quarta-feira, 29 de abril de 2020

Martírio dos padres polacos na II Guerra Mundial

São Maximiliano Kolbe - o mártir de Auschwitz

A Igreja na Polônia celebra hoje o “Dia do martírio do clero polaco durante a Segunda Guerra Mundial”.

Recorda-se o exemplo dos 861 sacerdotes polacos mortos sob o regime nazista no campo de concentração de Dachau, na Alemanha.

Um testemunho de fé vivido “até a morte”, mas também uma prova do “desejo” de viver a Eucaristia e os Sacramentos apesar da impossibilidade de fazê-lo. No “Dia do Martírio do Clero polaco durante a Segunda Guerra Mundial”, que é celebrado nesta quarta-feira (29) pela Igreja da Polônia, este é o exemplo dos 861 sacerdotes filhos da nação mortos sob o regime nazista no campo de concentração de Dachau.

O porta-voz da Conferência Episcopal da Polônia, padre Paweł Rytel-Andrianik fala sobre isso. “É o sangue daqueles mártires que nos dão o ‘fruto na fé’ até hoje, quando em plena emergência da Covid-19, somos impossibilitados de participar fisicamente às celebrações".

A entrevista
Foto: TVP.info
No dia de hoje - 29 de abril - recordamos o martírio, ou melhor, o testemunho da fé até a morte e ao mesmo tempo recordamos todos os mártires, não só de Dachau mas de todas vítimas: as vítimas dos totalitarismos, do nazismo e do comunismo.

Este é o dia da memória, do testemunho e da providência, porque aqueles sacerdotes prisioneiros em Dachau fizeram um voto: se sobrevivessem fariam uma peregrinação ao santuário de São José em Kalisz. Duas horas antes da destruição do campo de concentração, no dia 29 de abril de 1945 os prisioneiros foram libertados. Os sacerdotes interpretaram como um sinal da providência de Deus.

- Mais de 1.700 sacerdotes polacos foram deportados para os campos de concentração alemães. Quem eram e porque mais de 800 foram mortos?

Padre Paweł: Os nazistas levaram os sacerdotes para o campo de concentração em Dachau, também para outros campos de concentração polacos, simplesmente porque eram sacerdotes e eram o ponto de referência para as comunidades paroquiais. Para destruir a nação começaram exatamente pelos sacerdotes e os intelectuais do país. Estes 1.700 sacerdotes polacos fazem parte do grupo de quase 3.000 entre sacerdotes, bispos e irmãs que estavam em Dachau. E nos campos de concentração na Polônia também havia outros sacerdotes. E devemos recordar que os que estavam livres em suas casas também sofriam, tanto sob o regime nazista quanto o comunista.

- Que testemunhos permanecem da época, depois que o último sobrevivente faleceu em 2013?

Padre Paweł: Testemunhos de fé. São João Paulo II em 1995, no 50º aniversário da libertação do campo de concentração e extermínio alemão de Auschwitz, falou sobre o quanto aqueles sacerdotes, bispos e irmãs foram fiéis até o fim, dando testemunho de caridade e perdão. Falou também da dignidade de vida e justiça: sobre isso podemos recordar um mártir conhecido em todo o mundo, São Maximiliano Kolbe, que deu a própria vida por um pai de família.

Também na minha diocese de Drohiczyn há um exemplo, o sacerdote Antoni Beszta-Borowski. Seus amigos disseram que deveria fugir porque os nazistas tinham seus documentos e queriam prendê-lo ou matá-lo. Mas ele disse que não poderia deixar os seus paroquianos e os seus sacerdotes, porque se não o prendessem, prenderiam todos eles.

Quando foi capturado, algumas crianças assistiram a cena: um soldado alemão entrou na sacristia e pegou sua estola. Falou às crianças que nenhum sacerdote ficaria na cidade, rasgando a estola e jogando-a no chão. Uma senhora a juntou e guardou consigo. Anos depois, uma daquelas crianças, sobrinho do padre Antoni, na sua primeira Missa depois da ordenação sacerdotal, recebeu a estola daquela senhora.

Desde então nasceram muitas vocações naquele local. Acredito que seja um exemplo de que o sangue dos mártires leva a frutos na fé.

- Estava programado para estes dias uma peregrinação a Dachau, e adiada por causa do coronavírus. Quais são as esperanças para o futuro?

Padre Paweł: A peregrinação nacional em Dachau foi adiada para o fim da emergência da Covid-19. A comemoração tinha sido organizada em colaboração com a Conferência Episcopal alemã, e previa a participação do presidente, dos bispos locais, do clero e dos fiéis, assim como aconteceu cinco anos atrás quando foram celebrados os 70 anos da libertação do campo de concentração de Dachau.

Fonte: Vatican News
Texto: Giada Aquilino

segunda-feira, 20 de abril de 2020

Começou uma onda de demissões na Polônia

Fábrica de açúcar
No último mês de março, o número de funcionários no setor corporativo diminuiu 34.000, o maior número desde 2005.

O emprego no setor empresarial, para o qual o GUS-Główny Urząd Statystyczny (Departamento Estatal de Estatísticas) inclui firmas com pelo menos 10 funcionários, totalizou uma média de 6.411.700 de empregados em março, com 34,3 mil funcionários a menos que em fevereiro. Até o momento, o maior declínio desse indicador tinha sido registrado em dezembro de 2008, no auge da crise financeira global. Naquele momento, o emprego teve 33 mil pessoas a menos.

Dado que as restrições à atividade econômica destinadas a suprimir a epidemia de coronavírus, o governo começou a introduzir em meados de março, os dados do mercado de trabalho. E o divulgado nesta segunda-feira é preocupante. Sugerem que a epidemia do Covid-19 já levou a demissões consideráveis, mesmo em empresas relativamente grandes, onde predominam contratos de trabalho com períodos de aviso prévio.


Fronteiras fechadas do país pela primeira vez desde a entrada no espaço Schengen
"Em março de 2020, algumas firmas anotaram um forte declínio no emprego médio em comparação com o mês anterior. Foi o resultado de, entre outros, funcionários se aposentando, rescindindo contratos a prazo e não prorrogando-os - o que em alguns casos poderia ter sido causado pelo medo dos efeitos da pandemia do COVID-19. Além disso, a redução da média de emprego também foi afetada por: rescisão de contrato de trabalho ou licença não remunerada. Também foi observado um fenômeno crescente de funcionários que recebem benefícios de assistência e doença, que - dependendo do tempo de sua duração, também podem ter um impacto na maneira de incluir essas pessoas na média de emprego e ao mesmo tempo na remuneração ", explica o GUS em um comunicado à imprensa.

Em termos homólogos, o emprego no setor empresarial aumentou 0,3% em março, o menor desde maio de 2010, após um aumento de 1,1% em comparação com fevereiro do ano anterior. Essa leitura é exagerada pela mudança anual na amostra de empresas (em janeiro, o Departamento Central de Estatística acrescenta à análise, empresas que no ano anterior excederam o limite de nove funcionários), mas ainda mostra que a situação no mercado de trabalho se deteriorou mais do que se poderia temer. Economistas esperavam, em média, que o emprego em março aumentasse 0,8%. Apenas três das 25 equipes analíticas participantes da pesquisa esperavam resultados mais fracos do que os reais.


O salário médio no setor empresarial aumentou 6,3% em março, em comparação co mesmo mês de 2019, após um aumento de 7,7% em fevereiro. Essa leitura está próxima das expectativas da maioria dos economistas. A dinâmica salarial anual é positivamente influenciada por, entre outros um aumento significativo (em 16%) do salário mínimo no início de 2020.

Fonte: rp.pl
Texto: Grzegorz Siemionczyk
Tradução e adaptação para o português: Ulisses Iarochinski

sexta-feira, 10 de abril de 2020

Covid-19: Polônia prolonga isolamento até 26 de abril

Foto: AFP
As medidas implicam o fechamento de escolas e universidades e fronteiras que permanecerão fechadas até 03 de maio. No entanto, mantém-se o calendário eleitoral para a presidência da República.

Segundo o primeiro-ministro polaco, Mateusz Morawiecki, o transporte internacional de passageiros, quer por via aérea, quer por via férrea, vai continuar suspenso até 26 de abril e a maioria das empresas - exceto mercearias e farmácias - estará fechada até 19 de abril.

O prolongamento das medidas de prevenção inclui ainda a obrigação de, até 26 de abril, os restaurantes só poderem vender comida pelo serviço de distribuição (delivery).

O Governo decidiu ainda que os exames de faculdade e do 12º ano – que têm sido um motivo de preocupação de milhares de estudantes - serão adiados sem data marcada, não devendo ocorrer antes de junho, disse o primeiro-ministro.

Também os espetáculos e eventos desportivos que costumem concentrar grande número de pessoas ficam suspensos até nova ordem.

Além disso, a partir de 16 de abril, será obrigatório, nos espaços públicos da Polônia, usar uma máscara ou lenço para cobrir nariz e boca, anunciou o ministro da Saúde, Łukasz Szumowski.

Tal como o primeiro-ministro, o ministro da Saúde pediu à população que não faça grandes reuniões familiares na Páscoa.

O partido Direito e Justiça (PiS), no poder, manteve, no entanto, a data das eleições presidenciais, agendadas para 10 de maio, embora tenha decidido que a votação será obrigatoriamente feita por correspondência, ou seja,via correio, abrindo a possibilidade de a eleição durar uma semana, até 17 de maio.

Esta posição atraiu críticas ferozes da oposição, que a vê como uma tentativa de garantir a vitória do atual Presidente, Andrzej Duda, um membro do PiS, até porque a campanha dos seus rivais foi praticamente proibida, no âmbito das medidas de prevenção da pandemia.

A Polônia registou, até hoje, 5.205 casos de contaminação, com 159 mortes.

O novo coronavírus, responsável pela pandemia do covid-19, já infectou mais de 1,5 milhões de pessoas em todo o mundo, das quais morreram quase 89 mil.

Dos casos de contaminação, mais de 312 mil já foram considerados curados.

Até às 17h, da sexta-feira Santa, o Ministério da Saúde da Polônia informou sobre 213 novos casos de COVID-19.

No total, nas últimas 24 horas, os testes mostraram a presença de coronavírus em mais 380 pessoas. Os novos casos confirmados dizem respeito às seguintes voivodias: Mazóvia (77), Grande Polônia (Wielkopolska) (38), Łódź (31), Podláquia (16), Podcarpatos (15), Pequena Polônia (Małopolska) (10), Lubelska (10), Baixa Silésia (9), Opolska (4), Pomerânia (2) e Lubuska (1).

O Ministério também informou que seis pacientes morreram devido a contaminação. Ele é um homem de 87 anos de Poznań, uma mulher de 69 anos de Bydgoszcz, um homem de 75 anos de Wrocław, uma mulher de 71 anos de Bolesławiec e um homem de 73 anos de Cracóvia.

Fontes: AFP, Wort, Rzeczpospolita

sexta-feira, 3 de abril de 2020

Tokarczuk é criticada pela imprensa e internautas

O texto de Olga Tokarczuk, no qual a ganhadora do Prêmio Nobel compartilhou sua reflexão sobre a pandemia de coronavírus na Europa foi publicado na edição da terça-feira, dia 31 de março, do diário alemão "Frankfurter Allgemeine Zeitung". Na quarta-feira à noite, a escritora decidiu publicar a coluna do jornal inteira em idioma polaco porque começaram a aparecer citações de "fragmentos fora de contexto".

"Em conexão com a discussão em andamento em torno de minha coluna publicada no Frankfurter Allgemeine Zeitung e a controvérsia decorrente do fato de que trechos da coluna fora de contexto foram citados, decidi compartilhar todo o texto original em polaco", escreveu Tokarczuk no Facebook.

A mídia polaca se referiu ao texto de Tokarczuk no ""Frankfurter Allgemeine Zeitung" de terça-feira com severas críticas à escritora.

A Telewizja Republika em seu site avaliou que as palavras da escritora eram "surpreendentes", enquanto "Do Rzeczy" descreveu o texto como "inesperado".

"A escritora avaliou as ações da União Europeia em palavras surpreendentemente duras", disse o redator do "Do Rzeczy".

Por sua vez, o portal da o2 disse que Tokarczuk assumiu uma "posição surpreendente".

No site Polityce.pl a exclamação: "Inacreditável! Tokarczuk critica a UE no diário alemão".

O "Super Express" comentou que "Tokarczuk na imprensa alemã atinge a União".

Alguns internautas também expressaram sua indignação com as palavras da Prêmio Nobel.

Com a polêmica instalada, Olga resolveu publicar em sua página no Facebbok, a versão em polaco do artigo publicado em alemão, no jornal de Frankfurt.



TEXTO DE OLGA

Senhoras e senhores,

Em conexão com a discussão em andamento em torno de minha coluna publicada no "Frankfurter Allgemeine Zeitung" e a controvérsia decorrente do fato de serem citados seus trechos fora de contexto, decidi fornecer a você todo o texto original em polaco. Convido você a ler :)

JANELA

Da minha janela, vejo uma amoreira branca, uma árvore que me fascina e foi uma das razões pelas quais eu decidi morar aqui. A amoreira é uma planta generosa - alimenta dezenas de famílias de pássaros com seus frutos doces e saudáveis ​​durante a primavera e o verão. Agora, no entanto, a amoreira não tem folhas, então vejo um pedaço de uma rua tranquila, que raramente é atravessada por alguém caminhando em direção ao parque. O clima em Wrocław é quase verão, o sol está brilhando, o céu está azul e o ar está limpo. Hoje, enquanto passeava com o cachorro, vi duas urracas (pega-rabuda) perseguindo uma coruja em seu ninho. Nós olhamos nos olhos da coruja a uma distância de apenas um metro.

Tenho a impressão de que os animais também estão esperando o que vai acontecer.
Para mim, o mundo tem sido demais há muito tempo. Muito, muito rápido, muito alto.
Então, eu não tenho o "trauma da reclusão" e não sofro porque não conheço pessoas. Não me arrependo de fechar os cinemas, não me importo que os shoppings estejam fechados. Só me preocupo quando penso em todos aqueles que perderam o emprego. Quando descobri a quarentena preventiva, senti uma espécie de alívio e sei que muitas pessoas sentem a mesma coisa, embora tenham vergonha. Minha introversão, há muito estrangulada e abusada pelo ditado de extrovertidos hiperativos, afastou-se e saiu do armário.

Olho pela janela o meu vizinho, um advogado sobrecarregado que eu tinha visto recentemente quando ele estava saindo para o tribunal pela manhã com a toga pendurada no ombro. Agora, em um agasalho de briga folgado, ele está lutando contra um galho no quintal, ele parece estar limpando. Vejo alguns jovens passeando com um cachorro velho que mal anda desde o inverno passado. O cachorro treme de pé e acompanha pacientemente, andando devagar. O caminhão de lixo recebe lixo com muito barulho.

A vida continua e como, mas em um ritmo completamente diferente. Limpei o armário e levei os jornais lidos para o recipiente de papel. Replantei flores. Peguei a bicicleta para reparo. Eu gosto de cozinhar. As imagens da infância voltam persistentemente para mim, quando havia muito mais tempo e poderia ser "desperdiçado", olhando pela janela por horas, observando formigas, deitada debaixo da mesa e imaginando que essa era uma arca. Ou lendo enciclopédia.

Não é assim que retornamos ao ritmo normal da vida? Que o vírus não é um distúrbio da norma, mas exatamente o oposto - aquele mundo agitado antes que o vírus fosse anormal?

Afinal, o vírus nos lembrou o que negamos com tanta paixão - que somos criaturas frágeis, feitas da matéria mais delicada. Que estamos morrendo, que somos mortais.

Que não estamos separados do mundo por nossa "humanidade" e singularidade, mas que o mundo é uma espécie de grande rede na qual estamos presos, conectados com outras entidades invisíveis através de fios de dependência e influência. Que dependemos um do outro e não importa a que distância estejamos, que idioma falamos e qual a cor de nossa pele, adoecemos da mesma maneira, sentimos o mesmo medo e morremos da mesma maneira.

Ele nos fez perceber que, não importa quão fracos ou vulneráveis ​​nos sintamos, há pessoas ao nosso redor que são ainda mais fracas e precisam de ajuda. Ele nos lembrou o quão delicados nossos pais e avôs são e o quanto eles merecem nossos cuidados.

Ele nos mostrou que nossa agitada mobilidade ameaça o mundo. E ele lembrou a mesma pergunta que raramente tivemos coragem de nos perguntar: o que estamos realmente procurando?

Assim, o medo da doença nos afastou de um caminho em "loop" (cíclico) e necessariamente nos lembrou da existência de ninhos, de onde viemos e onde nos sentimos seguros. E mesmo quando éramos, não sei, como grandes viajantes, em uma situação como essa, sempre vamos para uma casa.

Assim, verdades tristes nos foram reveladas - que, no momento do perigo, o pensamento volta ao fechar e excluir categorias de nações e fronteiras. Nesse momento difícil, verificou-se quão fraca é a idéia da comunidade europeia na prática. A União desistiu adequadamente da disputa por desistência, passando decisões em tempos de crise para os Estados-nação. Considero fechar as fronteiras nacionais o maior fracasso deste tempo miserável - os antigos egoísmos e categorias de "nossos" e "estranhos" retornaram, e é com isso que lutamos nos últimos anos na esperança de que nunca mais formate nossas mentes. O medo do vírus evocava automaticamente a crença atávica mais simples de que eles eram culpados de estranhos e de que sempre traziam uma ameaça de algum lugar. Na Europa, o vírus está "em algum lugar", não é nosso, é estrangeiro. Na Polônia, todos os que retornam do exterior tornaram-se suspeitos.

A onda de fronteiras fechadas, filas monstruosas nos postos de fronteira provavelmente foram um choque para muitos jovens. O vírus lembra: existem fronteiras e estão indo bem.

Também tenho medo de que o vírus nos lembre rapidamente de outra velha verdade: quanto não somos iguais. Alguns de nós voam de avião particular para uma casa em uma ilha ou em um refúgio na floresta, enquanto outros ficam nas cidades para operar usinas de energia e estações de tratamento de água. Outros ainda arriscam sua saúde trabalhando em lojas e hospitais. Alguns ganharão da epidemia, outros perderão suas vidas. A crise que está por vir provavelmente minará os princípios que nos pareciam estáveis; muitos países não conseguem lidar com isso e, diante de sua decomposição, novas ordens são despertadas, como costuma acontecer após as crises. Sentamos em casa, lemos livros e assistimos séries de TV, mas, na verdade, estamos nos preparando para uma grande batalha por uma nova realidade que não podemos nem imaginar, entendendo lentamente que nada será o mesmo de antes. A situação de quarentena forçada e suborno da família em casa pode nos fazer perceber o que não gostaríamos de admitir: que a família está nos incomodando, que os laços matrimoniais há muito desapareceram. Nossos filhos colocarão em quarentena o vício da Internet e muitos de nós perceberão a falta de sentido e a esterilidade da situação em que se encontra a inércia e a mecânica. E se o número de assassinatos, suicídios e doenças mentais aumentar?

Diante de nossos olhos, o paradigma da civilização que nos moldou nos últimos duzentos anos está soprando como fumaça: que somos os mestres da criação, podemos fazer tudo e o mundo nos pertence. Novos tempos estão chegando.

Fonte: onet.pl e Facebook
Texto: Olga Tokarczuk
Tradução do polaco para português: Ulisses Iarochinski

segunda-feira, 16 de março de 2020

Crianças polacas vivendo como alemãs

Vítimas esquecidas: as crianças polacas raptadas pelos nazistas
Entre os numerosos crimes do nazismo está o sequestro de menores "racialmente valiosos" para serem germanizados à força. Com a infância destruída e a vida fragmentada, os sobreviventes não são reconhecidos como vítimas.

crianças polacas germanizadas - Foto: DW
Os genitores de Alodia Witaszek ainda estavam vivos quando ela foi levada embora. No outono de 1943, chegou com a irmã pequena ao "campo de cuidados juvenil" de Litzmannstadt, a cidade polaca de Łódź, onde ambas seriam "germanizadas", ficando proibidas de falar polaco.

As irmãs Witaszek foram apenas duas entre dezenas de milhares: o sequestro infantil organizado era parte da política de raças do nacional-socialismo, visando transformar em alemãs as crianças "racialmente superiores" das regiões anexadas no Oeste da Polônia.

Os juizados de menores registravam aqueles cuja aparência consideravam "ariana", representantes dos Departamentos de Saúde os submetiam a exames médicos, e os selecionados de "bom sangue" eram enviados a um lar para menores, onde tinham seus nomes germanizados e eram obrigados a aprender alemão.

Em seguida, a associação estatal Lebensborn, da milícia paramilitar SS, assumia a responsabilidade, entregando os mais jovens a famílias filiadas, e os maiores aos internatos denominados "deutsche Heimschulen" pelos nazistas. Privando as crianças de sua memória e sua identidade, elas eram "germanizadas".

O programa de sequestro infantil integrava os planos de reordenamento dos nazistas para a Europa ocupada. Em junho de 1941, o Reichsführer da SS Heinrich Himmler declarara a necessidade de arrebanhar as "crianças pequenas de raça especialmente boa das famílias polacas".

Contudo a política não foi aplicada só na Polônia: também em regiões ocupadas da União Soviética, Bielorrússia, Ucrânia e Eslovênia os filhos pequenos foram brutalmente subtraídos de suas famílias. Os filhos dos trabalhadores forçados eram afastados das mães, entregues a famílias alemãs ou maltratados nos internatos.

Na Reichsschule für Volksdeutsche (Escola do Reich para Alemães Étnicos) em Achern e no orfanato da Lebensborn de Steinhöring, ambos no sul da Alemanha, quem insistisse em falar a língua materna, em vez de alemão, era punido ficando sem refeições ou de castigo no porão.

Alodia Witaszek (esq.) ao lado memorial do antigo internato de menores em Łódź, Polônia
Mancha branca na história alemã
Passados 75 anos do fim da Segunda Guerra Mundial, o sequestro de crianças pelos nazistas praticamente não é abordado na Alemanha: trata-se de "uma mancha branca na historiografia", condena Artur Wróblewski, jurista polaco que escreve para o portal de internet Interia. E ele quer mudar isso, juntamente com seis outros jornalistas e historiadores.

O grupo foi atrás do destino de sobreviventes como Alodia, que sofreram no próprio corpo a destruição de sua infância e, muitas vezes, de toda a vida, pela megalomania racista dos nazistas.

O resultado das pesquisas foi lançado em livro na Polônia em 2018 e, em fevereiro de 2020, em alemão, pela editora Herder, sob o título Als wäre ich allein auf der Welt. Der nationalsozialistische Kinderraub in Polen (Como se eu estivesse sozinha no mundo. O sequestro nacional-socialista de crianças na Polônia).

Quase todas as testemunhas da época que lá tomam a palavra relatam sobre a repetida procura inútil por suas próprias famílias, sobre a, em geral dolorosa, repatriação após a guerra. E narram o trauma adicional de não serem reconhecidas como vítimas.

Aos 84 anos, Hermann "Romek" Lüdeking ainda luta pelo reconhecimento de seu destino de vítima
Jornalismo investigativo a serviço da justiça
A jornalista Monika Sieradzka, que trabalha para a mídia alemã e polaca, e sua colega Elisabeth Lehmann, da emissora MDR, foram um passo mais adiante no trabalho de investigação. Após anos de pesquisas, elas reuniram vítimas do sequestro estatal para contar diante de câmeras sobre suas vidas fragmentadas, no documentário Kinderraub der Nazis. Die vergessenen Opfer (Raptos infantis dos nazistas. As vítimas esquecidas), coproduzido pela Deutsche Welle.

Hermann Lüdeking é um dos protagonistas que nunca conseguiram reencontrar suas raízes, apesar de buscas incessantes. Aos seis anos de idade, ele foi colocado num internato, e mais tarde entregue à família Lüdeking, da SS, como "material valioso, do ponto de vista racial".

A única coisa que conseguiu descobrir, pesquisando tenazmente em arquivos e documentos, foi seu nome polaco original: Roman Roszatowski, apelidado "Romek". Crescido no Sul da Alemanha, onde ainda vive, há muito Lüdeking esqueceu o idioma materno.

A associação Geraubte Kinder – Vergessene Opfer (Crianças roubadas – vítimas esquecidas) o ajudou a investigar suas raízes. Os arquivos da Lebensborn foram destruídos após a Segunda Guerra, quando, durante os Processos de Nurembergue, a entidade foi classificada como benemerente. Os juizados de menores locais não dispunham de dados sobre as crianças raptadas.

Sozinho, aos 84 anos, Hermann Lüdeking ainda luta pelo reconhecimento, também moral, como vítima – até agora, em vão. "Os alemães não querem saber de nada disso, pois lhes custaria dinheiro", comenta, amargurado. "Até hoje, Hermann, aliás Romek, se sente um estranho em 'seu' país", constata Monika Sieradzka.

Texto: Sabine Peschel
Fonte: Radio Deutsche Welle

sexta-feira, 6 de março de 2020

Auschwitz: Livro com capa de pele humana

Um objeto histórico único, com certeza. Um álbum de fotos encadernado com uma capa feita de pele humana foi adicionado às coleções do Museu Estatal de Auschwitz, na cidade de Oświęcin, na Polônia. Pesquisas feitas por especialistas do Museu indicam que a capa pode ter sido confeccionado no Campo de Concentração Alemão, em Buchenwald, na Alemanha.

Foto: Marek Lach
As coleções do Museu já possuem outro objeto muito semelhante devido à técnica de execução. Graças a isso, testes comparativos com o uso da tecnologia FT-IR foram realizados. Com o espectrofotômetro disponível no Museum Conservation Studios, foi possível determinar a composição de ambas as capas.

"A análise comparativa mostrou o conteúdo da pele humana e quantidades muito semelhantes de poliamida 6 e poliamida 6.6. O conteúdo de polímeros utilizados para a produção de fibras sintéticas é importante porque foram inventados apenas em 1935. Essas informações nos permitem determinar o tempo de criação da capa. As poliamidas durante a Segunda Guerra Mundial foram uma novidade técnica e o acesso a elas foi limitado. No Reich, fibras artificiais foram usadas para fabricar pára-quedas", disse Elżbieta Cajzer, diretora das coleções do Museu de Auschwitz.

Resultado dos testes
Segundo relatos de prisioneiros do campo de concentração alemão em Buchenwald, a pele humana era tratada como material para a produção de objetos utilitários como encadernação de livros e carteiras de bolso.

Em seu relato, o ex-prisioneiro de Buchenwald, Karol Konieczny disse: "Coloquei tudo nas capas recebidas dos colegas da encadernação do campo. Obviamente, como você pode imaginar, as capas eram feitas de peles humanas, provenientes dos "recursos" da SS. Era sobre garantir documentos de bestialidade e genocídio nazistas".

Foto: Marek Kach
"Pesquisas indicam que, com uma probabilidade muito alta, podemos concluir que os dois coletores de pó, devido à tecnologia e composição, vieram da mesma oficina de encadernação. O uso da pele humana como material de produção está diretamente associado à pessoa Ilse Koch, que, juntamente com o marido, fez um histórico vergonhoso na história como carrasca do campo de Buchenwald", acrescentou Cajzer.

O campo alemão também é lembrado por ser onde Isle Koch, esposa do comandante Karl-Otto Koch realizava experiências artísticas. Ela é conhecida pelo estranho interesse em peles tatuadas, geralmente de homens, que eram assassinados para ela poder usar o tecido na produção de objetos de decoração e souvenirs.

A crueldade de Koch e o uso que fez de pele humana em livros, tampos de mesa, luminárias e dedos como botões nas luminárias, a mulher foi absolvida no tribunal de Nuremberg.

No álbum, que foi colocado novamente na sobrecapa, como evidenciado por dobras no papelão, cortes para caber na capa de papel, havia mais de 100 fotografias e cartões postais. As imagens mostram principalmente paisagens e panoramas.

Fotos sem nenhuma relação com os horrores nazistas
A partir de informações obtidas pelos funcionários do Museu, parece que o álbum e a capa pertenciam a uma família da Baviera que, durante a Segunda Guerra Mundial, administrava uma casa de hóspedes em uma cidade termal. Presumivelmente, a capa chegou às mãos dos proprietários como presente de um membro da da guarda nazista do campo de Buchenwald.

O item, que é indubitavelmente a evidência de um crime contra a humanidade, está agora na posse do museu, cortesia feita por um doador, o Sr. Paweł Krzaczkowski. Entramos em contato com ele graças à Fundação da Coleção Pine Family.

Fonte: Museu Estatal de Auschwitz
Tradução e adaptação para o português: Ulisses Iarochinski

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2020

Sete palavras inglesas que vieram do idioma polaco

Sete palavras do idioma inglês que você não sabia que vieram do idioma polaco. Aqui estão alguns exemplos que mostram que o trânsito nunca foi unidirecional, ou seja, o aparecimento na Polônia de termos ingleses no final do século XX e início do XXI, mas que também essas transferências linguísticas podem ser bastante complicadas.

Quer saber quais são elas? Algumas até chegaram ao português.

Foto: Piotr Baczewski

1. Gherkin

O termo americano "pickle" (no Brasil também), o Britânico "gherkin" e o polaco "ogórek kiszony", o que têm em comum liguisticamente?

O termo que os britânicos e leitores americanos chamam de "pickle", provavelmente foram emprestados de idiomas germânicos (compare-os com o alemão 'Gurke'), os quais certamente tomaram emprestada de um idioma eslavo. O idioma polaco por ser o mais próximo geograficamente, concretamente não é surpresa que o "ogórek kiszony", tradução polaca para pepino azedo, ou pepino em conserva, se encaixe na descrição do termo exportado além fronteira para o mundo anglo-saxão.

2. Mazurka

Os ritmos animados dessa popular dança folclórica polaca originária da Mazóvia foram imortalizados em todo o mundo pelo gênio da música de Fryderyk Chopin. No entanto, as chances são de que essa palavra tenha chegado ao inglês via russo, a palavra polaca original é na verdade mazurek. Considerando que Mazóvia está localizada na Polônia, não pode haver dúvida de que veio da Rússia a partir da Polônia.

3. Quark

Essa palavra do mundo da física - que denota o menor elemento que constitui nossa realidade física - parece a princípio pouco ter a ver com a Polônia. É certo que foi cunhada por James Joyce em Finnegans Wake, antes de ser reaproveitada pelo físico Murray Gell-Mann, que o considerava um nome adequado para a minúscula partícula necessária no modelo teórico em que ele estava trabalhando. Como se acredita, a palavra usada por Joyce estava ligada à palavra alemã "quark", que por sua vez é um antigo empréstimo da palavra polaca "twaróg"  (ou eslavo). A palavra polaca é traduzida para português como requeijão. Estranho? Também pensamos assim. Ainda assim, é emocionante encontrar um pedaço da Polônia lá fora, no universo frio de átomos anônimos.

4. Schlub

Uma maneira de entrar em outro idioma é a bordo de um outro. Esse contrabando foi praticado com sucesso pelos polacos quando utilizou o idioma ídiche para esse fim. O polaco (ou eslavo) está na verdade no cerne de muitas palavras em ídiche que fizeram parte do vocabulário americano-inglês, mais frequentemente aparecendo em gírias. Um exemplo é a palavra "schlub", que se refere a alguém desajeitado, estúpido ou pouco atraente. A palavra em iídiche supostamente remonta ao polaco "łób"(pronuncia-se úub)  que na verdade significa "manjedoura", por incrível que pareça.

5. Spruce

A palavra em inglês para essa árvore perene tem uma etimologia inexplicável. Embora sua conexão com a Prússia seja indiscutível (a Prússia era a área da qual a madeira serrada, assim como muitas outras mercadorias foram importadas para a Europa Ocidental pelos comerciantes hanseáticos), os estudiosos têm se esforçado bastante para dar conta das iniciais. Nossa hipótese, chame-a de etimologia popular, se você quiser, é de que a fonte possa ter sido a frase "z Prus" (da Prússia). Caso você esteja se perguntando, a palavra polaca para abeto vermelho é "świerk". E esta árvore estava no território polaco ocupado pelo Reino da Prússia até 1870 (depois deste ano pela República da Alemanha).

6. Vitamin

A palavra na forma de vitamina foi criada, em 1912, pelo bioquímico polaco Kazimierz Funk (e aí no sobrenome mais uma palavra que virou ritmo de rua nos Estados Unidos e nos Morros e quebradas cariocas). Funk foi um dos primeiros cientistas a formular o conceito das vitaminas, embora ele acreditasse erroneamente que fossem apenas aminas e, por isso, "vitais". Ainda assim, o nome polaco ficou universalmente conhecido e somos mais saudáveis por isso.

7. Vodca

Nunca saberemos qual a útima melhor fonte de vodka para o idioma inglês - muitos dizem que é do russo, enquanto outros (sim, nós, polacos) argumentam que a palavra (é "wódka", pronuncia-se vudca) e a bebida com certeza inabalável foram inventadas na Polônia. De qualquer forma, a palavra significa "pouca água" nos dois idiomas e, para o bem ou para o mal, desempenha um papel importante nas culturas culinárias e etílicas de ambas as nações - polaca e russa. Alguns tradutores para o português erroneamente traduzem como aguardente, mas não é, apenas pode ser pelo conceito alcóolico e nunca etimológico.

Fonte: Kultura.pl
Texto: Mikołaj Gliński,
Tradução e adaptação para o português: Ulisses Iarochinski

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2020

Governo da Polônia entrega o primeiro Cartão Polaco da América Latina

Casa da Polônia, em Varsóvia, Cartão Polaco para descendentes de emigrantes da América do Sul.

A Karta Polaka para os dois primeiros descendentes de polacos da América do Sul foi entregue, neste 11 de fevereiro de 2020, na Casa da Polônia (Dom Poloni), sede da Associação "Comunidade Polaca" (Wspólnota Polska), na ulica (rua) Krakowskie Przedmieście, em Varsóvia.

A entrega dos documentos foi feita pelo ministro Jan Dziedziczak - plenipotenciário do governo da Comunidade Polaca e pelo ministro Szymon Szynkowski vel Sęk. Os primeiros cidadãos a receber as Carteiras de Polacos foram Lourival Araújo Filho - diretor artístico do Wisła Música e Dança Folclórica do Paraná e presidente da Sociedade Polono Brasileira Marechal Piłsudski de Curitiba e o estudante Gabriel Kotecki, do município de Cruz Machado - PR.

Gabriel e Lourival recebendo os diplomas e as carteiras
Em nome do Sejm (Câmara de Deputados) da República da Polônia, estiveram presentes a vice-presidente do Sejm Małgorzata Gosiewska e a deputada Anna Schmidt Rodziewicz. Também o bispo Wiesław Lechowicz, delegado da KEP-Conferência Episcopal Polaca e presidente da Comissão da Comunidade dos Polacos no Exterior.

VOCÊ ESTÁ EM CASA
"Lembre-se e encaminhe esta mensagem: a Polônia está esperando por você, a Polônia está aberta para você. Convidamos você para vir a Polônia. Vocês são polacos, são descendentes daqueles que deixaram a Polônia e têm o direito de vir ao nosso país; isso também é dado a você através do Cartão Polaco, documento confirmando que pertences à nação polaca", disse nesta terça-feira, o ministro plenipotenciário do governo da diáspora polaca e polacos no exterior, Jan Dziedziczak, durante a cerimônia de apresentação do primeiro Cartão Polaco concedido a residentes da América Latina.

Segundo o Ministério das Relações Exteriores, a Polônia na América Latina tem mais de 2,5 milhões de pessoas (Corrigindo o ministério: são mais de 5 milhões de descendentes e polacos natos).

Jan Dziedziczak enfatizou que a cerimônia era "de natureza histórica". Segundo ele, "a Polônia também está abrindo, através deste ato legislativo, este documento para dois milhões de polacos do Brasil (corrigindo o ministro: são cerca de 4 milhões de brasileiros descendentes de imigrantes da Polônia). Obrigado - como Estado polaco - pelo que nossos polacos no Brasil fazem há mais de cem anos. Você preservou a polonidade e isso não é tão óbvio em muitos países".

"Apoiamos a comunidade polaca que vive na América Latina de várias maneiras. Esse apoio, por um lado, através de postos diplomáticos e consulares, também é apoiado por organizações não-governamentais, apoio fornecido pela Associação Comunidade Polaca, ou seja, muitos projetos culturais, muitos projetos educacionais que recebem financiamento do Ministério das Relações Exteriores, seja organizando cursos de língua polaca, ou liderando grupos folclóricos", disse o vice-ministro de Relações Exteriores, Szymon Szynkowski vel Sęk, durante a cerimônia em Varsóvia.

Sęk acrescentou que "aumentar os laços da polonidade com esses projetos, com esse apoio, também aumentou a expectativa de que a Carteira de Polaco esteja disponível para a diáspora polaca nos países da América do Sul". Segundo Szynkowski, também conhecido como Sęk, o chefe do KRPM - Gabinete do Primeiro-Ministro da República da Polônia, Michał Dworczyk percebeu esse interesse pela Karta Polaka em países onde ela não estava disponível.

"Ele conheceu esse interesse e foi um dos co-patrocinadores dessa iniciativa para abrir a possibilidade de emitir cartões polacos para pessoas que estarão ligados à polonidade em muitos países do mundo graças à emenda", disse o vice-chefe do Ministério de Relações Exteriores.

NA CASA DA COMUNIDADE POLACA
A cerimônia ocorreu na Casa Polônia por um motivo. A reunião foi organizada pelo presidente da "Associação Comunidade Polaca", Dariusz Piotr Bonisławski, que, percebendo as necessidades da comunidade polaca na América do Sul, como um dos propósitos das atividades da Associação e que há muito apóia manifestações nas áreas da educação, da cultura e também no último ano, com a realização do Congresso Mundial para a Juventude Polaca, em Curitiba.

O Congresso que foi realizado ano passado, pela primeira vez na América do Sul, teve a organização local do documentado Lourival Araújo Filho.

Lourival Araújo Filho faz sua manifestação de agradecimento
"Receber a Primeira Karta Polaka entregue  ao Brasil foi histórico e sei que significa muito, não só pra mim, mas também para pessoas que sonham em ter um documento oficial. Sei que muitos agora vão se interessar por este cartão que dá direito há alguns benefícios na Polônia", disse Araújo Filho.

Para o diretor e coreógrafo do mais antigo grupo folclórico polaco do mundo, o Wisła, e presidente da Sociedade Marechal Piłsudzki, de Curitiba, a felicidade é enorme. "Mas claro, o que mais importa é ter a clara noção de que ao tê-la passei a poder dizer que sou documentalmente polaco. Alguém pode dizer: - ah! Mas a Karta não vale como passaporte e cidadania - isso é verdade. Mas eu não tenho o menor interesse em morar em algum outro país da Europa. Absolutamente! Mas se eu quiser, venho morar na Polônia e a Karta Polaka me permite isso. E a cidadania? Calma, que um dia, se for pra ser, será!", disse ele.

Lourival é descendente de polacos pelo lado materno e já viveu e estudou na Polônia, onde fez o curso de idioma e cultura polaca da Universidade Iaguielônica de Cracóvia, curso de coreógrafos de danças folclóricas da Universidade de Lublin, e deu início ao doutorado de história (não concluído ainda), nos anos de 2003 a 2006. Ele é professor de história e já foi diretor do Instituto Paranaense de Educação além de diretor do núcleo regional de educação, em Curitiba, da Secretaria Estadual de Educação.

Lourival informou que fez a solicitação no Consulado Geral da Polônia em Curitiba, no segundo semestre de 2019, quando comprovou através de documentos que é o presidente da Sociedade Marechal Piłsudski, diretor-coreógrafo do Grupo Folclórico Wisła, que possui certificado do curso de idioma e cultura polaca da Universidade Iaguielônica de Cracóvia além de substancial relatório de realizações culturais em pról da Polônia.

Já Gabriel Kolecki é de Cruz Machado, Sul do Paraná, descendente dos imigrantes polacos que chegaram ao Pátio Velho, na maior colônia de imigrantes do Brasil, em 1911, junto com outros 5.500 indivíduos procedentes das regiões polacas invadidas e ocupadas pelo Reino da Rússia e Império Austríaco.

Gabriel atualmente é aluno-bolsista descendente de polacos, do Ministério da Educação da Polônia, e estuda na Universidade de Łódź. Em dezembro passado, de férias escolares no Brasil, Gabriel deu entrada no pedido da Karta, no Consulado Geral da Polônia, em Curitiba. Pouco mais de dois meses depois, ele é o segundo latino-americano a receber o documento.

CARTÃO DE POLACO
O cartão (ou carteira) do polaco confirma o pertencimento à nação polaca. Os candidatos ao cartão devem demonstrar sua relação com o idioma polaco - incluindo pelo menos conhecimento passivo da língua polaca, comprovar que um dos pais ou avós ou dois bisavós eram de nacionalidade (origem) polaca; ou apresentar um certificado de atividades de uma organização comunitária polaca em benefício da cultura e do idioma polaco.


Os portadores do Cartão que forem para a Polônia com a intenção de se estabelecer permanentemente receberão uma carteira de visto de residência permanente gratuitamente, receberão a cidadania polaca após um ano e, enquanto isso transcorre, poderão contar com ajuda durante o período de adaptação. Podendo ainda solicitar um benefício em dinheiro para cobrir os custos de desenvolvimento e manutenção contínua por até 9 meses, co-financiamento para alugar um apartamento e aprendizado intensivo de idioma polaco ou cursos profissionais.

CAMINHOS PARA APROVAÇÃO DA EMENDA
Até a a aprovação e sanção da emenda ano passado, o Cartão de Polaco era concedido apenas a pessoas de origem polaca que viviam em 15 países da Europa Oriental, formados ou renascidos após o colapso da URSS, que não reconhecem a dupla cidadania.

A emenda da lei do ano passado estendeu as atividades do Cartão de Polaco a todos os países do mundo e contou com o apoio decisivo da Associação Nacional dos Pequenos e Médios Empresários da Polônia, da Associação Nacional dos Empresários e Empregadores da Polônia, do ex-cônsul geral da Polônia, em Curitiba, e de um jornalista brasileiro-polaco (dupla cidadania).

LANÇAMENTO DA CAMPANHA "VAMOS TRAZER OS POLACOS DO BRASIL"
Lançamento da Campanha pela Karta Polaka, na sede da ZPP, em Varsóvia
Na foto, em fevereiro de 2019, na sede nacional da ZPP - Associação Nacional dos Empresários e Empregadores da Polônia, Cezary Kaźmierczak, presidente da ZPP, ex-deputado nacional e atual presidente Adam Abramowicz da ANMPE - Associação Nacional dos Médios e Pequenos Empresários da Polônia, o diretor Piotr Palutkiewicz da ZPP, um representante do Ministério da Relações Exteriores, o ex-cônsul geral da Polônia em Curitiba (e atual embaixador dos polacos no estrangeiro) Marek Makowski e o jornalista paranaense-polaco Ulisses Iarochinski no telão, via skype, direto de Curitiba.

A campanha chegou ao Congresso Nacional da Polônia e acabou sendo aprovada como emenda à Lei da Karta Polaka, existente desde 2007, que era apenas para polacos e descendentes de polacos dos antigos países da União Soviética, em 16 de maio de 2019. Em seguida foi à sanção presidencial pelo presidente da República da Polônia, Andrzej Duda, no dia 4 de junho de 2019.

A Lei com suas alterações foi publicada no Diário Oficial do governo da República da Polônia, o chamado de Dziennik Ustaw (ou Diário das Leis, ou Revista das Leis) no dia 13 de junho de 2019.

O chefe de gabinete do governo, Michał Dworczyk, disse que durante a tramitação parlamentar no Congresso, a Carta Polaca tinha sido originalmente preparada para ser concedida apenas para polacos que vivem além da fronteira oriental do país. "Mas em seguida, uma série de ministérios ficaram preocupados como essa lei. Temiam que sua abrangência iria afetar as finanças do Estado. Mas quero dizer que estas preocupações não existem mais."

Para maiores informações do processo e exigências para solicitação da Karta Polaka contactar os Consulados Gerais da Polônia.

Em Curitiba
- Av. Agostinho Leão Júnior 234, CEP: 80.030-110, Curitiba – PR
tel.: +55 41 3019-4662 (das 09:30 às 11:30) fax: +55 41 3019 7909
e-mail: curitiba@msz.gov.pl
Horário de atendimento: de segunda-feira à sexta-feira das 9:00 às 12:00.
Para solicitar o atendimento é necessário preencher o formulário de pedido através do site
www.e-konsulat.gov.pl.
Atendimento presencial somente com horário previamente agendado.
A competência territorial do Consulado Geral abrange os seguintes Estados: Alagoas, Bahia, Espírito Santo, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Minas Gerais, Paraná, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, São Paulo, Santa Catarina, Sergipe.

Em Brasília
- Av. das Nações Qd. 809, Lote 33, CEP: 70423-900, Brasília – DF
tel.: +55 61 3212 8000 (das 08:30 às 16:30) fax: + 55 61 3242 8543
e-mail: brasilia.consular@msz.gov.pl
Horário de atendimento: de segunda-feira à quinta-feira das 9:30 às 12:30.
Para solicitar o atendimento é necessário preencher o formulário de pedido através do site
www.e-konsulat.gov.pl.
Atendimento presencial somente com horário previamente agendado.
A competência territorial da Embaixada abrange os seguintes Estados: Acre, Amapá, Amazonas, Ceará, Distrito Federal, Goiás, Maranhão, Pará, Paraíba, Piauí, Rio Grande do Norte, Rondônia, Roraima, Tocantins.


Fontes: Stowarzyszenia "Wspólnota Polska", ZPP, ANMPE, Sejm e imprensa polaca
Tradução e reportagem: Ulisses Iarochinski

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2020

Ministro Polaco se encontra com Presidente Brasileiro

O chanceler polaco no Palácio do Planalto - Foto: Divulgação
O chanceler Jacek Krzysztof Czaputowicz (pronuncia-se iátséq Kjichtóf Tchaputóvitch) esteve no Palácio do Planalto, nesta terça-feira, para encontro com o Presidente do Brasil e o ministro brasileiro das relações exteriores.

Depois, o brasileiro anunciou que deve visitar a Polônia, ainda no primeiro semestre de 2020.

O presidente vai aproveitar para visitar a Hungria, país vizinho da Polônia. Os dois países, junto com a Itália, viraram expoentes de governos de extrema-direita na Europa.

O ministro polaco está em Brasília, desde ontem dia 4 até o 6 de fevereiro, para a reunião do Grupo de Trabalho sobre Questões Humanitárias e de Refugiados, criado por ocasião da Conferência de Varsóvia, em fevereiro de 2019, para Promover um Futuro de Paz e Segurança no Oriente Médio, de onde veio a denominação para estas reuniões: “Processo de Varsóvia”.

A sessão de abertura do Grupo de Trabalho, contou com as presenças do Ministro de Estado das Relações Exteriores, Embaixador Ernesto Araújo, do Ministro das Relações Exteriores da Polônia, Jacek K. Czaputowicz, e do Secretário de Estado Assistente Adjunto para Populações, Refugiados e Migração dos Estados Unidos da América, Richard Albright.

Hoje e amanhã serão realizados painéis temáticos, com foco na proteção e no acesso à educação para crianças em contextos de crises humanitárias e deslocamentos forçados no Oriente Médio. Os painéis contarão com a presença de representantes de países da região e de organismos internacionais, bem como de especialistas e entidades da sociedade civil com reconhecida experiência na matéria.

Ao final do evento, será divulgado comunicado com resumo das discussões, aberto à adesão dos países participantes.

O Ministro
Jacek Krzysztof Czaputowicz nasceu em 30 de maio de 1956, em Varsóvia. Ele é cientista político, professor universitário de ciências sociais e afiliado ao PiS - Partido Direito e Justiça.
Foi um ativista da oposição durante a República Popular da Polônia, sendo um dos fundadores da Associação dos Estudantes Independentes e do Movimento de Liberdade e Paz.

Nos anos de 2008 a 2012, foi diretor da Escola Nacional de Administração Pública e nos anos de 2017 a 2018, exerceu o cargo de subsecretário de Estado do Ministério das Relações Exteriores. A partir de 2018, assumiu o posto de Ministro chefe de Estado do Ministério das Relações Exteriores da Polônia, que mantém até hoje.

Ainda em 1997, baseando-se no sistema de segurança europeu defendeu tese a tese "Após o fim da Guerra Fria", obteve o grau de doutor em ciências humanas e ciências políticas no Instituto de Estudos Políticos da Academia Polaca de Ciências.

Com base na dissertação "Teorias das relações internacionais", fez em 2008, um pós- doutorado em humanidades na Faculdade de Jornalismo e Ciências Políticas da Universidade de Varsóvia. Em 20 de outubro de 2016, ele recebeu o título de professor de ciências sociais. (No sistema educacional polaco, professor é um título concedido pelo Presidente da República, e não uma função ou cargo educacional, para esta função a palavra é "wykładowca", ou como em inglês: "Lecturer").

A ex-cônsul geral da Polônia em Curitiba, Dorota Barys, faz parte da comitiva polaca que está em Brasília na reunião do Grupo de Trabalho sobre Questões Humanitárias e de Refugiados.

Fontes: Itamaraty e Mistério das Relações Exteriores da Polônia

sexta-feira, 24 de janeiro de 2020

A arquitetura dos memoriais do Holocausto na Polônia

Criar memoriais em espaços onde a humanidade testemunhou tragédias dolorosas requer grande sensibilidade e capacidade de desvendar as verdades da história. Arquitetos e artistas polacos possuem essas qualidades, e a prova está nos monumentos dedicados aos campos de concentração e extermínio alemães instalados na Polônia ocupada.

Ulisses Iarochinski visitando o Memorial de Majdanek em Lublin


UM CAMINHO PRETO AUSTERO
O uso de memoriais arquitetônicos e esculturais na Polônia floresceu pela primeira vez em 1958, quando um júri liderado por Henry Moore anunciou um concurso internacional para um memorial às vítimas do fascismo em Auschwitz.

Das 426 propostas, três finalistas foram escolhidos - dentre eles, o projeto de maior pontuação foi desenhado por Oskar Hansen (com uma equipe composta por Jerzy Jarnuszkiewicz, Zofia Hansen, Julian Pałka, Edmund Kupiecki, Lechosław Rosiński e Tadeusz Plasota).

Durante as deliberações do júri, Henry Moore supostamente disse que o cataclismo que ocorreu em Auschwitz era impossível de retratar em uma escultura - a menos que seu criador fosse Michelangelo ou Auguste Rodin.

Por esse motivo, o júri selecionou um projeto abstrato, que utilizava o espaço do campo de concentração, operando com simbolismo e atmosfera, em vez de representações literais. A equipe de Hansen percorreu a extensão do campo em um caminho inclinado - cruzando-o simbolicamente. Os visitantes do acampamento deveriam caminhar pelo terreno no austero caminho na cor preta, que às vezes era engolido por plantas. Esse gesto simbólico contaria uma história maior do que uma escultura clássica ou um registro escrito de eventos da guerra.

Jerzy Jarnuszkiewicz explicou: "Dessa forma, transformamos o espectador, uma pessoa que visita o acampamento, em uma parte do memorial, enquanto nosso papel é o de uma escolta, ou talvez diretor, que mapeia um guia, enfatizando os elementos mais importantes desse espetáculo dramático".

A visão da equipe de Hansen foi inovadora e surpreendente, rompendo as expectativas tradicionais de um memorial.
Museu Birkenau, foto: Oscar Gonzalez / NurPhoto via Getty Images
Embora o projeto nunca tenha sido realizado, ele influenciou futuras obras esculturais. Ele mostrou que a tragédia não precisa ser retratada literalmente, destacando a força que vem da paisagem e do ambiente quando é complementada por elementos simbólicos, e não "exagerada".

PRESERVANDO A MEMÓRIA



CONCRETO NA FLORESTA
Em 1964, um novo memorial foi criado no terreno do antigo campo de extermínio de Treblinka. Seus criadores - os escultores Franciszek Duszeńko e Franciszek Strynkiewicz, bem como o arquiteto Adam Haupt - tiveram que adaptar o terreno novamente, pois o exército nazista alemão em retirada destruiu todos os edifícios do campo. O projeto foi escolhido em um concurso.

Franciszek Strynkiewicz falou de seu trabalho: "Sabíamos que este memorial não poderia ser uma escultura convencional. Tinha que invocar drama, recriar a sensação de tristeza e perigo."

Memorial às Vítimas do Campo de Extermínio de Treblinka, foto: Andrzej Sidor / Forum Memorial
Nos 17 hectares de terreno, os criadores construíram uma necrópole simbólica com trilhos de trem, recriados com blocos de concreto, caminhos dispostos com pedras perfiladas e um cemitério simbólico de pedregulhos - com nomes de países e cidades de onde as pessoas foram deportadas. O campo de extermínio (uma dessas rochas lembra o Janusz Korczak assassinado).

O espaço onde ficava o crematório agora é uma cova cheia de basalto derretido, enquanto o espaço de 22.000 metros quadrados onde as vítimas foram enterradas foi coberto com uma laje de concreto plana gigante, cercada por 17.000 pedras afiadas e angulares que parecem terem sido quebradas.

O campo de extermínio, escondido dentro da floresta - não contém mais edifícios ou infraestrutura - proporciona uma impressão poderosa, criando uma sensação de perigo, os restos de dor e morte. As pedras abstratas, os gestos simbólicos, os caminhos deliberadamente traçados, não deixam dúvidas quanto à escala da tragédia testemunhada aqui.

AS PEDRAS VÃO GRITAR
Restam poucos sinais do campo de concentração de Stutthof, construído perto da cidade de Sztutowo e libertado em maio de 1945. Após a guerra, decidiu-se que alguns dos edifícios seriam reconstruídos: em alguns dos quartéis, uma exibição foi montada. E os portões, torres de vigia e crematório foram abertos ao público. No início da década de 1960, o arquiteto e escultor Wiktor Tołkin (prisioneiro de Auschwitz) projetou um monumento para o espaço restante. Foi revelado em 1968, no aniversário da libertação do campo.

Monumento à luta e ao martírio em Stutthof, foto: Michał Kos / Agencja Wschód / Reporter / East News
Em uma grande praça elevada, Tołkin colocou duas pedras grandes. A pedra colocada verticalmente com 11 metros de altura e sua superfície é coberta com esculturas grosseiras, que simbolizam a luta dos prisioneiros pela sobrevivência. A pedra colocada horizontalmente fica em uma coluna estreita - tem quase 30 metros de comprimento e 3,5 metros de altura. Dentro da pedra há uma coleção de cinzas de prisioneiros assassinados - elas podem ser vistas através do vidro na parte de trás da escultura. A frente da escultura é coberta por um baixo-relevo com formas dinâmicas, mas abstratas, nas quais você pode notar uma pitada de silhuetas humanas. O escultor quis lembrar o sofrimento dos prisioneiros de Stuthoff. No meio dessas formas abstratas, Tołkin incluiu uma citação do poema de Franciszek Fenikowski:

Deixe nossa voz chamar disso para outra geração
Para a memória, nossas sombras imploram, não retaliação!
Nosso destino é o seu aviso - não uma lenda ou sonho.
Se o homem ficar em silêncio, as próprias pedras vão gritar!

RELICÁRIO MONUMENTAL
Wiktor Tołkin é o criador de outro memorial - o Monumento à Luta e ao Martírio no campo de concentração de Majdanek, em Lublin.

Em termos de metros cúbicos, é um dos maiores memoriais da Polônia. Em 1967, um concurso para o memorial foi anunciado; dos 140 projetos propostos, o júri selecionou o projeto de Stanisław Strzyżyński e Juliusz Kłeczka. No entanto, foram os vencedores do terceiro lugar, Wiktor Tołkin e Janusz Dembka, cujo projeto foi finalmente construído. Eles projetaram um memorial enorme, no qual os elementos esculturais apontam para locais cruciais na extensa paisagem.

Monumento à luta e ao martírio em Majdanek (Lublin), foto: Slawomir Olzacki / Forum
Na entrada do antigo campo de concentração e extermínio, eles colocaram uma escultura poderosa e abstrata - um portão simbólico. A pedra esmagadora - inspirada nas famosas palavras de Dante, que aqueles que entram aqui abandonam toda a esperança - concede acesso por uma passagem estreita afundada na terra que continua por 1300 metros em terreno plano. No final do caminho, onde ficava o crematório, os criadores colocaram um grande mausoléu abobadado. Ele fornece cobertura para o local onde as cinzas das vítimas foram empilhadas. Wiktor Tołkin se referiu a ele como um 'relicário' inspirado no Panteão Romano.

Vista do portão, foto: Wojciech Pacewicz / PAP
Mausoléu com um fragmento da Estrada da Memória e Homenagem. A placa diz "Nosso destino é seu aviso".

Ao redor da cúpula há um friso de baixo-relevo, estilisticamente semelhante ao baixo-relevo em Sztutowo, com a inscrição assombrosa "Nosso destino é seu aviso". As esculturas de rochas pesadas de Tołkin são destinadas a intimidar, criando desconforto e medo. Todo o design, com seu longo caminho no meio, visa invocar sentimentos de desconforto, cansaço e opressão. Dessa forma, os criadores do memorial queriam manter viva a memória do local.

Ao longo do caminho, foram reconstruídos edifícios dos campos de concentração - torres de vigia, cercas, quartéis. Uma exposição sobre a história do campo está instalada neste último.

CINCO NACIONALIDADES
Um monumento não precisa ser enorme para recordar adequadamente um local de tragédia. Mais importante é a sua localização. Em 1960, o arquiteto nascido em Cracóvia, Witold Cęckiewicz, criou uma escultura para comemorar aqueles que perderam a vida no campo de concentração de Płaszów, nos arredores de Cracóvia. Em um espaço elevado onde assassinatos eram realizados, que anteriormente era uma arandela austríaca, o arquiteto colocou uma escultura de nove metros de altura.

Monumento às vítimas do fascismo em Cracóvia, foto: Mateusz Skwarczek / AG
A pedra calcária foi esculpida em uma composição cubista, as formas parecendo formas humanas. A escultura geométrica, mais ou menos talhada, mostra cinco figuras, destinadas a simbolizar as cinco nacionalidades das vítimas aqui. As cabeças inclinadas são carregadas com uma cornija maciça.

O Monumento às Vítimas do Fascismo, como é conhecido, eleva-se sobre a área, visível de longe. Localizado perto da estrada para Cracóvia, agora está cercado por supermercados, armazéns e uma expansão suburbana caótica. No entanto, cria um efeito ainda mais perturbador com esse pano de fundo.

UM MEMORIAL CONTEMPORÂNEO
A maioria dos memoriais dos campos de concentração foi criada na década de 1960, período comunista da história da Polônia. Mas sua influência ainda é sentida pelos criadores contemporâneos. Em 1963, no terreno do campo de extermínio de Bełżec, uma escultura modesta foi colocada, enquanto o próprio museu abriu somente 40 anos depois - um local de memória na forma de um memorial em expansão. Os escultores Andrzej Sołyga, Marcin Roszczyk e Zdzisław Pidek, em colaboração com a empresa de arquitetura DDJM, criaram o design vencedor do concurso de 1997. Assim como projetos anteriores desse tipo, os criadores, combinando escultura e arquitetura, projetaram algo que impactou toda a paisagem.

Museu e Memorial de Bełżec, foto: Renata e Marek Kosinscy / Forum
O museu é acessível através de uma passagem estreita, cercada por vergalhões enferrujados e pedras esmagadas; os criadores colocaram um grande sinal de concreto no caminho estreiro, contendo os nomes das primeiras vítimas e uma citação do Livro de Jó: "Oh, terra, não cubra meu sangue e não deixe que o meu choro seja um lugar de descanso".

Este túmulo simbólico - o local de descanso para quase meio milhão de vítimas - estava coberto por uma camada escura de escória. Essa terra estéril continha alguns carvalhos que vinham crescendo desde a Segunda Guerra Mundial - silenciosas testemunhas do passado. Outro elemento importante são os trilhos laterais simbólicos, integrados nas paredes do memorial, bem como no exterior austero, plano e sem janelas do museu.

Fonte: Agnieszka Gębczyńska-Janowicz, Polskie założenia pomnikowe. Rola Architektury com Tworzeniu Miejsc Pamięci od Połowy XX Wieku, Neriton Publishing, 2010.
Texto: Anna Cymer
Anna é uma historiadora da arquitetura. Formada na Universidade de Varsóvia em história da arte e graduada pelo Studium Fotografii ZPAF. Em 2017, foi laureada com o prêmio de jornalismo da Izby Architektów RP. Ela é autora de Architektura w Polsce 1945-1989, um livro sobre arquitetura da era comunista.
Tradução e adaptação: Ulisses Iarochinski

segunda-feira, 20 de janeiro de 2020

Arqueólogos polacos descobrem túmulos de dinamarqueses

Fotos: J. Szmit/Z. Ratajczyk
 Guerreiros dinamarqueses enterrados em túmulos no Norte da Polônia. Arqueólogos polacos ficaram surpresos ao descobrir restos de quatro guerreiros escandinavos a mais de 700 quilômetros de sua terra natal.

Os restos do século 11 foram descobertos em um local peculiar, denominado pelos arqueólogos polacos de uma "Casa da Morte". 

Análise química e genética dos restos mortais permitiram descobrir que os quatro homens eram da Escandinávia, muito provavelmente da Dinamarca.

Segundo o Dr. Sławomir Wadyl, do Museu Arqueológico de Gdańsk, os guerreiros foram enterrados ao lado de uma infinidade de objetos e armamentos.

O arqueólogo disse à Agência de Imprensa Polaca (PAP): “Na parte central do cemitério, havia quatro túmulos com vários objetos.

"Homens, provavelmente guerreiros, foram enterrados neles, como evidenciado pelas armas e equipamentos equestres colocados juntos."

Os quatro guerreiros foram desenterrados na vila de Ciepłe, na Pomerânia Oriental (Pomorze Wschodnie), norte da Polônia.

Os guerreiros dinamarqueses teriam sido enterrados durante a dinastia Piast - a primeira dinastia polaca a governar do século 10 ao final do século 14.

O Dr. Wadyl informou que, "Aconteceu que todos os mortos enterrados na parte central do cemitério não eram do Reino Piast, mas sim da Escandinávia, provavelmente da Dinamarca".

Os guerreiros foram enterrados em uma necrópole maior, que remonta ao rei polaco Bolesław Chrobry (Boleslau, o Bravo).

Foto: K. Patalon
Ao lado deles, os arqueólogos descobriram um tesouro de armas, como espadas e lanças decorativas. As evidências sugerem que os quatro homens eram cavaleiros habilidosos, devido às fivelas, estribos e esporões encontrados ao lado de seus corpos. Havia também moedas antigas, objetos de metal, pentes, panelas e até restos de animais.

O local do enterro em si é interessante, porque é mais típico da Europa Oriental que da Escandinávia. Os guerreiros foram depositados em caixas de madeira medindo cerca de 13,5 m por 2 metros. Foram construídas como uma cabana de madeira, com tábuas e toras de madeira empilhadas umas sobre as outras.

Foto: PAP
"Era um dos métodos mais populares de construção de casas na época, então você poderia dizer que eles eram uma 'casa da morte", disse Wadyl. Em outra parte do cemitério, os arqueólogos encontraram outro modo de enterro, diferente, mas igualmente intrigante. Os arqueólogos desenterraram dois grandes caixões repousados ​​dentro de uma casa construída a partir de vigas verticais afiadas. "Estes são os maiores baús do gênero que conhecemos nos territórios da Polônia no momento", explicou Wadyl. Os locais do enterro provavelmente estavam cercados por alguma forma de paliçada de madeira.

Foto: PAP
O Dr. Wadyl acredita que os guerreiros dinamarqueses provavelmente faziam parte da elite local devido a seus enterros elaborados e ornamentados. Ele disse: “Os enterrados na parte central do raio de cimento representavam a elite social da época, como evidenciado pelo caráter monumental de seus túmulos e ricos móveis, mas seu papel provavelmente não se limitava à função típica de guerreiros."


O arqueólogo também acha que os homens coletavam impostos da população local devido a um conjunto de pesos encontrados ao lado de dois dos mortos. Esses não são os primeiros cemitérios misteriosos descobertos por arqueólogos na Polônia. Pesquisadores da região de Kuyavia-Pomerânica descobriram estruturas semelhantes a pirâmides anteriores às famosas pirâmides egípcias.


Ciepłe é uma vila no distrito administrativo de Gniew, da cidade de Tczew, na voivodia da Pomerânia, no norte da Polônia. Fica aproximadamente a 3 km ao norte de Gniew, 29 km ao sul de Tczew e 59 km ao sul da capital regional Gdańsk. A vila tem uma população de 339 pessoas.

Fonte: Express, Londres
Texto: Sebastian Kettley
Tradução e adaptação: Ulisses Iarochinski