Cresce o medo do perigo que vem do Leste, na forma de desinformação, espionagem
ou incêndios criminosos.
Primeiro-ministro polaco Donald Tusk manda erguer uma forte proteção na
fronteira e instaura comissão para detectar "traidores".
Desde o início da
invasão russa da Ucrânia, em 24 de fevereiro de 2022, a Polônia passou a ser um
país de "front" para a União Europeia. Porém, só agora sua sociedade parece ter
compreendido a extensão total da ameaça que vem do Leste.
Nos últimos tempos,
diversos incêndios estão assustando a população. Até o momento, não há provas
conclusivas, porém, muitos suspeitam que por trás deles esteja a ação de serviços
secretos estrangeiros. "Não temos mais qualquer dúvida de que os serviços
secretos russos – e os bielorussos, que cooperam de perto com eles – estão muito
ativos na Polônia", comentou o primeiro-ministro, Donald Tusk, nesta semana que passou
(21/05), após uma reunião de seu gabinete.
Nos últimos dias, o político centrista
tem aproveitado toda oportunidade para alertar contra o perigo de sabotagem e a
desinformação a partir da Rússia. Ele informou que, no momento, 12 indivíduos
estão em prisão cautelar, acusados de participação em atos de sabotagem a mando
da Rússia.
Além disso, os serviços secretos russos teriam provavelmente "algo a
ver" com o incêndio do Shopping Center, na rua Marywilska, n.º 44, no norte de Varsóvia.
Em
12 de maio, o fogo destruiu cerca de 1.400 lojas: em poucas horas, milhares de
comerciantes, sobretudo imigrantes e polacos de origem vietnamita (que vivem na Polônia desde os anos 70, refugiados da guerra do Vietnã), perderam todas as suas posses.
O fato de o
incêndio ter começado, simultaneamente, em focos diferentes suscitou especulações
exacerbadas. "Vamos investigar", prometeu Tusk.
Incidentes semelhantes têm se
acumulado nas últimas semanas: um depósito de lixo, um prédio escolar durante um
exame. A inesperada fuga do juiz polaco Tomasz Schmydt no início de maio para
a Bielorrússia – de onde, agora, ele faz propaganda antipolaca sob ordens do presidente daquele país,
Aleksander Lukaszenko – agravou ainda mais a insegurança nacional:
- Quem sabe há
muito o ambicioso juiz fosse um espião de serviços secretos estrangeiros,
repassando material altamente sensível?
Tusk anuncia um "Escudo Protetor no Leste"
Diante dos perigos crescentes para a segurança nacional, Tusk decidiu partir
para a contraofensiva: em meados de maio, apresentou um projeto de uma linha de
defesa para os 600 quilômetros de fronteira com a Rússia e a Bielorrússia.
Dessa forma, além
dos obstáculos naturais como rios, lagos, pântanos e florestas, haverá fortificações chamadas pelo chefe de governo de "Escudo Protetor Leste",
erigidas com barricadas antitanques e muito equipamento eletrônico, inclusive
unidades de reconhecimento.
Tusk espera que a União Europeia se disponha a
assumir parte dos custos. Em 21 de maio, ele criou uma comissão para investigar
a influência dos serviços secretos russos e bielorrussos sobre a política
polaca. Sob direção de Jarosław Stróżyk, chefe do Serviço de
Contrainteligência Militar (SKW), ele já deverá apresentar seu primeiro
relatório antes do recesso do verão europeu.
Composta por especialistas, a
comissão se reunirá a portas fechadas, sem ser filmada, a fim de analisar a
política nacional, a partir de 2004, incluindo, portanto, também o governo do próprio partido de Tusk, a Plataforma Cívica (PO), entre 2007 a 2015.
Por mais que o primeiro-ministri
se esforce para manter uma aparência de neutralidade, para todo observador
político está claro que no centro da atenção dos peritos estará o partido
populista de direita Direito e Justiça (PiS), do líder Jarosław Kaczyński.
Nesse contexto,
um nome é citado com especial frequência: Antoni Macierewicz. Após a guinada
democrática, o antigo crítico do regime, que desde a década de 70 combatia o
sistema comunista, aproximou-se cada vez mais da ala nacionalista-religiosa da
oposição. A partir de 2006, em diversas funções no Ministério da Defesa,
ele realizou purgações radicais no serviço secreto militar.
Críticos o acusaram de,
dessa maneira, ter incapacitado o Exército Polaco. Como ministro da Defesa de
2015 a 2016, igualmente impediu a modernização das forças de combate, ao
rescindir os contratos armamentistas com a França, entre outros.
Tusk: "Não sou
um segundo McCarthy"
"O laço das informações que estamos coletando vai se
apertando em torno de Antoni Macierewicz", comentou Tusk. Em seus círculos
teriam atuado indivíduos que desarmaram o Exército polaco e desativaram o
serviço de informações. "Muitas decisões [de Macierewicz] foram em proveito da
Rússia", confirmou na quarta-feira o chefe da Comissão Parlamentar para Controle
dos Serviços Secretos, Marek Biernacki.
Em sua opinião, o PiS
"não é um partido pró-russo, mas sim infiltrado pela Rússia".
"Não sou um
[Joseph] McCarthy moderno", assegurou Tusk, em alusão ao senador que promoveu
nos Estados Unidos uma caça às bruxas anticomunista, nas décadas de 40 e 50.
Contudo, na fase quente da campanha eleitoral para o Parlamento Europeu, em 9 de
junho, o líder da maior legenda governista, o PO, tenta mobilizar seu eleitorado
representando a votação como uma confrontação entre a Europa e a Rússia. "A
Rússia já está aqui", diz seu clip eleitoral, controvertido também dentro do
partido.
Os autores condenam o PiS por manter contatos com Rússia e a Bielorrússia,
citando um discurso de Tusk no Parlamento em que ele classifica a extrema-direita
polaca como "traidores pagos, lacaios da Rússia".
"Tusk precisa vencer, de
qualquer modo, a fim de acelerar a tomada de controle sobre o Estado", explica o
jornalista Michał Szułdrzyński no Jornal Rzeczpospolita. Apesar de revelados
numerosos escândalos e casos de corrupção do governo anterior, permanece forte o
apoio à sigla de Kaczyński.
As pesquisas de opinião antecipam uma corrida
cabeça-a-cabeça entre o PO e o PiS. Uma décima vitória seguida dos populistas de
extrema-direita representaria grave perda de prestígio para Tusk. Perante tal quadro, a
mensagem que o político liberal, pró-UE Donald Tusk dirige a seus eleitores não
poderia ser mais simples: "Putin quer desestabilizar a Europa. Se você quer paz,
vá votar".
Fonte: Radio Deustch Welle
Texto: Jacek Lepiarz