terça-feira, 28 de janeiro de 2025

27 JANEIRO 2025 - LIBERTAÇÃO DOS CAMPOS NAZISTAS

Texto de Ulisses Iarochinski
Tenda da Cerimônia diante do Campo de Birkenau

 
 Neste 27 de janeiro de 2025, foram comemorados os 80 anos da libertação dos campos de concentração e extermínio nazistas alemães no Museu de Auschwitz – Birkenau – Monowitz. A cerimônia contou com a presença de reis, rainhas, presidentes e primeiros-ministros, e, à tarde, cerca de 50 sobreviventes participaram de um evento especial. Entre os ausentes estavam o presidente do Brasil e seu embaixador em Varsóvia, bem como o presidente e o primeiro-ministro de Israel. No entanto, o ministro da Educação israelense esteve presente. Também não compareceram o presidente e o primeiro-ministro da Rússia, mas o presidente da Ucrânia marcou presença. Vladimir Putin não é convidado há 3 anos, desde que invadiu a Ucrânia, mesmo sendo do país que libertou os Campos.
 

 
 
 
"Testemunhamos hoje uma enorme onda de antissemitismo, e foi precisamente o antissemitismo que levou ao Holocausto", alertou Marian Turski, de 98 anos - jornalista polaco de ascendência judaica. É presidente do Instituto Histórico Judaico em Varsóvia - em frente a um dos vagões de trem usados para transportar prisioneiros para Auschwitz.
 
 
 
 
 

 
Leon Weintraub, médico de 99 anos com cidadania sueca e nascido em Łódż, na Polônia, condenou a proliferação de movimentos de inspiração nazista na Europa.
 
 
 
 
Alguns sobreviventes vestiam bonés e cachecóis listrados em azul e branco, relembrando seus antigos uniformes de prisioneiros.
 
Em 2005, durante as comemorações dos 60 anos da libertação dos campos, a solenidade ocorreu ao ar livre, diante do Monumento Internacional às Vítimas do Campo, em Birkenau. Agora, nos 80 anos, o evento foi realizado em uma grande tenda branca montada em frente ao portão de entrada de Birkenau.
 

 
 No Brasil, as notícias, artigos e reportagens da imprensa e da televisão nacional deram a impressão de que o evento foi apenas uma comemoração do Holocausto (o genocídio do povo judeu) e não uma homenagem ao esforço do governo da Polônia em preservar todos os campos alemães situados em seu território. Esses incluem Majdanek (pronuncia-se máidánéc), Sobibór (pronuncia-se sóbibur), Chełmno (pronuncia-se réumno), Treblinka (pronuncia-se tréblincá), Bełżec (pronuncia-se béljéts), Monowice (pronuncia-se mónówits), Płaszów (pronuncia-se puachóv), entre outros campos menores nas proximidades.
 
A Segunda Guerra Mundial não teve como objetivo inicial o extermínio de pessoas de origem judaica, mas fazia parte de um plano muito mais amplo.
 
A ascensão de Adolf Hitler ao poder começou em setembro de 1919, pouco após o término da Primeira Guerra Mundial. Hitler ingressou no partido político conhecido como Deutsche Arbeiterpartei (abreviado como DAP – Partido Alemão dos Trabalhadores), que, em 1920, passou a se chamar Nationalsozialistische Deutsche Arbeiterpartei (Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães, mais conhecido como Partido Nazista).
 
Fatores como a Grande Depressão Americana (1929), o desemprego em massa, as decisões do Tratado de Versalhes (1919), o descontentamento social com o regime democrático ineficaz, o apoio popular a partidos nacionalistas e o temor de uma revolução socialista levaram a alta burguesia alemã, empresários e o clero a apoiarem a extrema-direita do espectro político, optando por partidos extremistas como o Partido Nazista.
 
Após as eleições de julho de 1932, os nazistas se tornaram o maior partido no Parlamento, com 230 cadeiras. No entanto, não alcançaram maioria parlamentar até que Hitler fosse nomeado chanceler da Alemanha, em 27 de fevereiro de 1933.
 
Em 14 de julho de 1933, a Alemanha foi oficialmente declarada um Estado de partido único por meio de um decreto-lei:
 
“O Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães constitui o único partido político da Alemanha. Aquele que tentar manter ou formar um novo partido será punido com trabalhos forçados por até três anos ou com prisão de seis meses a três anos, caso a ação não esteja sujeita a penalidade maior, em conformidade com outros regulamentos.”
 
Em 24 de maio de 1933, o Congresso aprovou o Ato de Autorização, transferindo suas funções legislativas para o poder executivo, que, no caso, estava sob o controle de Hitler.
 
Em 2 de agosto de 1934, Hitler unificou os cargos de Presidente e Chanceler (Primeiro-Ministro) sob o novo título de Führer und Reichskanzler (Líder e Primeiro-Ministro do Império), assumindo também o comando das forças armadas.
 
Em outubro de 1933, a Alemanha retirou-se da Sociedade das Nações. O país transformou-se em um Estado nacionalista, no qual não-arianos e opositores do nazismo foram excluídos da administração pública. O sistema judiciário tornou-se submisso ao regime nazista, e campos de concentração foram criados para aprisionar opositores políticos.
 
O primeiro deles, Dachau, localizado em território alemão, foi inaugurado em 20 de março de 1933. Na noite de 9 para 10 de novembro de 1938, ocorreu o evento conhecido como a "Noite dos Cristais" (Kristallnacht). Nesse pogrom organizado, forças das SA e civis alemães atacaram violentamente a comunidade judaica na Alemanha e na Áustria. O regime nazista apresentou o ataque como uma "resposta espontânea" ao assassinato do diplomata alemão Ernst vom Rath por Herschel Grynszpan, um polaco de origem judaica, em Paris.
 
Antes desses acontecimentos na Alemanha, a Polônia, que havia recuperado sua independência em 11 de novembro de 1918, firmou um acordo secreto com a França em fevereiro de 1921. Esse tratado estabelecia que, no caso de uma das nações ser atacada, "ambos os governos se comprometeriam a defender seus territórios e proteger seus legítimos interesses".
 
Em outubro do mesmo ano, a Polônia assinou outro acordo com a Romênia, assegurando ajuda mútua em caso de agressão externa.
 
Em 25 de julho de 1932, a Polônia firmou em Moscou um pacto de não agressão com a União Soviética. Temendo tempos difíceis, o governo polaco assinou em 26 de janeiro de 1934 um acordo de não agressão com a Alemanha.
 
O ministro das Relações Exteriores da Polônia, Józef Beck, acreditava que esses tratados tornariam a Polônia um parceiro estratégico para França e Inglaterra. No entanto, o primeiro-ministro britânico Neville Chamberlain agravou a situação ao adotar uma política de apaziguamento diante da crescente ameaça de guerra.
 
Em 12 de março de 1938, a Alemanha invadiu a Áustria, anexando-a ao Império Nazista. Posteriormente, os governos da Itália, França e Grã-Bretanha firmaram um acordo com Hitler, entregando-lhe a região dos Sudetos (uma cadeia de montanhas localizada na fronteira entre a República Tcheca, a Polônia e a Alemanha). Ainda em março, a Alemanha invadiu a Tchecoslováquia, seguida pela Lituânia.
 
A Polônia esperava pelo apoio da França e da Inglaterra, mas o primeiro-ministro britânico, Neville Chamberlain, ignorou os acordos e afirmou: “De nós, evidentemente, dependerá que ação consideraremos como ameaçadora à independência da Polônia. Isso nos preservará de sermos envolvidos em uma guerra por causa de um problema fronteiriço.”
 
No final de 1938, Hitler exigiu que a Polônia aceitasse a anexação de Gdańsk e a construção de um corredor exclusivo para uma rodovia e uma ferrovia ligando Berlim a Gdańsk. Varsóvia, naturalmente, recusou tal exigência absurda.
 
Em 22 de agosto de 1939, Hitler ordenou que a Polônia fosse atacada quatro dias depois. Ele declarou: “A destruição da Polônia é a prioridade. Que a piedade não tenha espaço em vossos corações. Atuem brutalmente.”
 
No entanto, a data do ataque foi adiada para 1.º de setembro devido ao Pacto Ribbentrop-Molotov, assinado em 23 de agosto, que definiria as futuras fronteiras entre a Alemanha e a União Soviética após a extinção da Polônia.
 
Em 17 de setembro, os soviéticos (russos e ucranianos) invadiram a Polônia pelo leste.
 
Atacada por ambos os lados, a Polônia resistiu bravamente, mas não conseguiu deter a dupla invasão. A resistência polaca durou seis semanas sem capitular, um feito que a França, com um contingente militar superior, não conseguiu repetir, rendendo-se em apenas duas semanas.
 
Fatos menos conhecidos evidenciam o papel crucial da Polônia na derrota de Hitler e da Alemanha Nazista:
 
1. A Polônia organizou o maior movimento de resistência de toda a Europa ocupada. Os polacos sabiam que lutavam pela preservação de sua nação e de seu território.
2. O maior e mais terrível dos campos de concentração e extermínio nazistas foi construído em terras polacas.
3. Para expandir suas fronteiras para o oeste, a União Soviética assassinou 22 mil oficiais do exército polaco na Floresta de Katyń e outros 3 mil em Charków, Starobielsk e Ostaszków.
4. Entre 1.º de agosto e 2 de outubro de 1944, durante o Levante de Varsóvia, o povo varsoviano enfrentou sozinho 22 mil soldados nazistas, enquanto tropas russas e ucranianas observaram passivamente, sem prestar qualquer auxílio, do outro lado do rio Vístula.
 
Mas voltemos aos judeus, em sua maioria polacos natos. A decisão final de eliminar os europeus de origem judaica surgiu em uma carta do general nazista Reinhard Heydrich ao diplomata Martin Franz Juliusz Luther, do Ministério das Relações Exteriores da Alemanha. 
 
Na carta, Heydrich solicitava a implementação da "Solução Final para a Questão Judaica", planejando remover os judeus dos territórios ocupados pela Alemanha. Em 31 de julho de 1941, Adolf Hitler ordenou que Heydrich lhe apresentasse um plano geral para exterminar todas as pessoas de origem judaica, independentemente de suas nacionalidades ou cidadanias. Esse plano começou a ser executado em 20 de janeiro de 1942.
 

 
 
 
 
 
No final da guerra, a Polônia sofreu mais do que qualquer outro país envolvido no conflito. Mais de 25% de sua população foi dizimada, e Varsóvia foi completamente destruída. Segundo o coronel polaco Eugeniusz Kozłowski, "a Polônia foi a primeira vítima da guerra iniciada pela Alemanha de Hitler e, ao mesmo tempo, o primeiro país da Europa que não capitulou sem luta, interrompendo as anexações do Terceiro Império Alemão." 
 
 
 
 
 
 
Do contingente de 1 milhão de soldados polacos, 239.800 foram mortos, 218.100 ficaram feridos e 619.900 foram feitos prisioneiros pelos exércitos alemães. Por outro lado, 76.100 soldados alemães morreram e outros 11.700 ficaram feridos. Nenhum soldado alemão foi capturado pelos polacos.
 
Quando a guerra começou, a Polônia tinha uma população de 23 milhões de habitantes. Desses, 18,5 milhões eram polacos de origem eslava, 3 milhões eram polacos de origem judaica, e 1 milhão era composto por ciganos, alemães, rutenos-ucranianos, eslovacos, tchecos, romenos e outros grupos étnicos. 
 
Segundo Paul Johnson, em toda a Europa viviam 8.861.800 pessoas de origem judaica. Na Polônia, residiam 3,5 milhões deles, o que representava 39,22% da população judaica europeia, tornando-se a maior concentração desse povo em um único território.
 
Isso se devia ao fato histórico de que os judeus estavam na Polônia há mais de mil anos. Foram crescendo em número desde que começaram a ser expulsos de diversos reinos europeus, como os sefarditas da Península Ibérica, em 1492 pelo reino católico da Espanha. 
 
Durante o reinado de Casimiro, o Grande, os judeus de todo o mundo conhecido foram convidados a se estabelecer no reino católico romano da Polônia. Nesse período, foi criada uma cidade murada ao lado da então capital do reino, Cracóvia, chamada Kazimierz, que hoje é um bairro da cidade.
 
Os seis grandes campos de concentração e extermínio nazistas na Polônia foram as principais áreas de genocídio em território ocupado. O complexo de Auschwitz, por exemplo, consistia em três unidades principais e 45 subcampos:
 
• Auschwitz I, na cidade de Oświęcim, era o centro administrativo do complexo. Antes da ocupação nazista, funcionava como um quartel do exército polaco. Ali, foram assassinadas cerca de 70 mil pessoas, a maioria composta por polacos étnicos, prisioneiros soviéticos e ciganos.
 
Auschwitz II, conhecido como Birkenau, foi construído sobre uma vila na cidade de Brzezinka e tornou-se o principal local de extermínio do complexo. Com quatro crematórios instalados, 960 mil judeus foram assassinados, incluindo polacos católicos, protestantes e ortodoxos; húngaros, alemães, gregos, eslovacos, tchecos e outras nacionalidades. Além disso, morreram 75 mil polacos não judeus (professores universitários, soldados e líderes políticos) e 19 mil ciganos polacos
 
Auschwitz III, localizado em Monowice, conhecido por Monowitz, servia como campo de trabalho forçado para a fábrica de borracha sintética Buna-Werke, da IG Farben.
 
Outros campos de extermínio em território polaco também testemunharam atrocidades em grande escala:
 
Majdanek, localizado em um bairro da cidade de Lublin, operava exclusivamente como campo de extermínio. Nele, morreram 1.380.000 pessoas, incluindo polacos étnicos, polacos de origem judaica e indivíduos de outras religiões e etnias.
 
Treblinka, próximo à cidade de Siedlce, foi responsável pela morte de 800 mil pessoas.
 
• Bełżec, nas proximidades da cidade de Tomaszów Lubelski, viu o extermínio de 600 mil pessoas.
 
Chełmno, próximo à cidade de Łódź, exterminou 340 mil pessoas.
 
Sobibór, perto da cidade de Włodawa, foi o local de morte de 250 mil pessoas. Destas, cerca de 180 mil eram de origem judaica, sendo metade deles nascidos na Polônia, e o restante formado por judeus da Holanda, Bielorrússia e Lituânia.
 
Segundo o Museu de Auschwitz, os nazistas trouxeram para os três campos do complexo do Campo de Concentração e Extermínio Alemão de Auschwitz 1.300.000 pessoas. Destas, 1.100.000 eram de origem judaica (incluindo polacos e indivíduos desta etnia de outros países), 150.000 eram polacos não judeus (católicos e protestantes), 23.000 eram ciganos (a maioria nascida na Polônia), 15.000 eram prisioneiros soviéticos (russos, ucranianos, bielorrussos e outras nacionalidades) e 25.000 pertenciam a outros grupos étnicos.
 
O professor doutor Czesław Madajczyk apresenta uma visão divergente em relação aos números geralmente aceitos sobre o genocídio de pessoas de origem judaica durante a Segunda Guerra Mundial. Enquanto o criador do termo "Holocausto", Simon Weisenthal (nascido na cidade polaca de Buczacz), estimou que 6 milhões de judeus foram assassinados, Madajczyk afirma que o número seria de aproximadamente 2,7 milhões de indivíduos desta origem étnica. Dentre esses, cerca de 500.000 morreram em assassinatos em massa nos guetos das principais cidades da Polônia, enquanto 200.000 foram executados nas ruas.
 
O restante, entre 1,6 milhão e 1,95 milhão de pessoas, incluindo polacos de diversas religiões e origens, foi assassinado nos campos de Treblinka, Sobibór, Bełżec, Majdanek e Chełmno. Assim, do total de 6 milhões de vítimas, cerca de 3,3 milhões eram polacos de origem não judaica. Desses, aproximadamente 500.000 polacos católicos foram mortos na União Soviética.
 
Entre os sobreviventes, 530.000 ficaram inválidos; 40.179 foram vítimas de experimentos médicos; 60.000 desenvolveram debilidade mental; e mais de 1 milhão sucumbiram a enfermidades adquiridas durante a guerra, mesmo após o término do conflito.
 
A Polônia foi o segundo país mais afetado economicamente durante o conflito, com prejuízos estimados em 50 bilhões de dólares. Em primeiro lugar, ficaram as 15 repúblicas socialistas soviéticas, que registraram perdas de 128 bilhões de dólares. Após a guerra, a Polônia foi entregue ao controle soviético, e Moscou retirou 40% de seu território, repassando-o para a Ucrânia, Bielorrússia e Lituânia. Alguns argumentam que a Polônia não deveria reivindicar seus antigos territórios na Volínia, Podólia e parte da Małopolska, uma vez que recebeu de volta regiões historicamente polacas, como a Silésia e a Pomerânia, que haviam sido ocupadas pela Alemanha por 127 anos, de 1793 até 1918.
 
Enquanto isso, a algoz Alemanha Ocidental, uma das principais responsáveis pela guerra, foi reconstruída com ajuda dos Estados Unidos por meio do Plano Marshall, idealizado pelo Secretário de Estado George Marshall. 
 
O país recebeu bilhões de dólares na época. No total, a Grã-Bretanha ficou com 26% dos recursos do Plano Marshall, a França com 18%, e a Alemanha com 11%. Moscou, por outro lado, bloqueou qualquer assistência às nações sob sua influência, como Tchecoslováquia, Hungria, Alemanha Oriental e Polônia. Até mesmo Portugal, que não participou ativamente da guerra, recebeu 140 milhões de dólares em ajuda do plano.
 
“Com a diminuição do número de sobreviventes do Holocausto, a responsabilidade pela memória recai sobre nossos ombros e sobre as futuras gerações”, afirmou o rei Charles III durante sua visita ao Centro de Justiça Comunitária de Cracóvia.
 
O presidente ucraniano, Volodymyr Żeleński, que se declara de origem judaica, esteve presente na cerimônia em Birkenau e declarou que o mundo precisa se unir "para deter o mal", uma afirmação amplamente interpretada como uma referência à Rússia.
 
 
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