Crítica de cinema:
Władysław Strzemiński - Foto do Arquivo Nacional Polaco |
O maior cineasta polaco de todos os tempos e um dos maiores do mundo: Andrzej Wajda (pronuncia-se andjéi váida), morreu ano passado, em 9 de outubro, pouco depois de completar 90 anos de idade (nasceu em Cracóvia, em 26 de março de 1926).
Viveu os horrores da segunda guerra mundial, e perdeu seu pai, um oficial do Exército polaco, assassinado não pelos nazistas de Hitler, mas pelos soviéticos de Stalin.
Andrzej Wajda |
Foi atingido duramente pelos fascistas de extrema-direita e extrema-esquerda.
Como nenhum outro soube construir uma carreira de artista e cineasta num mundo sem liberdade. Criou quando outros sucumbiram, fez da arte e da película seu instrumento de luta contra a opressão, a miséria, a pobreza, a falta de perspectivas e liberdade.
Como nenhum outro, entendeu sua terra e seu povo.
E certamente por isso e também por isso, encerrou sua carreira e sua vida com uma obra que retrata um dos maiores artistas do século XX, o também polaco WŁADYSŁAW STRZEMIŃSKI (pronuncia-se vúadissuáf stjeminhsqui), que nasceu em Mińsk, quando a atual capital da Bielorrússia ainda era uma cidade da Polônia e morreu no início do stanilismo imposto, em Łódź, em 28 de dezembro de 1952.
O artista plástico, pintor, construtivista vanguardista, professor de história da arte, criador da Escola Superior de Artes Plásticas de Łódź (pronuncia-se uúdji) foi fundador do Clube dos Artistas da cidade.
Autor do livro revolucionário “A teoria da visão”, junto com sua esposa Katarzyna Kobro, também artista plástica, criou um grupo com Henryk Stażewski, Julian Przyboś e Jan Brzękowski que se dedicou a transformar as artes polacas.
Panorama, 1932, fragmento. |
Strzemiński criou ainda como designer a “Sala Neoplástica” do Museu de Arte de Łódż.
Depois de perder uma perna e um braço como soldado na Primeira Guerra Mundial dedicou-se completamente à arte e formulou nos anos 20 a “Teoria do Unismo”.
Apresentados cineasta e biografado vamos ao filme:
Wajda, sabe do que falava e do que mostrou nesta sua última obra cinematográfica. Ele viveu e sofreu também os mesmos horrores do personagem de seu filme.
Então, quando coloca na boca do ator Bogusław Linda, que interpreta magistralmente Strzemiński, uma frase da Escola da Gestalt nas artes gráficas, “para se compreender as partes, é preciso, antes compreender o todo”, ele não está apenas fazendo uma concessão, mas está gritando que Strzemiński era um artista do Mundo e não apenas de sua pequena aldeia, Wajda o está equiparando a Kandinsky, Chagal e Malevich.
O filme de Wajda é angustiante, é denso, marcado por grandes interpretações de Linda, da menina Bronisława Zamachowska (pronuncia-se bronissúava zamarróvsca), da bela Zofia Wichłacz (pronuncia-se zófia virrhhuatch) e pela maravilhosa fotografia do mago da luz e das lentes Paweł Edelman, do roteiro instigante de Andrzej Mularczyk, da música de Andrzej Panufnik, figurinos de Katarzyna Lewińska, cenários de Marek Warszewski e montagem de Grażyna Gradoń.
Numa cidade degradada pelos horrores cometidos pelos alemães e pela imposição do stalinismo russo, mas ainda assim uma metrópole sonhadora, criadora, capital das artes e do cinema, Wajda conta a história de um polaco pacífico, fulgurante, altivo, que enfrenta a censura, a demissão, a desfiliação do clube dos artistas, a fome, a perseguição política, a proibição de comprar tubos de tinta, a tuberculose, a doença e a morte da esposa, a separação da filha e a falta de uma perna e um braço. Mas um homem que não desiste da arte, da liberdade de pensamento, das suas convicções filosóficas, políticas, sociais e artísticas.
Cena do filme com Bogusław Linda |
Quando o Estado se torna “Senhor” do indivíduo, seja no nazismo, seja no comunismo, seja no capitalismo "democrático" (com sua ideia de Estado mínimo e neoliberal), este “Estado” perde todo sentido e legitimidade.
O Estado deve servir o indivíduo (povo) e não escravizá-lo na pobreza, na ignorância, na fome, na educação, na falta de liberdade criativa e criadora. Quando este “Estado” impõe sua “arte” está reduzindo os sonhos a quimeras irrealizáveis.
Tal qual acontece neste “Estado democrático” brasileiro que impõe suas reformas, governando para 1% da população privilegiada, para o lucro assassino, para o empresário escravagista e para os corruptos de qualquer natureza.
Um “Estado” que odeia o povo e suas mazelas, que semeia discórdia e desvirtua o significado das coisas.
Não! Você não vai encontrar nos cartazes e propagandas o título polaco do filme - “POWIDOKI" - mesmo que você esteja na capital polaca da América Latina e terceira maior cidade da etnia polaca em todo o mundo, Curitiba... Não!
Como um réles colonizado de Miami, o título é em inglês: "Afterimage”.
Como ele poderia, este distribuidor, saber que em português, o filme poderia se chamar “Pós-imagem”, já que mesmo em inglês, o termo não traduz realmente o que é Powidoki?
O que seria então Powidoki?
Melhor explicar do que tentar uma palavra inexistente:
Melhor explicar do que tentar uma palavra inexistente:
“IMPRESSÃO DE SENSAÇÃO VÍVIDA...
OU A IMAGEM QUE SOBREVIVE NA RETINA APÓS SER VISTA E QUE PODE SER MANTIDA NA MENTE E REVISTA DEPOIS.
OU A IMAGEM QUE SOBREVIVE NA RETINA APÓS SER VISTA E QUE PODE SER MANTIDA NA MENTE E REVISTA DEPOIS.
Longo? Não é comercial? Ah... tá! “Afterimage” é comercial?
Um filme, uma obra de arte das mais requintadas, que não deve ser perdido sob nenhuma hipótese.
Que importa se a Academia de Hollywood preferiu “La La Land”, ou “Terra de Minas”.
Ulisses Iarochinski
jornalista e documentarista