quinta-feira, 11 de março de 2021

Polônia e Bielorrúsia expulsam cônsules de ambos países


A Bielorrúsia anunciou nesta terça-feira (9) a expulsão de um cônsul polaco e protestou "fortemente" por sua participação em uma manifestação que homenageou os soldados polacos que na Segunda Guerra Mundial lutaram contra a ocupação alemã e soviética.

"Transformar criminosos de guerra em heróis é totalmente inaceitável", declarou a diplomacia bielorrussa em um comunicado.

O texto, explica sua decisão de expulsar o cônsul polaco em Brest (sudoeste), Jerzy Timofejuk.

Na Polônia, o Dia dos "Soldados Amaldiçoados" é comemorado todo dia 1º de março desde 2011.

De acordo com o comunicado da diplomacia bielorrussa, uma manifestação "informal" dedicada a este dia e organizada por organizações relacionadas com a Polônia aconteceu em Brest, uma cidade situada na fronteira com a Polônia, no dia 28 de fevereiro com a participação de Timofejuk.

Na terça-feira, o encarregado de relações exteriores polaco, no país, foi convocado ao Ministério das Relações Exteriores, que "protestou fortemente" contra a participação de Timofejuk nesta reunião.

"No nosso país, o incitamento ao ódio racial, nacional, religioso (...) e a reabilitação do nazismo é um crime", ressalta o comunicado.

Segundo o lado bielorrusso, ao participar neste evento, o cônsul polaco violou gravemente o direito internacional, em particular a Convenção de Viena sobre Relações Consulares.

A Polônia foi presenteada com uma nota em que o cônsul Jerzy Timofejuk foi convidado a deixar o território da Bielorrússia.

O Batalhão dos Soldados Amaldiçoados atuaram de 1944 a 1956

Anteriormente, o Ministério das Relações Exteriores da Bielorrússia condenou repetidamente as marchas para homenagear os soldados amaldiçoados organizados em Hajnówka. O lado bielorrusso menciona nesta ocasião a figura de Romuald Rays "Bury".

De acordo com o Ministério das Relações Exteriores da Bielorrússia, 75 anos atrás, os "soldados amaldiçoados" liderados por Rajs invadiram vilas habitadas por bielorrussos e lituanos. Centenas de pessoas foram mortas ou mutiladas e várias aldeias foram incendiadas e seus habitantes queimados, disse o ministério.

RESPOSTA POLACA

Consulado Bielorruso em Varsóvia

O governo polaco, um dia depois, anunciou na quarta-feira (10) a expulsão de um diplomata bielorrusso, em retaliação a uma medida semelhante anunciada no dia anterior por Minsk, após uma homenagem a uma unidade polaca da Segunda Guerra Mundial.

A Bielorrússia tinha, no dia anterior, considerado o cônsul polaco, em Brest, "persona non grata" por participar de homenagem aos "soldados amaldiçoados" polacos que lutaram contra a ocupação alemã e soviética.

"Em reação às medidas hostis e infundadas das autoridades bielorrussas, a Polônia reconheceu como persona non grata, um diplomata da embaixada do país vizinho, em Varsóvia"
, tuitou o vice-ministro das Relações Exteriores da Polônia, Marcin Przydacz, sem maiores detalhes.

Os "soldados amaldiçoados", batalhões de resistência formados para lutar contra os ocupantes alemães na Segunda Guerra Mundial, também lutaram contra a ocupação soviética. Os "soldados amaldiçoados" ou "soldados condenados" (Żołnierze Wyklęci) é o nome dado a membros de organizações clandestinas anti-soviéticas e anticomunistas formadas na Polônia no final da Segunda Guerra Mundial.

Eles continuaram suas operações durante a década de 1950 e, notadamente, cometeram crimes contra civis. Uma de suas principais figuras foi Romuald Rajs, um criminoso de guerra responsável por assassinato em massa por motivos de nacionalidade e religião. 

Romuald Rajs

Se lutar contra duas ditaduras é ser terrorista, então o significado de herói não existe. O governo bielorrusso perdeu uma grande oportunidade de ficar de boca fechada.

  Fontes: TVP e  AFP - Agência France Press

segunda-feira, 8 de março de 2021

Igreja Católica diminui na Polônia

Santuário de Jasna Góra (Montes Claros) na cidade de Częstochowa, na Polônia

A Agência Católica de Informação - KAI forneceu os dados de 2021 sobre a situação da Igreja na Polônia. Também traz dados sobre os efeitos da pandemia de Covid-19 e as iniciativas do mundo católico.

A Agência Católica de Informação polaca (KAI) divulgou na sexta-feira, 5/03, o “Relatório 2021 sobre a situação da Igreja na Polônia”.

Segundo o relatório, diminuíram os jovens que atuam na Igreja local. Em cerca de 30 anos, sua participação caiu para a metade. No país, os jovens praticantes são cerca de 30%, os menos praticantes são pouco mais de 20% e os não praticantes 18,5%. Por outro lado, mais de 50% dos estudantes acham que a Igreja não tem autoridade.

Na Polônia, segundo o relatório da KAI, os que se consideram católicos representam 90% da população, enquanto quase 10% são ortodoxos e os restantes dizem não pertencer a nenhuma religião.

Em 2019, 32.461.000 fiéis informaram pertencer à Igreja Católica, distribuídos em mais de 10 mil paróquias: uma taxa de religiosidade entre as mais altas da Europa, pois quase 37% dos católicos vão à Missa aos domingos. No entanto, diminui o número dos que aceitam os ensinamentos da Igreja sobre questões morais, sobretudo no âmbito da ética sexual.

A pandemia Covid-19, segundo um comunicado do setor de Comunicações Estrangeiras da Conferência Episcopal da Polônia, contribuiu para uma diminuição das práticas religiosas comunitárias e os contatos com a paróquia; mas, levou a aumentar os vínculos familiares e religiosos, a busca do transcendente e de respostas para as necessidades espirituais.

Quanto às estruturas da Igreja Católica, na Polônia existem 1050 Santuários, dos quais 793 marianos: o mais importante continua sendo o de Jasna Góra (Montes Claros), que registrou mais de 4 milhões de peregrinos em 2019; o Santuário da Divina Misericórdia, ligado às aparições de Jesus a Santa Faustina Kowalska, registra anualmente cerca de 2 milhões de peregrinos, provenientes de 90 países.

Quanto ao clero, no país os cardeais são 2, os arcebispos 29, os bispos 123, dos quais 4 de rito bizantino-ucraniano, os sacerdotes 33.600, dos quais 24.700 diocesanos e 8.900 religiosos, e cerca de 1.200 os consagrados de 59 Congregações, inclusive os Institutos de Vida contemplativa.

Por outro lado, mais de 2,5 milhões de fiéis leigos prestam serviço em paróquias ou comunidades eclesiais. Em 2020, os seminaristas eram 2.556 e 55%, por ano, os que deixaram o sacerdócio. No âmbito ecumênico, a Igreja católica local conta com órgãos intereclesiais e comissões bilaterais de diálogo com as Igrejas Ortodoxa, Luterana e Adventista.

A Conferência Episcopal Polaca adotou diretrizes e aplicou as normas do “Motu Proprio” do Papa Francisco, para a defesa dos abusos contra menores. Em 2019, a Conferência Episcopal nomeou um delegado para a defesa de menores e instituiu uma Fundação para a proteção dos menores e prevenção das vítimas de abusos.

Na Polônia, a Igreja conta com órgãos, como a Caritas diocesana, Associações e organizações; oferece educação católica em escolas e universidades, inclusive de Teologia, nas principais cidades. Ainda no campo cultural, a Igreja local mantém, aproximadamente, 13 mil igrejas e cerca de 100 museus diocesanos, religiosos e paroquiais.

No que se refere à mídia católica, o setor que mais cresce é o dos portais católicos na Internet. Mas, um papel importante, em nível nacional, é desempenhado pela Agência Católica de Informação (KAI), da Conferência Episcopal da Polônia, e pela Fundação Opoka, portal a serviço da Igreja Católica para a criação de sistemas de intercâmbio de informação.

Fonte: Vatican News Service - TC

sábado, 13 de fevereiro de 2021

Arcebispos salvaram polacos-judeus no Holocausto

Nas últimas semanas a Polônia viveu sob os holofotes do julgamento de dois historiadores num Tribunal de Justiça de Varsóvia. A questão é polêmica. Com quem está a verdade? Com as autoridades executivas, judiciais ou acadêmicas? As controvérsias são inúmeras.

Um artigo, escrito por Paweł Rytel-Andrianik das Universidades de Oxford e da Pontifícia Universidade da Santa Cruz de Roma e publicado preliminarmente em idioma polaco na revista "wSieci Historii", nas páginas 21 e 23 da edição de abril de 2014, e baseado em artigos, dissertacões e teses de KLICH, A .“Teodor Kubina: Czerwony biskup od Żydów,” passim (O Bispo Vermelho dos Judeus", passim); M. Paul, Wartime Rescue of Jews by the Polish Catholic Clergy (Resgate de Judeus em Tempo de Guerra pelo Clero Católico Polaco), p. 155; STOPNIAK, F. Katolickie duchowieństwo w Polsce i Żydzi w okresie niemieckiej okupacji (clero católico na Polônia e judeus durante a ocupação alemã), p. 25; WALTER, J. Dzieło miłosierdzia chrześcijańskiego (Trabalho de misericórdia cristã), p. 14; e RYTEL-ANDRIANIK, P.“Księża dla Żydów – wyniki badań (Padres para judeus - resultados de pesquisa),” p.27, demonstra que aqueles polacos católicos que ajudaram seus compatriotas de origem judaica foram muito mais expressivos e em maior número que aqueles que vencidos pelo medo da tortura, da morte e do extermínio colaboraram não só com os alemães, mas também com os russos e rutenos (ucranianos) do Exército Vermelho de Józef Stalin.

Este é o artigo de Paweł Rytel-Andrianik:

BISPOS SALVAM O POVO JUDEU NA POLÔNIA

Onze bispos diocesanos, que permaneceram em suas dioceses na Polônia, durante o Holocausto,  ajudaram os polacos de origem judaica. Isto é fato!

As ações de mais dois bispos ainda está sendo pesquisada. Além disso, um bispo diocesano, que havia emigrado para a Inglaterra, condenou os crimes nazistas contra a população de origem judaica na Polônia ocupada, em entrevista em uma rádio de Londres tão logo chegou fugido a Inglaterra.

Em 1939,  havia vinte e uma dioceses católicas romanas, na Polônia. Oito ficaram sem seus bispos diocesanos. Eles foram assassinados, exilados ou presos. O da diocese de Płock foi morto. Foram exilados os das dioceses de Gniezno, Poznań e Włocławek. Foram presos os das dioceses de Lublin e Łódź. Foi expulso o da diocese Katowice. Foi forçado a deixar sua diocese o bispo de Pińsk.

Treze bispos diocesanos estiveram efetivamente envolvidos na ajuda à população polaca de origem judaica, o que na Polônia, naqueles dias, foi realizado sob pena de morte. A atividade de dois bispos ainda estava sendo documentada, até a publicação deste artigo. Deve-se sublinhar o bispo diocesano, que já no exterior condenou os crimes nazistas contra o povo judeu na Polônia.

Uma versão preliminar deste artigo apareceu em wSieci Historii, 4/2014, 21-23 (em idioma polaco). Agradecimentos a Artur Rytel-Andrianik e Katarzyna Bruszewska por sua ajuda bibliográfica. A. Klich, "Teodor Kubina: O Bispo Vermelho dos Judeus", passim; M. Paul, Resgate de Judeus em Tempo de Guerra pelo Clero Católico Polaco, p. 155; F. Stopniak, clero católico na Polônia e judeus durante a ocupação alemã, p. 25; J. Walter, The Work of Christian Mercy, p. 14; P. Rytel-Andrianik, "Priests for Judeus - research results," p. 27.


Diocese de Czestochowa
Bispo Teodor Kubina
Ao chegar a Częstochowa em 1925, Kubina se tornou amigo de o rabino local Nachum Asz. Durante a guerra, ele encorajou os padres a emitir certidões de nascimento católicas falsas para judeus e encontrar abrigo para eles.

Sob a orientação do Bispo, o envolvimento dos padres e leigos neste esforço foi bastante eficaz. Os polacos que frequentavam as sinagogas na cidade foram escondidos nos conventos das Irmãs Albertinas, Irmãs Madalena, Irmãs de Nazaré, Oblação Irmãs do Sagrado Coração de Jesus, Irmãs da Reparação do Santo Rosto, Irmãs Bom Pastor, Irmãs Servas de Maria Imaculada (starowiejskie), Ursulinas da União Romana, Irmãs da Ressurreição e outros conventos.

Da mesma forma, a Ordem dos Paulinos de São Paulo e os Salesianos de Dom Bosco abrigaram aquelas pessoas de origem  judaica. A neta do Rabino Asz, Elizabeth Zielińska-Mundlak, foi escondida em um dos jardins de infância do convento.


Diocese de Kielce
Bispo Czesław Kaczmarek
Como os outros bispos, ele incentivou a ajuda aos polacos de origem judaica de todas as maneiras possíveis. De acordo com numerosas fontes, os judeus foram escondidos em Kielce nos mosteiros das Irmãs Albertinas, Filhas de Maria Imaculada, Irmãs Dominicanas, Irmãs de Nazaré, Irmãs Passionistas e Irmãs da Caridade. Padres e diocesanos de Kielce também estiveram envolvidos nesta ajuda.


STOPNIAK, F. “Katolickie duchowieństwo w Polsce i Żydzi w okresie niemieckiej okupacji,” p. 25; PAUL, M. Wartime Rescue of Jews by the Polish Catholic Clergy, 186-187; WALTER, J. Dzieło miłosierdzia chrześcijańskiego, p.14.








Arquidiocese de Cracóvia
Arcebispo Adam Sapieha
Há uma lista de padres que o arcebispo Sapieha permitiu que emitissem certidões de nascimento católicas falsas para aqueles polacos de origem judaica, ou os batizassem se eles assim desejassem. Como resultado, muitas pessoas poderiam obter novos documentos de identidade (por exemplo, a família Kleinmann com seus onze membros).

Em uma carta de 28 de fevereiro de 1942, Sapieha escreveu ao Papa Pio XII sobre os Campos de concentração e extermínio alemão estabelecidos na Polônia ocupada pelas forças armadas nazistas. Em 2 de novembro de 1942, Sapieha falou com as autoridades alemãs contra o terror em relação aos polacos de origem judaica.

P. Blett,  et al. (ed.), Actes et documents du Saint Siège, III, esp. 44-45, 539-541; W. Bartoszewski, Z. Lewinówna, Ten jest z Ojczyzny mojej, 50, 593-594, 824; T. Berenstein, A. Rutkowski, Assistance to the Jews in Poland 1939-1945, 40; E.K. Czaczkowska, “Są Sprawiedliwi znani tylko Bogu,” on- line: http://gosc.pl/doc/1808581.Sa-Sprawiedliwi-znani-tylko-Bogu/2 [January 12, 2015]; B. Kaliski, “Polityka okupantów wobec Kościoła Katolickiego,” 30; M. Kałuski, Wypełniali przykazanie miłosierdzia, 154-155, 170; F. Kącki, Udział księży i zakonnic w holokauście Żydów, 21, 42, 50-51, 113, 116-117; M. Paul, Wartime Rescue of Jews by the Polish Catholic Clergy, 28-29; T. Pawlikowski, Adam Stefan Kardynał Sapieha, 82-86; F. Stopniak, “Katolickie duchowieństwo w Polsce i Żydzi w okresie niemieckiej okupacji,” 24-25; J. Walter, Dzieło miłosierdzia chrześcijańskiego, 14, 33, 40.


Arquidiocese de Lwów
Arcebispo Bolesław Twardowski
Segundo o testemunho do padre Mieczysław Marszalik, secretário do arcebispo Twardowski, uma família de quatro membros do médico Artur Władysław Elmer foi batizada e ficou escondido na casa do arcebispo por dois anos. Infelizmente, o filho de Elmer foi detido pela Gestapo na rua, em 8 de agosto de 1943 e, depois de ser torturado, ele revelou seu esconderijo. A família inteira foi morta e o arcebispo foi monitorado de perto.



G. Chajko, Arcybiskup Bolesław Twardowski (1864-1944), 386-388; M. Kałuski, Wypełniali przykazanie miłosierdzia, 157-158; B. Łoziński, “Życie za życie,” on-line: http://gosc.pl/doc/792380.Zycie-za-zycie [January 12, 2015]; M. Paul, Wartime Rescue of Jews by the Polish Catholic Clergy, 134; F. Stopniak, “Katolickie duchowieństwo w Polsce i Żydzi w okresie niemieckiej okupacji,” 25.






Diocese de Łomża
Bispo Stanisław Łukomski
Józef S. Kutrzeba, conhecido como Arie Fajwisz, descreve que escreveu uma carta ao bispo Łukomski pedindo permissão para ser batizado. O bispo concordou e apoiou o padre Stanisław Falkowski, que o estava escondendo. Contando com o apoio do bispo, padre Falkowski também deu abrigo a outros moradores da cidade de origem judaica, incluindo - o que não é muito conhecido - o famoso escritor Paweł Jasienica (Leon Lech Beynar).


S. Łukomski, “Wspomnienia,” 62; W. Jemielity, “Martyrologium księży diecezji łomżyńskiej 1939- 1945,” 55; E.K. Czaczkowska, “Są Sprawiedliwi znani tylko Bogu,” on-line: http://gosc.pl/doc/1808581.Sa-Sprawiedliwi-znani-tylko-Bogu/2 [January 12, 2015]; M. Kałuski, Wypełniali przykazanie miłosierdzia, 158; M. Paul, Wartime Rescue of Jews by the Polish Catholic Clergy, 262-263; F. Stopniak, “Katolickie duchowieństwo w Polsce i Żydzi w okresie niemieckiej okupacji,” 25; J. Walter, Dzieło miłosierdzia chrześcijańskiego, 15.




Diocese de Łuck
Bispo Adolf Piotr Szelążek
O bispo pediu a seus padres diocesanos que distribuíssem um folheto intitulado “Protesto”, no qual sua autora, Zofia Kossak-Szczucka, exortava os católicos polacos a se oporem às crueldades alemãs, independentemente de qual fossem suas atitudes para com os compatriotas de origem judaica, porque: “(...) aquele que permanece em silêncio diante do assassinato - torna-se cúmplice do assassinato. Quem não condena, condena. ” A população não católica local recebeu ajuda devido ao apoio do bispo Szelążek.


F. Stopniak, “Katolickie duchowieństwo w Polsce i Żydzi w okresie niemieckiej okupacji,” 25; P. Rytel-Andrianik “Księża dla Żydów – wyniki badań,” 27.








Diocese de Przemyśl
Bispo Franciszek Barda
Em uma carta de 4 de novembro de 1939, o bispo Barda escreveu ao papa Pio XII que o prédio da Cúria estava sendo convertido em apartamentos para fiéis da religião de Moisés.

Em junho de 1942, ele enviou um pedido a Bernhard Giesselmann, o comissário de Przemyśl, para mover os judeus-católicos para um lugar seguro onde eles não tivessem que ficar no gueto.

Infelizmente, isso trouxe o efeito oposto. Aquelas pessoas foram presas e imediatamente deportadas para o gueto. Alguns deles morreram. O bispo Barda também assinou certidões de nascimento católicas falsas para pessoas de origem  judaica, incluindo Stanley e Lusi Igel (Igiel) e sua filha Toni (mais tarde Toni Rinde).

S. Zych, Diecezja przemyska obrządku łacińskiego, 199-205; M. Janowski, “Polityka niemiecka władz okupacyjnych wobec ludności polskiej i żydowskiej w Przemyślu w latach 1939-1944,” 215; M. Paul, Wartime Rescue of Jews by the Polish Catholic Clergy, 134; E. Rączy, Pomoc Polaków dla ludności żydowskiej na Rzeszowszczyźnie 1939-1945, 76, 79; E. Rączy, I. Witowicz, Polacy ratujący Żydów na Rzeszowszczyźnie w latach 1939-1945, 167; F. Stopniak, “Katolickie duchowieństwo w Polsce i Żydzi w okresie niemieckiej okupacji,” 25; J. Walter, Dzieło miłosierdzia chrześcijańskiego, 14.


Diocese de Sandomierz
Bispo Jan Kanty Lorek
O Povo Judeu orou por uma semana na Sinagoga de Sandomierz pelo bispo local depois que ele conseguiu com sucesso (e financeiramente) libertar pessoas de origem  judaica, em 1939.

Além disso, algumas famílias judias foram escondidas no seminário de Sandomierz e na torre da catedral. O Bispo Lorek prometeu dar abrigo a Yehiel Halevi Halshtok, Rabino de Ostrowiec, que não aceitou a ajuda, dizendo que não poderia salvar apenas a si mesmo quando seu povo estava sendo morto.

B. Kaliski, “Polityka okupantów wobec Kościoła Katolickiego,” 30; M.Kałuski, Wypełniali przykazanie miłosierdzia, 165; M. Paul, Wartime Rescue of Jews by the Polish Catholic Clergy, 15-16; F. Stopniak, “Katolickie duchowieństwo w Polsce i Żydzi w okresie niemieckiej okupacji,” 25; J. Walter, Dzieło miłosierdzia chrześcijańskiego, 14; Z. Zieliński, (ed.), Życie religijne w Polsce pod okupacją hitlerowską 1939-1945, 444.





Diocese de Tarnów
Bispo Edward Komar
O bispo encorajou seus diocesanos a ajudar as populações judaica e cigana. Ele não cedeu à pressão da Gestapo para proibir formalmente os padres de cooperar com a resistência polaca e ajudar os judeus. Os alemães frequentemente revistavam seu apartamento e o ameaçavam. Em resposta a isso, ele informou ao Arcebispo Adam Sapieha sobre as ações dos ocupantes alemães.



E. Kurek, Dzieci żydowskie w klasztorach, 211-215, 232-234; M. Paul, Wartime Rescue of Jews by the Polish Catholic Clergy, 176-177; F. Stopniak, “Katolickie duchowieństwo w Polsce i Żydzi w okresie niemieckiej okupacji,” 25, 31.








Arquidiocese de Varsóvia
Arcebispo Stanisław Gall
O arcebispo estava salvando padres judeus de Varsóvia, incluindo o padre Tadeusz Puder, a quem nomeou capelão do convento das Irmãs Franciscanas da Família de Maria em Białołęka. Ele também permitiu a emissão de certidões de nascimento católicas falsas (por exemplo, para o Reverendo Marceli Godlewski), o que ajudou a resgatar muitos polacos de origem  judaica. O Arcebispo Stanisław Gall morreu em setembro de 1942.


P.F. Dembowski, Christians in the Warsaw Ghetto, 61-62; M. Paul, Wartime Rescue of Jews by the Polish Catholic Clergy, 118; E.K. Czaczkowska, “Są Sprawiedliwi znani tylko Bogu,” on-line: http://gosc.pl/doc/1808581.Sa-Sprawiedliwi-znani-tylko-Bogu/2 [January 12, 2015]; F. Stopniak, Katolickie duchowieństwo w Polsce i Żydzi w okresie niemieckiej okupacji, 27; J. Walter, Dzieło miłosierdzia chrześcijańskiego, 45.




Arquidiocese de Vilno
Arcebispo Romuald Jałbrzykowski

Em 1941, o arcebispo de Vilno pediu para esconder os fugitivos do gueto nas ordens religiosas. Ele enviou professores judeus da Universidade de Stefan Batory - Michael Reicher e Julian Abramovich - para o convento das Irmãs de Nazaré.

Ele também deu um grande apoio ao clero local para salvar os cidadãos polacos de origem  judaica. Alguns deles foram mortos por salvar aquelas pessoas.

W. Bartoszewski, Z. Lewinówna, Ten jest z Ojczyzny mojej, 50; S. Bak, Painted in Words, 335-346, 353-360; M. Kałuski, Wypełniali przykazanie miłosierdzia, 171; D. Nespiak, “Żydzi na Kresach. Słowa i czyny,” on-line: http://www.lwow.home.pl/kres-zydzi.html [January 12, 2015]; M. Paul, Wartime Rescue of Jews by the Polish Catholic Clergy, 139; 146; F. Stopniak, “Katolickie duchowieństwo w Polsce i Żydzi w okresie niemieckiej okupacji,” 23-24; J. Walter, Dzieło miłosierdzia chrześcijańskiego, 15; Z. Zieliński (ed.), Życie religijne w Polsce pod okupacją 1939- 1945, 51.



Bispo na emigração
Bispo Karol Radoński

Além dos bispos diocesanos mencionados, havia outros bispos que, permanecendo fora de suas dioceses, se empenhavam em ajudar a população judaica. Karol Radoński, bispo de Włocławek, por exemplo, condenou as atrocidades alemãs contra os judeus, em seu discurso, em 14 de dezembro de 1942, na rádio de Londres.

Ele disse: “Os assassinatos cometidos abertamente contra os judeus na Polônia em meio às explosões e zombarias dos algozes e seus vassalos devem evocar horror e repulsa em todo o mundo civilizado. ... Como bispo polaco, condeno com toda a certeza o crime cometido na Polônia contra a população judaica ”.

G. Górny, Sprawiedliwi, 148.






Outros dois bispos diocesanos
As atividades de Karol Maria Splett (diocese de Chełmno) e Czesław Sokołowski (diocese de Siedlce, ou seja, Diocese da Podláquia) requerem mais pesquisas.

Enquanto Splett (que era alemão) foi acusado de falta de oposição firme aos comandos dos ocupantes alemães devido à sua origem, a atividade de Sokołowski era vista com mais frequência e de maneira positiva.

Dom Splett, bispo diocesano de Gdańsk, foi nomeado administrador temporário da vizinha diocese de Chełmno devido à situação extremamente difícil ali. A principal acusação contra ele era sua falta de oposição às autoridades alemãs. Quando os alemães emitiram o regulamento de outubro de 1939 ordenando o uso da língua alemã nas igrejas, o bispo Splett repetiu a ordem. Isso foi recebido com críticas contundentes pelo Cardeal Luigi Maglione, o Secretário de Estado do Vaticano, que ordenou a retirada do regulamento em uma carta de 12 de novembro de 1940. O Bispo Splett explicou mais tarde que ele o introduziu, após a Gestapo ter preso seis padres que ouviam confissões em idioma polaco.

Uma pesquisa recente de Rafał Dmowski mostrou que as acusações contra o bispo Czesław Sokołowski, da Diocese de Siedlce, na região da Podláquia são amplamente infundadas.


Naquela época, no entanto, o bispo Sokołowski foi transferido de sua residência por ocupantes alemães e estava hospedado em uma antiga paróquia ortodoxa (na ulica Sienkiewicz 37).

Na virada do ano de 1943 para 1944, o bispo Sokołowski foi condenado à morte pela Armia Krajowa (Exército da Pátria Polaca) por suposta colaboração com os ocupantes alemães, que mais tarde foi transformada em infâmia (privação de boa reputação).

No entanto, como podemos explicar o fato de que ele nomeou sete capelães das Forças Armadas Nacionais em 1943, e foi recomendado como o futuro arcebispo de Varsóvia pelo cardeal anti-alemão Hlond (carta de 31 de agosto de 1942)?

Além disso, vale mencionar que, de acordo com algumas fontes, o bispo Sokołowski foi libertado da prisão em 1939 sob fiança por contribuições reunidas entre os polacos-judeus.

Sokołowski foi acusado de, entre outras coisas, hospedar alemães em sua residência. Fora isso, o estudo sobre padres católicos gregos ajudando judeus, incluindo o Metropolitano, nas relações dos bispos diocesanos auxiliares com a população de origem judaica ainda requerem mais pesquisas.

Até o momento, não houve monografia sobre bispos que resgataram o povo polaco-judeu. No entanto, é claro que quase todos os bispos e administradores das dioceses católicas romanas, na Polônia, estavam envolvidos nesta assistência, embora estivessem pressionados por sentenças de pena de morte.

- P. Blett et al. (ed.), Actes et documents du Saint Siège, III, esp. 5-14, 23-24, 326-328, 336-340, 346.
- R. Dmowski, Unitis Viribus, 157-188. 15 P. Blett et al. (ed.), Actes et documents du Saint Siège, III, esp. 629-631.
- Cfr. esforços de Karol Niemira, bispo auxiliar de Pińsk. Permaneceu na paróquia de Santo Agostinho em Varsóvia (na fronteira do gueto). Ele ajudou mais de 100 pessoas, a maioria crianças judias, a escapar do gueto. Eugeniusz Baziak, bispo auxiliar de Lwów, esteve envolvido no resgate de Karolina Jus (nascida Frist) e sua família. Arcebispo de Lwów, Andrey Sheptytsky, pode trazer informações importantes.



Bibliografia
- Bak, S., Painted in Words: A Memoir (Bloomington and Indianapolis: Indiana University Press; Boston: Pucker Art Publications, 2001).

- Bartoszewski, W., Lewinówna, Z., Ten jest z Ojczyzny mojej. Polacy z pomocą Żydom 1939-1945 (Warszawa: Stowarzyszenie ŻIH, 2007).

- Bednarczyk, T., Obowiązek silniejszy od śmierci. Wspomnienia z lat 1939-1944 o polskiej pomocy dla Żydów w Warszawie (Warszawa: Grunwald, 1986).

- Berenstein, T., Rutkowski, A., Assistance to the Jews in Poland 1939-1945 (Warszawa: Polonia Publishing House, 1963).

- Blett, P. et al. (ed.),  Actes et documents du Saint Siège relatifs à la seconde guerre mondiale. III: Le Saint Siège et la Situation Religieuse en Pologne et dans le pays Baltes 1939-1945 (Città del Vaticano: Libreria Editrice Vaticana, 1967).

- Chalko, G., Arcybiskup Bolesław Twardowski (1864–1944): Metropolita lwowski obrządku Łacińskiego (Rzeszów: Instytut Pamięci Narodowej – Komisja Ścigania Zbrodni przeciwko Narodowi Polskiemu, Oddział w Rzeszowie, 2010).

- Czaczkowska, E.K., “Są Sprawiedliwi znani tylko Bogu. O Polakach ratujących Żydów w czasie II wojny światowej i o zniekształconej historii z Grzegorzem Górnym,” Gość Niedzielny, 50/2013, on-line: http://gosc.pl/doc/1808581.Sa-Sprawiedliwi-znani-tylko-Bogu/2 [January 12, 2015].

- Dembowski, P.F., Christians in the Warsaw Ghetto: An Epitaph for the Unremembered (Notre Dame: University of Notre Dame Press, 2005).

- Dmowski, R., Unitis Viribus. Diecezja podlaska w II Rzeczypospolitej (Warszawa: Muzeum Historii Polskiego Ruchu Ludowego, 2013).

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Autor: Paweł Rytel-Andrianik
Tradução do polaco para português: Ulisses Iarochinski

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2021

Historiadores condenados na Polônia

Eles transformaram um herói em chantagista.
Tribunal: Grabowski e Engelking têm que se desculpar.


Tribunal de Varsóvia decidiu nesta terça-feira (09/02) que dois historiadores polacos devem pedir desculpas por terem "manchado a memória" de um ex-prefeito polaco num livro que escreveram sobre o Holocausto, ao apontarem o envolvimento da antiga autoridade no extermínio de judeus. 

O processo causou polêmica tanto na Polônia quanto em Israel.

Acadêmicos temem que a decisão possa prejudicar a pesquisa imparcial sobre as ações de polacos durante a Segunda Guerra Mundial.

O tribunal declarou que os pesquisadores Barbara Engelking, diretora do Conselho Internacional de Auschwitz na Polônia, e Jan Grabowski, da Universidade de Ottawa, devem se desculpar com Edward Malinowski por terem citado no livro Dalej jest noc (Assim é a noite, em tradução livre), de 2018, que o então prefeito do vilarejo de Malinowo entregou judeus a alemães nazistas.

A justiça, no entanto, não acatou o pedido de pagamento de uma indenização de 100 mil złotys – o equivalente a cerca de R$ 145 mil.

O processo partiu de uma sobrinha de Malinowski, Filomena Leszczyńska, de 81 anos, que considerou que a memória do tio havia sido difamada. A ação foi financiada pela Liga Polaca Contra a Difamação, organização que se opõe à existência de envolvimento de polacos no assassinato de judeus durante a Segunda Guerra Mundial.

A advogada de Leszczyńska, Monika Brzozowska-Pasieka, alegou que Engelking e Grabowski não seguiram a metodologia correta de pesquisa no livro. "Filomena está extremamente satisfeita com este veredicto", disse Brzozowska-Pasieka após o julgamento. "A questão da compensação desde o início foi secundária", completou.

O livro menciona que o ex-prefeito pode ter participado de um massacre local de judeus por soldados alemães. No entanto, Leszczyńska diz que seu falecido tio, na verdade, ajudou judeus. Para ela, houve "omissões" e "erros metodológicos" que fazem seu tio parecer alguém que traiu judeus.

De acordo com o livro, Malinowski permitiu que uma mulher judia sobrevivesse ao ajudá-la a se passar por não-judia. No entanto, em depoimento, a sobrevivente afirmou que ele foi cúmplice na morte de dezenas de judeus.

Desacreditar pesquisa
Os historiadores negam a acusação e disseram que vão recorrer da decisão. Eles argumentam que o caso é uma tentativa de desacreditá-los pessoalmente e dissuadir outros acadêmicos de investigar a verdade sobre o extermínio de judeus na Polônia.

"Este é um caso do Estado polaco contra a liberdade de pesquisa", disse Grabowski, cujo pai era um sobrevivente do Holocausto.

Acadêmicos polacos e organizações judaicas expressaram preocupação de que o julgamento possa minar a liberdade de pesquisa. Para Engelking, o caso é "um esforço" para mostrar aos pesquisadores "que há questões que não deveriam ser abordadas".

O Congresso Judaico Mundial disse, em comunicado, que estava "consternado" com a decisão. O memorial do Holocausto Yad Vashem de Jerusalém afirmou que as acusações "equivalem a um ataque ao esforço para obter um quadro completo e equilibrado da história do Holocausto" e "constitui um sério ataque à pesquisa livre e aberta".

Críticos acusam o atual governo nacionalista da Polônia de tentar encobrir o papel de autoridades polacas no genocídio de judeus durante a ocupação nazista alemã e desencorajar pesquisas acadêmicas sobre casos de colaboração.

Questão delicada
Mais de sete décadas depois do fim da Segunda Guerra Mundial, a contribuição de polacos para o Holocausto continua sendo uma questão política delicada na Polônia. Várias pesquisas mostram que, enquanto milhares de polacos arriscaram suas vidas para ajudar judeus, outros muitos teriam participaram do genocídio.

O partido ultraconservador no poder, o Direito e Justiça (PiS), alega que os estudos que mostram a cumplicidade de polacos no extermínio de judeus pela Alemanha nazista são uma tentativa de desonrar o país, que sofreu imensamente com o conflito.

Em 2018, a Polônia chegou a aprovar uma lei para criminalizar qualquer menção sobre a responsabilidade polaca nos crimes cometidos por alemães durante a ocupação do país na Segunda Guerra Mundial. Após pressão internacional, a lei, que previa uma pena de até três anos de prisão, foi derrubada.

Quase todos os 3,2 milhões de judeus da Polônia morreram durante a Segunda Guerra – cerca da metade do total de judeus que teriam sido vítimas do Holocausto. Outros 3 milhões de polacos de outras religiões morreram durante a ocupação nazista.

Somente em Auschwitz, o maior campo de extermínio nazista, foram assassinados cerca de 1,5 milhão de prisioneiros, a maioria judeus.

Fontes: le/cn (efe, ap, ots)

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2021

Julgamento determinará estudos sobre o Holocausto

Dois historiadores polacos estão sendo julgados por difamação devido a um estudo acadêmico sobre o comportamento polaco durante a segunda guerra mundial, um caso cujo desfecho poderá determinar o destino de pesquisas independentes sobre o Holocausto no país.


A decisão do tribunal distrital de Varsóvia sobre o processo contra os historiadores Barbara Engelking e Jan Grabowski deverá ser conhecida neste 09 de fevereiro, sendo este o primeiro processo desde que, em 2018, a Polônia tentou aprovar uma lei para criminalizar o ato de culpar falsamente o país pelos crimes relacionados com o Holocausto.

Uma intenção legislativa que gerou uma forte disputa diplomática com Israel e que acabou por cair.

O caso que envolve os dois historiadores é de difamação civil, julgado sob uma lei preexistente, mas vários estudiosos acreditam que abrirá um precedente na liberdade de pesquisa sobre o Holocausto.

Barbara Engelking é historiadora no Centro Polaco para a Pesquisa do Holocausto, em Varsóvia, e Jan Grabowski, filho de um judeu polaco sobrevivente, é professor de História na Universidade de Otawa, no Canadá.

Desde que conquistou o poder, em 2015, o partido conservador Direito e Justiça (PiS) tem procurado desencorajar as investigações sobre os delitos polacos durante a ocupação alemã ao longo da Segunda Guerra Mundial, preferindo salientar o heroísmo e sofrimento dos cidadãos do país.

O objetivo é promover o orgulho nacional, mas os críticos do partido no poder entendem que se trata de uma estratégia do Governo para encobrir o fato de alguns polacos, não todos, terem colaborado no extermínio dos judeus.

Entrada do Museu Yad Vashen

O processo contra os dois historiadores é entendido pelo museu israelita do Holocausto Yad Vashem como "um sério ataque à pesquisa livre e aberta" enquanto a Fundação para a Memória da Shoah, sediada em Paris, o descreve como "uma caça às bruxas" e uma "invasão perniciosa no coração da pesquisa".

No centro deste processo está um estudo, de dois volumes e 1.600 páginas em polaco, com o título Dalej jest noc: losy Żydów w wybranych powiatach okupowanej Polski (Noite sem fim: O destino dos judeus em condados selecionados da Polônia ocupada"), co-editado por Barbara Engelking e Jan Grabowski.

Os historiadores veem este caso como uma tentativa de desacreditá-los e de desencorajar outros investigadores a pesquisarem a verdade sobre o extermínio dos judeus na Polônia.

"Este é um caso do Estado polaco contra a liberdade de pesquisa", afirmou Jan Grabowski. O historiador, diz que foi alvo de assédio antissemita, tanto online como nas palestras que deu no Canadá, França e outros países.

Por seu lado, as autoridades polacas, têm argumentado que este é um caso civil, refutando a tese de que representa uma ameaça à liberdade de expressão.

Numa carta ao representante dos sobreviventes do Holocausto em Israel, o embaixador da Polônia em Israel, Marek Magierowski, expressou a sua preocupação com os insultos antissemitas que surgiram na sequência deste caso.

Por outro lado, Filomena Leszczyńska, sobrinha de um homem da aldeia de Malinowo cujo comportamento durante a guerra é brevemente mencionado no estudo, processou os dois historiadores exigindo 100 mil złotys (cerca de 22.250 euros) e um pedido de desculpa através dos jornais.

De acordo com as provas apresentadas no estudo, Edward Malinowski, contribuiu para salvar uma judia ao ajudá-la a passar por não judia, mas o testemunho da sobrevivente é citado como tendo dito que o homem foi cúmplice da morte de várias dezenas de judeus.

Malinowski foi absolvido de colaboração com os alemães num julgamento pós-guerra e a sobrinha conta com o apoio da Liga Polaca Contra a Difamação, uma organização próxima do Governo polaco.

Para esta Liga, os dois historiadores são culpados de caluniar "o bom nome" de um herói polaco, que dizem não ter tido nenhum papel na morte dos judeus, e, por acréscimo, de prejudicar a dignidade de todos os polacos.

A indignação de Filomena Leszczyńska foi provocada por um fragmento da publicação sobre seu tio Edward Malinowski. A história toda diz respeito a Maria Wiśniewska (também conhecida como Estera Drogicka), que em 1942 salvou sua vida indo trabalhar na Prússia Oriental (Atual Alemanha).


Malinowski, o chefe de Malinów, ajudou-a a escapar. A mulher "percebeu que ele foi cúmplice da morte de várias dezenas de judeus que estavam escondidos na floresta e foram entregues aos alemães, mas deu falso testemunho em sua defesa em seu julgamento após a guerra", escreveu a prof. Barbara Engelking em  "Ainda é noite" (Noite sem fim tradução para inglês).

Leszczyńska considerou que a publicação sobre seu tio infringia seus direitos pessoais: "o direito de venerar a memória do falecido", "o direito ao orgulho e à identidade nacional", "o direito a uma história imperturbada da Segunda Guerra Mundial", " o direito de não violar a honra "," O direito de receber informações confiáveis ​​da pesquisa histórica que paga ". A mulher, apoiada no Reduto do Bom Nome, exige um pedido de desculpas. 

Dr. Tomasz Domański da filial da cidade de Kielce do Instituto de Memória Nacional apontou aos cientistas inúmeros erros técnicos e a construção de uma narrativa que não corresponde aos fatos. "Os autores parecem traçar um quadro em que a existência judaica dependia principalmente da vontade dos polacos" - escreve um funcionário .

A objeção mais importante de Domański aos autores é uma seleção seletiva de fatos e fatos que foram submetidos à análise histórica. “Os estudos históricos devem servir para mostrar o quadro mais completo possível dos acontecimentos. Um elemento particularmente importante da oficina de cada historiador é o confronto de fontes de proveniências diversas, visando apresentar os acontecimentos da forma mais objetiva possível” - observou o historiador.

A opinião do pesquisador de Kielce é defendida pelo prof. Jacek Chrobaczyński da Universidade Pedagógica de Cracóvia. "Algumas pessoas que estudaram o trabalho devem considerar a questão de quais foram os pressupostos metodológicos da pesquisa. Os autores delinearam com precisão o cenário da oficina, que une a estrutura mental dos textos. Este livro não pode ser tratado como uma monografia", disse o cientista.

Zygmunt Stępiński, diretor do Museu de História dos Judeus Polacos POLIN, emitiu uma posição semelhante a respeito do julgamento de professores. “Lamento a falta de ataques substantivos - pessoais e institucionais - a investigadores que, de acordo com as melhores práticas e normas em vigor no mundo científico, cumprem a missão de descobrir fatos e fenômenos relativos a um dos períodos mais trágicos do história da Polônia e do mundo", escreveu o diretor do museu.

Mark Weitzman, diretor dos assuntos governamentais do Centro Simon Wesenthal referiu-se a "Noite sem fim" como um "livro meticulosamente pesquisado e conseguido... que detalha milhares de casos de cumplicidade dos polacos no assassinato de judeus durante o Holocausto".

Na sua opinião, os procedimentos contra os dois historiadores de reputação internacional "não são mais do que uma tentativa de usar o sistema legal para amordaçar e intimidar as pesquisas sobre o Holocausto na Polônia".

Ao usar "milhares de casos", Weitzman exagera no tom e compromete a sua própria opinião sobre o assunto. O Instituto da Memória Nacional nunca negou a participação de cidadãos católicos, que para escapar de punições severas, ou mesmo ressentidos tenham entregue cidadãos de origem e religião judaica aos algozes alemães. Mas não concorda com a banalização forçada de acusadores, por mais representativos que sejam, de criminalizar um grande número não provado cientificamente, ou criminalmente de cidadãos polacos como colaboracionistas dos nazistas.

BARBARA ENGELKING
Nascida em Varsóvia, em 1962,  Engelking recebeu um Mestrado em psicologia pela Universidade de Varsóvia, em 1988, e um Doutorado em sociologia pela Academia Polaca de Ciências, também em Varsóvia, com a tese sobre "A Experiência do Holocausto e suas Consequências em Relatos Autobiográficos" em 1993.
Desde então, Engelking foi professora assistente assistente no Centro Polaco de Pesquisa do Holocausto, parte do Instituto de Filosofia e Sociologia da Academia Polaca de Ciências. Desde 2014, ela é presidente do Conselho Internacional de Auschwitz da Polônia. De novembro de 2015 a abril de 2016, ela foi Ina Levine Invitational Scholar no Museu Memorial do Holocausto dos Estados Unidos Mandel Center em Washington, DC.

JAN GRABOWSKI
Grabowski nasceu em Varsóvia, Polônia, filho de mãe católica romana e pai judeu. Seu pai, Zbigniew Grabowski, um sobrevivente do Holocausto e professor de química de Cracóvia, lutou no Levante de Varsóvia de 1944.
Enquanto estava na Universidade de Varsóvia, Grabowski foi ativo na União de Estudantes Independentes entre 1981 e 1985, onde ajudou a administrar uma gráfica clandestina para o movimento Solidariedade.
Ele recebeu seu mestrado em 1986, e em 1988 emigrou para o Canadá.
As restrições de viagens foram facilitadas pelo governo comunista da Polônia. Se ele soubesse que o regime cairia um ano depois, ele teria ficado, disse ele a um entrevistador: "Quando parti em 1988, pensei que não havia futuro para nenhum jovem na Polônia. Parecia que você estava olhando para o mundo através de uma espessa parede de vidro. Era uma espécie de irrealidade ... as regras eram oblíquas, estranhas, até desumanas. Então, depois de um ano, o sistema parecia desabar como um castelo de cartas. "
Ele recebeu seu Doutorado pela Université de Montreal, em 1994, para uma tese intitulada The Common Ground. Settled Natives and French in Montréal 1667–1760. Grabowski possui as duas cidadanias, polaca e canadense.


Fonte: Associated Press e outras

sexta-feira, 22 de janeiro de 2021

Polônia lança versão crítica de "Mein Kampf"

O livro é acima de tudo "um aviso de que é possível desmantelar facilmente a democracia e caminhar para um regime totalitário quase invisível', avalia o diretor da editora Bellona.

Uma edição crítica, a segunda no mundo, da obra panfletária Mein Kampf de Adolf Hitler é publicada esta semana na Polônia como uma "homenagem às vítimas do sistema criminoso e um aviso para as gerações futuras", de acordo com o historiador que o escreveu.

"Para os seus críticos, esta publicação constitui uma ofensa à memória das vítimas do nacional-socialismo. Na minha opinião, é absolutamente o contrário", afirma o professor especialista do período nazista Eugeniusz Krol, que trabalhou quase três anos nesta edição. Edição crítica de "Mein Kampf'" vende 85 mil exemplares em um ano

No mercado polaco existem versões piratas de Mein Kampf (Minha luta, em português), abreviadas, a maioria traduzida do inglês e sem um foco crítico adicional, com um "efeito negativo", disse à AFP.

A edição acadêmica polaca de 'Mein Kampf' tem o título Moja Walka

Foto: Wojtek Radwanski / AFP

Em sua opinião, sua edição, “que mostra o original, essa fonte histórica em um contexto mais amplo”, “não pode ser explorada por forças extremistas”.

A edição crítica polaca, a segunda do mundo, é composta por mil páginas, metade delas de anotações. A edição alemã, primeira publicada no mundo em 2016, tem 2.000 páginas e vendeu mais de 100.000 exemplares.

O diretor do museu Auschwitz-Birkenau, Piotr Cywinski, disse ao jornal Rzeczypospolita que "a percebe" como uma edição para fins científicos, mas adverte contra a campanha promocional "que pode estar em conflito" com a legislação que proíbe a promoção do fascismo, com pena de dois anos de prisão.

Zbigniew Czerwinski, diretor da editora Bellona, especializada em textos históricos, procura dissipar esses temores.

A primeira tiragem será de 3.000 exemplares e nenhuma campanha publicitária está planejada. O livro também custa cerca de 150 złotys (33 euros, quase 40 dólares, 217,50 reais), um preço muito alto na Polônia.

“Não queremos que esta publicação seja facilmente acessível e estamos considerando que parte das receitas, se houver, seja doada à Fundação ou ao museu de Auschwitz”, enfatiza.

"Pode ser algo positivo"

Escrito pelo ditador nazista entre 1924 e 1925, enquanto estava preso após um golpe fracassado, este texto fundador do nazismo e do projeto para exterminar os judeus foi publicado sob seu reinado de terror com 11,5 milhões de exemplares.

Na Polônia, onde seis milhões de habitantes, quase metade deles de origem judaica, morreram durante a guerra nas mãos dos nazistas, esta publicação é "importante e necessária", diz Czerwinski.

Havia edições piratas no início de 2000, incluindo a de 2005 a pedido do governo da Baviera (Alemanha), que detinha os direitos antes que se tornassem de domínio público no final de 2015.

Para Czerwinski, o livro é acima de tudo “um aviso de que é possível desmantelar facilmente a democracia e caminhar para um regime totalitário quase invisível”.

“O que aconteceu depois de 1933 na Alemanha pode acontecer hoje, amanhã, depois de amanhã em várias partes do mundo. Os sinais são facilmente perceptíveis”, acrescenta.

Krol destaca, por sua vez, essa "acusação às elites da época", que subestimou Hitler.

Para o rabino-chefe da Polônia, Michael Schudrich, a questão de publicar ou não Mein Kampf "realmente surgiu 20 anos atrás, mas podemos encontrar tudo isso na internet hoje."

“Uma edição crítica bem feita pode ajudar a compreender de forma muito mais completa e profunda os perigos do nazismo, da mentira e do totalitarismo”, considera. "Na minha opinião, pode ser algo positivo".

"É importante que os cientistas leiam o que Hitler escreveu em Mein Kampf (...). O que ele disse antes de assumir o poder foi exatamente o que fez depois", disse ele.

Para ele, quem quer o livro em versão anotada e quem se opõe a ele procuram, na verdade, a mesma coisa: "Acabar com o fascismo".


Texto: Bernard Osser
Fonte: AFP - Agência France Press

segunda-feira, 23 de novembro de 2020

POLÔNIA CONTRA A ULTRADIREITA

A Polônia se levanta contra a ultradireita. A onda conservadora vira tiro pela culatra. Em resposta a tentativa de limitar o direito ao aborto, milhares vão às ruas. Mulheres exigem democracia e fim do governo fundamentalista.


Muita gente viu fotos das grandes manifestações que tomaram as ruas de cidades da Polônia nas últimas semanas. Talvez se perguntem como é possível que, durante uma pandemia, centenas de milhares de pessoas, principalmente mulheres jovens, tenham saído para se manifestar na maior mobilização social do país desde o movimento Solidariedade, na década de 1980.

O que levou as pessoas às ruas?

A razão mais imediata desta mobilização é uma sentença recente do Tribunal Constitucional, que se transformou num organismo político que, segundo muitos observadores, não é mais independente do Partido Direito e da Justiça (PiS), o partido de extrema-direita que ocupa o governo há dois mandatos. 

Resumindo: em 22 de outubro último, este tribunal, presidido por uma mulher, decidiu invalidar a constitucionalidade do acesso ao aborto por má formação no feto, limitando ainda mais a regida lei de aborto polaca. De fato, a Polônia tem uma longa história de restrições ao direito reprodutivo.

A interrupção da gravidez era legal e acessível durante o período do socialismo de Estado posterior a 1956, mas uma lei promulgada, em 1993, o limitou a apenas três casos: quando a gravidez for resultado de um crime (ou seja, de um estupro), quando a vida ou a saúde da mulher estiverem em risco e quando o feto apresentar anomalias graves. Enquanto estavam vigentes estas restrições, o número de procedimentos realizados era escasso: pouco mais de mil abortos anuais feitos pela via legal, em um país com uma população de 38 milhões de habitantes. Além disso, até outubro de 2020, 97% destes procedimentos foram realizados através do pressuposto que acaba de ser proibido.

A consequência disso é que a decisão do Tribunal supõe que, na prática, quase todas as interrupções de gravidez estão proibidas. Naturalmente, as mulheres seguirão fazendo aborto às margens do sistema. Quando, no começo da década de 1990, esse direito foi restringido, as mulheres passaram a buscar procedimentos clandestinos. Atualmente, existem redes de acompanhamento que oferecem às mulheres o financiamento e a informação necessárias para abortar de forma segura no exterior, ou fazê-lo elas mesmas em casa.

A ilegalidade quase total do aborto poderia ter sido prevista no clima político atual da Polônia. O governo não previa, no entanto, uma resposta tão multitudinária contra essa decisão. As últimas medidas tomadas pelo PiS e a resistência frente a elas devem ser analisadas no contexto da guerra corrente contra a “ideologia de gênero e LGBTI+”, que o governo polaco tem lutado nos últimos cinco anos (desde que o Partido Direito e Justiça ganhou pela primeira vez as eleições presidenciais).

Essas são algumas das suas últimas ações claramente contra a igualdade: o ministro da Justiça ameaçou, em julho de 2020, retirar-se de forma oficial do Convênio de Istambul (o instrumento do Conselho da Europa que trata de prevenção e luta contra a violência às mulheres e as violências domésticas) e Andrzej Duda, o presidente da Polônia, em sua campanha pela reeleição recente, afirmou em uma conhecida declaração que “LGBTI+ é uma ideologia, não é gente”. Além disso, as ações do governo têm se agravado com o tempo e, em agosto de 2020, a polícia atacou e prendeu ativistas LGBTI+ de Varsóvia.

Os protestos que estão acontecendo agora são uma resposta ao aumento da perseguição contra os direitos das mulheres e das pessoas LGBTI+, que culminou com a sentença do Tribunal Constitucional, mas são também fruto de mobilizações anteriores da esquerda. Em 2016, a tentativa do Parlamento de restringir o acesso ao aborto legal foi detido por manifestações em massa (conhecidas como o “protesto negro”) e greves de mulheres. E na primavera de 2020, durante o confinamento, uma tentativa parecida foi contra-atacada por bloqueios do trânsito nas maiores cidades, protestos nas sacadas de prédios, reuniões espontâneas e passeios coletivos em espaços públicos.

A partir de uma perspectiva mais ampla, esses protestos são igualmente consequência, direta e indireta, de todas as mobilizações sociais ocorridas, desde os anos 1990 e início dos anos 2000, pelos direitos das mulheres e LGBTI+, e das recentes greves globais pelo clima. No contexto polaco, além de tudo, podem ser entendidas em linhas gerais como um indicador do fim do domínio cultural e político da Igreja Católica Apostólica Romana e de sua contínua ingerência na esfera pública e no sistema educativo (a religião foi introduzida nos colégios públicos em 1990). Um exemplo disso é que, hoje, a lei do aborto de 1993 é entendida pela população em geral como um “pacto”, feito pelas costas das mulheres, entre os líderes políticos homens e os membros da Igreja católica.

A questão do aborto na Polônia está muito politizada nos últimos 30 anos — e, especialmente, nos últimos cinco. O governo, ao dar sinal verde para uma nova restrição na lei, brincou com fogo. Foi contra a maioria que forma a opinião pública polaca, que se opõe a novas proibições e prefere que os supostos casos de aborto de legal se ampliem, em vez de serem reduzidos.

Daí, vem a reação.
Os protestos contra a sentença do Tribunal começaram no dia 22 de outubro e continuaram de outras formas nos semanas seguintes: marchas de rua, bloqueios em horários de grande tráfego em entroncamentos importantes e manifestações em escritórios e em frente a casas de algumas personalidades importantes da direita. A maior concentração ocorreu no dia 30 de outubro, quando mais de 100 mil pessoas se uniram para bloquear Varsóvia.

A sentença do Tribunal chegou em um momento muito difícil para muitos setores da sociedade: com a pandemia de covid-19, o sistema de saúde a ponto de colapsar e previsões de recessão econômica, muitos grupos perderam a confiança em um governo que está distraído, intensificando sua campanha de ódio contra as pessoas LGBTI e mulheres.

Por esse motivo, se somaram aos protestos outros grupos, como taxistas, associações agrícolas, sindicatos e, de maneira espontânea, motoristas de ônibus e bondes urbanos. É importante mencionar que essas revoltas se ampliaram e chegaram às cidades menores, sobretudo em áreas conhecidas por serem a base política do PiS, como a região noroeste de Podlasie (Podláquia) e a região sul de Podkarpacie (Subcarpática).

Sabemos que, na Polônia, um país onde as organizações de mulheres lutam há mais de duas décadas pelo aborto legal, esta onda de manifestações foi de longe a que mobilizou mais gente. E também foi incomum por muitas outras razões. Em primeiro lugar, porque o ápice foi a raiva das mulheres, sentida de forma massiva, coletiva e transbordante, de forma parecida, por exemplo, ao movimento #MeToo. Essa reação emocional potente poderia ter sido resultado da frustração acumulada pelos contínuos passos do governo para limitar os direitos das mulheres.

Agora, a raiva das mulheres se desatou ao ver como o partido que está no governo proibia a prática de aborto em sua totalidade, sem aparentar qualquer respeito pelo processo democrático — a lei foi modificada sem debate público e isso constitui uma omissão do dito processo — e talvez também devido a que essa proibição é algo muito pessoal para muitas delas, porque se deram conta, mais uma vez, de que suas vidas são tratadas com total desprezo por numerosos homens a frente de cargos políticos.

Seja como for, essa raiva contra o governo respingou na Igreja católica — muitas mulheres protestaram nas missas de domingo, e algumas igrejas foram “decoradas” com grafites em sinal de protesto. E também se dirigiu contra líderes políticos homens e falsos aliados, que queriam apropriar-se da raiva das mulheres para seu próprio benefício político. Um exemplo é o movimento recém-criado e de corte bastante conservador chamado “Polônia 2050”.

O cansaço, a ira e a raiva absoluta foram bem refletidas nos slogans. Entre os mais populares, destacam-se “Cai fora” (Wypierdalać) e “vá à merda PiS” (J… PiS). Em todo o país, centenas de milhares de manifestantes, em sua maioria mulheres jovens, tomaram as ruas portando cartazes com dizeres como “Queria poder abortar o governo”, “Isso é guerra” ou “O inferno para as mulheres”.


Ao contrário do que se temia, o uso de linguagem vulgar não afetou o propósito da luta. Ao contrário, como a escritora e acadêmica Inga Iwasiów destacou: “Assim que começamos a ser vulgares, o outro lado começou a nos escutar”.

Além do mais, nos debates políticos do país se produziu uma autêntica mudança quase que da noite para o dia: organizações de mulheres com a All-Poland Women’s Strike, que coorganizou os protestos pelo direito pleno ao aborto, e a Abortion Dream Team, um coletivo de acompanhamento que ajuda as mulheres a abortarem em suas próprias casas, que eram consideradas “muito radicais” até para alguns setores do feminismo, e se converteram em um grande interlocutor nos debates políticos convencionais, e atraíram a atenção dos principais meios de comunicação. Agora já não são vistas como minoria radical ou extremistas que devem ser silenciadas para que as posturas supostamente moderadas do espectro político fiquem onde estão.

Mas o que realmente fez com que os protestos crescessem durante semanas foi a enorme mobilização de jovens e sua determinação. Gente jovem de todos os gêneros celebrou sua subjetividade política nas ruas, gritando palavrões ao governo.

Os que ficaram em casa, mostraram apoio a partir de suas sacadas, janelas e pela internet. O compromisso dos jovens, que com frequência são vistos como despolitizados e descomprometidos, foi uma surpresa. Sobretudo porque, como geração, cresceram em uma realidade social marcada por uma sucessão de governos, “progressistas” e conservadores — em função do apoio político da Igreja –, defensores da militarização e do nacionalismo.

Foi uma revelação ver massas de jovens, imunes e indiferentes à retórica disciplinadora de ameaça e medo do ministro da Educação, Przemysław Czarnek, que tentou intimidar os alunos e o professorado com a advertência de que aqueles que participassem das manifestações poderiam ser levados a juízo. Ou as palavras de Jarosław Kaczyński, líder do PiS, que chamou à “defesa da Polônia e das igrejas católicas” frente às forças que “querem destruir a Polônia” e buscam “o fim da nação polaca como a conhecemos”.

No cartaz preto, “Meu corpo, minhas regras”, a determinação e persistência da juventude são uma novidade e dão o que pensar a todos. Graças a ela, o partido que governa o país aprendeu uma lição amarga sobre o quanto seus métodos e sua retórica nacionalista estão desgastados, e o quanto seu partido está distante dos mais jovens — ou seja, de seu futuro eleitorado.

Além disso, o alcance dos protestos pode ter posto fim à ideia do monopólio do populismo de direita, algo sobre o qual o governo atual sempre se apoia. A narrativa compartilhada por grande parte da população, de que os direitos LGBTI+ e das mulheres são um ataque da “ideologia estrangeira” contra os “valores tradicionais” da Polônia pode parar de funcionar em vista dos recentes acontecimentos.


Essa nova onda de manifestações, suas palavras de ordem e sua estética podem ser um sinal de que a narrativa liberal de alcançar pequenas conquistas de direitos humanos, em particular os relacionados aos LGBTI+ e ao aborto, também mostra que a oposição progressista ao governo está desatualizada. Os partidos de esquerda, que apoiam abertamente os direitos LGBTI+ e o direito ao aborto — ainda que seu respaldo social seja de somente cerca de 10% –, poderiam beneficiar-se dessa nova realidade política se forem capazes de superar o estigma do pós-comunismo

Mesmo com essa grande onda de protestos de rua chegando ao seu final natural, devido ao puro esgotamento de todas as pessoas envolvidas, os resultados da mobilização ainda estão por vir. Já estamos em 20 de novembro, e o governo ainda não publicou a sentença do Tribunal, o que significa que, na prática, a lei não mudou.

Além disso, no último mês, a All-Poland Women’s Strike ampliou suas demandas perante ao governo a outras áreas além dos direitos ao aborto: direitos LGBTI e das mulheres em geral, direitos trabalhistas, separação entre Igreja e Estado e independência total do poder legislativo. Agora mesmo, as organizadoras desse movimento se encontram construindo suas bases, de baixo para cima, para serem capazes de continuar a luta no futuro.

Texto: Magda Grabowska
Tradução: Gabriela Leite

* Magda Grabowska é socióloga e professora da Academia de Ciências da Polônia