1989, na literatura polaca aparecem, ou adquirem uma notável força de expressão, novas tendências, das quais as mais importantes e literariamente interessantes parecem ser as tentativas de procura, na complicada história moderna, das próprias raízes espirituais ou da própria “pequena pátria” (novelas de Paweł Huelle, Stefan Chwin, Antoni Libera), e também as tentativas de introdução na literatura dos sinais e ícones da cultura massiva, e da linguagem dos meios de comunicação modernos.
Fonte: Portal Oficial de Promoção da República da Polônia, em Portugal