domingo, 17 de novembro de 2019

As mudanças nas universidade

As universidades precisam ajustar suas velas para os ventos da mudança


“Nada realizaríamos se esperássemos até fazê-lo com tanta perfeição que ninguém lhe achasse defeito”. Não por acaso iniciamos esse artigo citando o cardeal John Henry Newman, autor do clássico “The idea of a University”. As universidades precisam mudar, e nós acadêmicos precisamos conduzir esse processo. Ocorre que muitos de nós não reconhecemos os ventos da mudança, e nessa cegueira, marchar com um norte é realmente doloroso e difícil. Para alguns, a universidade é uma instituição ossificada, cheia de homens velhos e pomposos, incapazes de adaptarem-se a um mundo que se transforma vertiginosamente. Infelizmente há alguma verdade nessa percepção, mas a sociedade também enxerga seus cientistas como os semeadores de aprimoramentos técnicos, políticos e até mesmo sociais, e isso da mesma forma é um fato.

Nas universidades, todos parecem estar satisfeitos, ou fingem muito bem que estão felizes com a qualidade de suas pesquisas, cujos resultados frequentemente são publicados em periódicos científicos desimportantes que ninguém lê ou cita. O quadro pode ser ainda mais deprimente. Existem parasitas, que, sob o pretexto de combatem um pretenso “produtivismo acadêmico” (uma excessiva publicação de artigos irrelevantes em revistas científicas, para inflar currículos), nada produzem. Vociferam contra os colegas que produzem ciência de qualidade, porque o brilho de alguns expõe o parasitismo vagabundo de outros. Publicar artigos acadêmicos é basilar para o desenvolvimento da ciência, e quem não o faz ou é incompetente ou é preguiçoso. Em qualquer um desses casos, temos um escandaloso desperdício de recursos: não devemos tolerar quem é pago e não trabalha. No entanto, não nossa intenção promover uma moralização barata, porque isso não é atraente nem eficaz para o intelecto.

Como promover mudanças nas universidades? Primeiramente, avaliando sua produção científica. Infelizmente, na Polônia, os sistemas de avaliações mudam ao sabor de canetadas ministeriais, e é terrivelmente custoso construir em terreno tão movediço. No Brasil é evidente a resistência dos professores em serem avaliados, seja individualmente ou como membros de um programa de pós-graduação. Há uma proibição velada: para um gestor, mostrar números, mesmo um simples gráfico dos que publicaram os resultados de suas pesquisas em boas revistas científicas, significa fazer inimigos. A avaliação impessoal baseada em indicadores cientométricos é bem-vinda, mas não é suficiente. Na Polônia, e no Brasil, falta o debate. Que universidade queremos? Uma pergunta difícil, e que poucos estão dispostos a enfrentar, porque respondê-la significa admitir erros e fracassos.

Devemos apenas formar trabalhadores com diplomas, em um contexto em que diplomas e profissões vêm se esfumando? Mesmo a nobilíssima profissão de professor parece marcada para morrer: um único docente pode dar aulas simultaneamente para milhares de estudantes, via satélite. Em paralelo, é cada vez mais difícil prosperar como cientista, e o verbo prosperar aqui significa pagar as contas e viver dignamente. Há uma precarização do trabalho científico, e esse é um fenômeno global. Um erro tolo! Sempre será possível comprar tecnologias mais baratas no exterior e fingir que é isso ótimo. Contudo, invariavelmente surgirá, como no conto de fadas de Andersen, alguém que bravamente perguntará: como resolveremos nossos problemas se abdicamos de estudá-los?

Em tempos de mudanças inacreditavelmente rápidas, nossa tarefa, como professores universitários, mais do que ensinar habilidades específicas, é estimular virtudes, arejar mentalidades e espanar o grosso pó dos corporativismos boçais. O perito sempre fará o bonde subir, mas como decidir que direção ele tomará? As sociedades precisam de engenheiros e de filósofos. Sem as universidades que desejamos, centros vibrantes de reflexão, de debates sobre os desafios da humanidade e de produção de conhecimentos, os caminhos são arriscosos.




- Piotr Tryjanowski é professor da Universidade de Poznań, e um dos biólogos polacos mais citados em artigos científicos. Ele assessora diversos estudos realizados pelo Mestrado em Geografia da UFR.

- Fabio Angeoletto é professor do Mestrado em Geografia da UFR

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